Título: Brasil e China terão menos vantagens com mudanças em regime tarifário da UE
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 28/10/2004, Brasil, p. A3

A União Européia (UE) confirmou ontem na Organização Mundial de Comércio (OMC) que China, Índia e Brasil vão perder gradualmente a vantagem de redução tarifária na entrada de parte de suas exportações no mercado comunitário. A delegação européia disse que o novo Sistema Geral de Preferências (SGP) vai privilegiar nações menores e mais vulneráveis com o corte tarifário, ao invés de beneficiar os três gigantes em desenvolvimento que "em razão de seu tamanho atraem investimentos, em detrimento dos menores". O Brasil foi um dos primeiros a reclamar, ontem, durante exame da política comercial européia, que Bruxelas está criando uma subcategoria de países em desenvolvimento, podendo aumentar a discriminação sobre suas exportações e violar regras multilaterais. As importações européias cobertas pelo SGP alcançaram 52 bilhões de euros em 2003. Em 2002, exportações brasileiras de 2,5 bilhões de euros entraram com preferência tarifária, de um total de 18 bilhões enviados à UE. Os beneficiados têm sido produtos manufaturados. Não pagam alíquota ou então têm redução de 3,5 pontos percentuais (uma tarifa de 5% cai para 1,5%, por exemplo), o que melhora sua competitividade no mercado europeu. Com o novo SGP, por exemplo, o grupo de conservas alimentícias exportado pelo Brasil certamente será excluído por representar mais de 15% das importações européias desses produtos originárias de países em desenvolvimento. A preocupação entre os maiores países em desenvolvimento é que o movimento de Bruxelas, impondo mais facilmente o conceito de graduação (retirada de preferências comerciais a países em desenvolvimento com maior avanço econômico e tecnológico) pode desembocar nas negociações da própria Rodada Doha, na OMC. Além disso, Bruxelas introduzirá um "SGP+", que também exclui o Brasil, por meio do qual quer encorajar o desenvolvimento sustentável em várias áreas, incluindo as sensíveis questões trabalhistas e ambientais. A UE quer premiar os "bons" países pobres que se comprometerem com 27 convenções internacionais. Eles receberão acesso livre de taxas na região para cerca de 7,2 mil linhas tarifárias, incluindo produtos agrícolas e pesqueiros - 60% a mais do que o atual esquema de preferências. Entre as convenções que os europeus devem implementar estão medidas contra o trabalho forçado, trabalho infantil, discriminação racial e sexual, defesa dos direitos dos trabalhadores, o Protocolo de Kyoto e de Cartagena, este sobre organismos geneticamente modificados, além de convenções sobre espécies ameaçadas. O "regime drogas", por exemplo, será renovado com esses critérios mais estritos. A delegação européia informou que "vários países asiáticos serão incluídos, em detrimento de interesses da América Central". Até agora, o "regime droga" tem beneficiado onze países latino-americanos e o Paquistão, que se comprometem a combater a produção ilícita de drogas. O exame da política comercial do maior bloco do planeta provocou cerca de 700 questões dos outros países. No final, Bruxelas comemorou com um comunicado vitorioso onde diz que a OMC deu "o grau A" para sua política. A maioria dos países não só manifestou preocupação com o esquema europeu de preferências, como voltou a defender maior liberalização na Política Agrícola Comum (PAC), ainda marcada por altas tarifas e subsídios. Além disso, a maioria reclamou que a UE está também usando uma enormidade de regulamentações técnicas, sanitárias e fitossanitárias que barram a entrada de muitos produtos estrangeiros. Bruxelas respondeu que, ao final da atual reforma da PAC, somente 15% de subsídios continuarão vinculados à produção. Em resposta aos Estados Unidos, confirmou que está exportando mais produtos agrícolas com valor agregado, tendo reduzido o déficit na balança agrícola de 5 bilhões de euros para 500 milhões nos últimos anos. Mas que suas importações dos países em desenvolvimento aumentaram, inclusive de produtos agrícolas com valor agregado, e mais que as dos próprios EUA. Os EUA questionaram os acordos de livre comércio assinados pela UE. Este indica que pouco ou nenhum ganho econômico tem sido obtido pelos parceiros europeus nesses acordos. E que mesmo algumas economias podem ter sofrido perdas por sua participação em acordos com a UE. Indagado a avaliar os ganhos dos parceiros nos acordos preferenciais, a UE respondeu que eles vão além do comércio, incluindo cooperação, por exemplo. E que, no caso do Mercosul, apóia o objetivo do bloco de se tornar um mercado comum em janeiro de 2006.