Título: Dólar sobe no rastro do petróleo e do Fed
Autor: Luiz Sérgio Guimarães
Fonte: Valor Econômico, 09/08/2005, Finanças, p. C2

A tensão externa juntou-se ontem à crise política interna. A decolagem do petróleo para patamar recorde e a perspectiva de intensificação do aperto monetário americano provocaram uma jornada de instabilidade e apreensão. O barril do petróleo fechou na Nymex de Nova York em alta de US$ 1,63, cotado a US$ 63,94. E os juros dos títulos de 10 anos do Tesouro americano subiram de 4,39% para 4,43%, na expectativa de que o comunicado que irá informar hoje a decisão do Federal Reserve (Fed) de elevar o juro básico para 3,50% conterá advertência explícita sobre o ritmo de remoção, atualmente comedido, da política monetária acomodatícia. Este cenário externo de turbulência apresentou reflexos sobre o mercado de câmbio no período da tarde. Ele aliou-se às novas revelações do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) - de que funcionários graduados do Executivo também recebiam mensalão - para estimular compras de dólares. De manhã, o superávit comercial de US$ 904 milhões registrado apenas na primeira semana de agosto jogou o dólar para R$ 2,2950, baixa de 0,65%. Mas, à tarde, as incertezas e remessas de empresas puxaram .a moeda para R$ 2,33, alta de 0,86%. O risco-país avançou quatro pontos, para 385 pontos-base. Os juros mostraram oscilações discretas na BM&F. E a Bovespa, que só tinha olhos para os excelentes balanços de bancos e empresas, afastou-se do mundo das preocupações e subiu 0,73%, uma afronta às quedas do índice Dow Jones (-0,20%) e do Nasdaq (-0,62%). Os abundantes sinais de que a inflação não inspira cuidados e, por isso, seria racional e natural o início imediato do ciclo de baixas da taxa Selic não conseguem demover o mercado de sua certeza de que o Copom só irá cortar o juro em setembro, e não na semana que vem. Essa certeza é relatada tanto pelo Boletim Focus do BC quanto pelo mercado futuro de juros da BM&F. No primeiro caso, a centena de instituições que alimenta a pesquisa do BC prevê manutenção da Selic em 19,75%.

IPCA de julho pode amolecer BC e bancos

Trata-se de uma contradição do Focus, já que essas mesmas cem instituições reduziram a projeção de IPCA para o ano pela 12ª semana consecutiva, desta vez de 5,54% para 5,50%. Para os próximos 12 meses a inflação prevista caiu de 4,90% para 4,80%. No pregão de DI futuro, os três vencimentos mais curtos projetam recuo de 0,25 ponto da Selic em setembro e de 0,50 ponto em outubro. É o que está embutido na escadinha do CDI: 19,66% no final de agosto, 19,59% no encerramento de setembro e 19,49% em outubro. A esperança de um amolecimento monetário está depositada no IPCA fechado de julho que o IBGE divulga hoje cedo. Se o índice vier abaixo da mediana de 0,27% esperada pelo Focus, talvez o BC e o mercado se convençam da absurdidade dos 19,75%. O foco da inquietação pode se transferir hoje mais ainda da cena externa para a crise política doméstica. Não só porque em dias de decisão do Fed sobre juros, a especulação com o petróleo costuma se atenuar. Mas também porque o depoimento do publicitário Marcos Valério à CPI do Mensalão promete ser mais quente do que o prestado à CPI dos Correios. O empresário ameaça com revelações, mas ainda não contará tudo que sabe. O mercado teme que o cerco a Lula esteja se fechando.