Título: CPI já tem comprovações de que esquema não se restringe a caixa 2
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 08/08/2005, Política, p. A6

Já são inúmeros os indícios que desmontam, para integrantes da CPI Mista dos Correios, a tese de que o suposto esquema de corrupção investigado estaria restrito a caixa 2 de campanhas eleitorais, como asseguraram, inicialmente, o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, e os ex-dirigentes petistas Delúbio Soares e Sílvio Pereira. Uma das coisas que intriga a CPI é o fato de Marcos Valério ter enviado aos parlamentares cópias de 11 contratos de empréstimos feitos por suas empresas aos Banco Rural e BMG - além dos contratos feitos pelo PT, mas que ele aparece como avalista -, apesar de ter declarado à Polícia Federal que fez somente de cinco a seis empréstimos a pedido do PT para a direção partidária quitar dívidas de campanhas de 2002 e 2004. Os 11 contratos de empresas de Valério com os dois bancos, conforme documento da CPI obtido pelo Valor, têm, somados, um valor de face de R$ 151.199.391,56. Os contratos que ele disse ter feito para o PT totalizam R$ 69,5 milhões. Para acrescentar ainda novos ingredientes ao rol de dúvidas, Delúbio Soares afirmou à CPI, em seu depoimento, que o montante de "dívidas não contabilizadas do PT" é de aproximadamente R$ 55 milhões. A CPI estima que os valores dos empréstimos feitos para o PT, corrigidos, oscilem entre R$ 88 milhões a R$ 93 milhões. Marcos Valério vai prestar depoimento à CPI Mista do Mensalão nesta terça-feira. É a grande expectativa da semana. Nas últimas entrevistas à imprensa, Valério deu sinais de que pretende claramente envolver o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu no suposto esquema do mensalão, o pagamento para parlamentares da base aliada votarem a favor de projetos do governo. Em entrevista ao jornal "O Estado de S.Paulo" na última quinta-feira, o empresário só emprestaram às suas empresas esse volume significativo de recursos porque sabiam que por trás de Delúbio Soares "tinha um conforto, uma garantia". A garantia era o próprio governo, o então ministro José Dirceu. Além do depoimento de Valério, as CPIs do Mensalão e dos Correios vão ouvir também Cristiano de Mello Paz, sócio de Valério na SMP&B. A expectativa é que o empresário dê mais detalhes sobre as operações. O próprio Valério envolveu os sócios no esquema ao alegar que para emitir cheques da SMP&B e DNA Propaganda - para assessores de parlamentares, candidatos ou partidos -, precisaria de uma segunda assinatura, de um de seus sócios. O deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), sub-relator da CPI Mista dos Correios para a análise de movimentações financeiras, considera que se o esquema fosse somente para caixa 2 de campanhas Valério e o PT já teriam enviado à comissão uma espécie de planilha para justificar os gastos, mostrando os beneficiários dos R$ 55 milhões que alegam ter distribuído. "Por que não o fizeram?", questiona o tucano. Diante das evidências de que o volume de movimentações supera o montante de transações feitas supostamente com intuito de financiamento eleitoral, a CPI já persegue algumas hipóteses. Uma delas é que os bancos, na realidade, não cobraram os empréstimos. Os contratos podem ser fictícios, e o dinheiro que entrou nas empresas de Valério pode ser "lavado". Além disso, a simples comprovação de que os empréstimos tinham como aval contratos das empresas de Valério com o governo já destrói a tese de que o caso se restringe a caixa 2 de campanha, concluem parlamentares da CPI Mista dos Correios. Há também a possibilidade de outras empresas privadas terem contratado as empresas de Valério para repassar dinheiro, com diversos fins. Fruet explica que a CPI vai avançar nas investigações com o cruzamento entre o que as empresas de Valério movimentaram e o Imposto de Renda retido na fonte. O sub-relator fará hoje uma reunião com o presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), Antônio Gustavo Rodrigues.