Título: Guerra entre CPIs pode atrasar cassações
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 09/08/2005, Política, p. A7

Crise CPI do Mensalão avoca atribuição de recomendar perda de mandato parlamentar ao Conselho de Ética

Bastou a CPI Mista do Mensalão iniciar os trabalhos para o esperado acontecer: uma guerra política com a CPI Mista dos Correios para definir de quem é a atribuição, ou a responsabilidade, de apurar o suposto envolvimento de parlamentares em irregularidades. Provocou descontentamentos no Congresso a decisão da CPI Mista dos Correios de enviar ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara, em no máximo 10 dias, os indícios contra deputados que justificariam a abertura de um processo de cassação por quebra de decoro. Um grupo de deputados e senadores já trabalha para evitar que esse relatório parcial seja produzido e levado ao Conselho de Ética. Hoje, líderes da base aliada na Câmara e no Senado reúnem-se para discutir como tratar o tema e evitar a guerra de egos entre as CPIs, o que pode ser prejudicial ao andamento das investigações. Já há parlamentares defendendo a seguinte tese: o Conselho de Ética da Câmara não pode aceitar relatório da CPI dos Correios porque ela não foi criada com o objetivo de investigar o suposto esquema do mensalão. Na prática, a briga entre comissões deverá atrasar uma definição sobre o mandato dos parlamentares, dando tempo para que alguns se decidam em relação à renúncia. Na sexta-feira, o presidente da CPI dos Correios, Delcídio Amaral (PT-MS), e o relator, Osmar Serraglio (PMDB-PR), anunciaram a decisão de encaminhar ao Conselho de Ética o resultado preliminar das investigações. Se houver provas contra deputados, pedirão abertura do processo de cassação. Se houver apenas indícios, encaminharão os casos à CPI do Mensalão. Uma parte da CPI dos Correios, especialmente a ala oposicionista, está decidida a levar adiante a decisão de divulgar relatório parcial com indícios contra deputados. Ontem, parlamentares da CPI analisaram com o relator, Serraglio, a possibilidade de os parlamentares apresentarem uma defesa ainda na CPI, minimizando resistências. Para o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), "as CPIs não podem se transformar em tribunais de exceção". "Se for para encaminhar relatório ao Conselho de Ética, isso teria que ser feito pela CPI do Mensalão. Não se pode simplesmente encaminhar um pedido de abertura de processo de cassação sem dar amplo direito de defesa ao parlamentar", disse o petista. A CPI dos Correios, acrescentou, deveria complementar o trabalho da CPI do Mensalão. "Qual CPI deve investigar é uma questão menor. Não se pode é concluir o processo sem ouvir o réu", afirmou. O líder do PMDB no Senado, Ney Suassuna (PB), admite abertamente a guerra entre CPIs e afirma estar preocupado com os desdobramentos da disputa. "Tememos uma rivalidade séria entre as duas CPIs", confessou. Segundo ele, é melhor retardar por alguns dias a decisão da CPI dos Correios em relação aos parlamentares que dar início a uma batalha política no Congresso. "Esse relatório (da CPI dos Correios) pode não ser votado", afirmou Suassuna. Ele admite, ainda, que para o governo é melhor que esse caso dos parlamentares fique restrito à análise da CPI do Mensalão. O pemedebista argumentou que a decisão da CPI dos Correios não foi submetida a todo o plenário da comissão. Suassuna nega que todo o imbróglio dê sinalizações de que as CPIs possam terminar sem que as investigações sejam aprofundadas. "Não há condição de fazer pizza. Quarenta pessoas já caíram no Executivo com a crise política, e no Legislativo pelo menos uma já renunciou. Queremos que as duas CPIs elaborem relatórios que permitam chegar aos culpados", justificou. A fusão entre as CPIs, disse ele, volta a ser uma possibilidade. Os oposicionistas consideram que a CPI dos Correios está no rumo certo. "Se há indícios contra os parlamentares, devem mandar logo para o Conselho de Ética", defendeu o líder do PFL no Senado, José Agripino Maia (RN). No PT, há dúvidas. "O direito de defesa pode ser garantido no próprio Conselho de Ética, mas temos que ver se isso aniquila de morte o sagrado direito de defesa", ponderou o deputado Maurício Rands (PT-PE). (Colaborou Sergio Leo, de Brasília)