Título: Líderes discutem pacto para limitar investigações
Autor: Raymundo Costa e Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 08/08/2005, Especial, p. A10

A rapidez com que a crise se alastrou, o temor do Congresso com o desgaste generalizado da classe política e o sinal amarelo aceso no Palácio do Planalto para o risco de o momento provocar instabilidade econômica aguçaram o instinto de sobrevivência de líderes partidários e parlamentares. Em reuniões realizadas na semana passada - em gabinetes e fora do Congresso -, líderes do PT, PSDB e PFL concordaram com a necessidade de definir com clareza o foco de atuação das Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) em curso, e fizeram um pacto para deixar de lado as apurações sobre financiamento irregular de campanhas nos Estados, caixa 2. Temas espinhosos, como a denúncia do deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) sobre suposto tráfico de influência do governo brasileiro em ações empresariais, que envolveriam a Portugal Telecom, e atuações suspeitas dos fundos de pensão são temas que devem passar ao largo das CPIs. "Esquece o caso Portugal Telecom", afirmou um integrante da CPI Mista dos Correios ao Valor. A investigação sobre fundos de pensão, acrescentou essa fonte, "só abrangerá o que envolver aplicações irregulares em bancos ligados ao esquema do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza". A análise de outro parlamentar que participou das reuniões resume o momento político e mostra a lógica do pacto: "Toda instituição é conservadora. Não há uma que não seja. Na CPI do Collor, não foi difícil para o Congresso fazer o impeachment. Na CPI dos Anões, foi a vez de o Congresso sair chumbado. Agora, o corruptor taxativo é o Executivo, e a corrupção passiva está em setores do Congresso. Ou seja, há dois poderes envolvidos e a ramificação é enorme. Não são só 18 deputados, e nós sabemos disso. Cortamos a cabeça de uns, e a instituição sobrevive. É impossível cassar 80. Qual a saída para quem quer abreviar essa agonia, o governo e partidos: induzir a renúncia dos mais notórios". O problema do pacto - ou acordão, como já chamam alguns - é que os próprios líderes reconhecem a dificuldade de controlar a atuação dos integrantes de suas bancadas nas CPIs. Além disso, os parlamentares também admitem que novas denúncias e pressões da opinião pública jogam por terra qualquer tentativa de limitar o espectro das investigações. "A gente sabe que as investigações têm vida própria", ponderou um líder. O fato é que, depois das conversas da semana passada, ficou nítido o movimento na CPI Mista dos Correios para definir o período de funcionamento da comissão, tornar mais objetivas as apurações e deixar de fora das investigações as denúncias do mensalão. Nos próximos 10 dias, a CPI Mista dos Correios pretende enviar ao presidente do Congresso, Renan Calheiros, ou ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara todas as provas e indícios contra parlamentares. A CPI investiga 18 deputados. Poderão recomendar a abertura de processo de cassação ou sugerir ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de inquéritos. O presidente da CPI Mista dos Correios, Delcídio Amaral (PT-MS), não escondeu a pressa em concluir as investigações. "Pretendemos cumprir o prazo. As investigações se afunilam. O Brasil não pode viver só de CPIs. Temos outras agendas a cumprir", afirmou ele, enfatizando que a comissão funcionará no máximo até novembro. Para agilizar os trabalhos, a CPI criou quatro sub-relatorias na semana passada. Um parlamentar que discutiu esse pacto confirmou ao Valor a intenção dos partidos de não aprofundar nas investigações de caixa 2 de campanhas nos Estados. "Se formos investigar financiamento de campanhas estaduais, cozinhando foco de investigação central, faremos 27 CPIs. Esse assunto não deve merecer prioridade. Estamos de acordo", disse. Quando indagado se há o risco de a CPI Mista do Mensalão se perder em meio as apurações com um pedido coletivo de renúncia de deputados ou cassações relâmpago, esse parlamentar justificou: "Aí tudo bem, já terá produzido algum resultado", concluiu. As conversas foram além: houve um entendimento entre governo e oposição de que as investigações devem chegar até o ponto em que não provoquem conturbação incontrolável na ordem econômica. "Esse é o nosso limite", sentenciou um líder envolvido nas discussões. Por fim, petistas, tucanos e pefelistas concordaram com o seguinte: as CPIs precisam de foco, não podem durar muito tempo, e devem se concentrar em investigações de corrupção. Quer dizer que o cardápio oferecido é pizza? Os parlamentares garantem que não. Corrupções em estatais serão comprovadas, o esquema envolvendo Marcos Valério e o PT será desvendado, crime de lavagem de dinheiro virá à tona, deputados perderão o mandato para dar exemplo. E deve ficar nisso.