Título: Debate sugere mudança institucional
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 11/08/2005, Política, p. A5

Enquanto os políticos tentam encontrar ânimo no Congresso para votar a reforma política em meio à mais grave crise do governo Luiz Inácio Lula da Silva, especialistas alertam que os questionamentos feitos no texto sob análise dos parlamentares brasileiros são bastante restritos e ignoram experiências e temas contemporâneos. Participantes da "Conferência Internacional sobre Desafios e Perspectivas do Fortalecimento das Instituições Políticas Brasileiras", realizado ontem na Câmara, trouxeram à baila, por exemplo, a discussão sobre a complexa conciliação entre um sistema presidencialista bem sucedido com um elevado número de partidos e a necessidade de formação de governos de coalizão, caso do Brasil. Para Octávio Amorim Neto, da Fundação Getúlio Vargas, a saída para o país pode ser a adoção do semi-presidencialismo. Ele explicou que o elevado número de partidos no Brasil impõe, no presidencialismo, a formação de um governo de coalizão. No entanto, para esse modelo ser bem sucedido, seria necessária a eliminação de uma série de entraves, especialmente do excessivo poder do Executivo para legislar. As medidas provisórias, ponderou o especialista, mostram a "tentação do Executivo de agir unilateralmente". Num rol de 46 países europeus, 20 já são semi-presidencialistas; 12 parlamentaristas; 10 monarquias parlamentaristas; e 4 adotam outros sistemas políticas. O sistema semi-presidencialista mantém a eleição direta para presidente da República, que passa a ter funções restritas e governa ao lado de um primeiro ministro, escolhido pelas forças da coalizão. Esse primeiro-ministro deve ter total confiança parlamentar e pode ser destituído. O sistema, para Amorim, reduz sensivelmente os riscos aos quais o Brasil está exposto: a gestão de um governo com minoria débil, e conflitos sérios entre o Executivo e o Legislativo. Para funcionar efetivamente, no entanto, seria necessário definir claramente as funções do presidente da República, que precisariam ser restritas. "O presidente da República não deve ter poderes pró-ativos referentes ao Legislativo", argumentou. A proposta apresentada em 1993 pela Frente Parlamentar Ulysses Guimarães, segundo o especialista da FGV, sintetiza os pilares do semi-presidencialismo. A adoção de um novo sistema, disse ele, certamente criaria entraves para a construção artificial de maiorias no Congresso, como ocorre hoje. "Os partidos passariam a ter mecanismos muito mais eficazes para monitorar os acordos que deram origem à coalizão", disse. O poder, garante ele, ficará melhor distribuído entre os partidos, uma vez que a escolha do primeiro-ministro está ligada ao grau de confiabilidade no Parlamento. "Indiretamente, a reforma do sistema político eliminaria a possibilidade de desequilíbrio completo na distribuição de cargos no governo", sustenta ele. A professora Fátima Anastásia, da UFMG, ponderou que não se pode discutir a reforma das instituições sem levar em conta a reforma do comportamento político. "Instituições não fazem milagres", pontuou. Segundo ela, o sistema brasileiro é um reflexo da heterogênea sociedade que temos - "No entanto, temos tendência de concentração de poderes nas mãos de alguns atores". Silvério Zebral, da Universidade Cândido Mendes, ponderou que uma das principais dificuldades para a votação da reforma política é o fato de os agentes políticos terem incerteza sobre seus resultados, e "total aversão ao risco". Ele considera que o ponto central da reforma deve ser o fim das coligações proporcionais, e não somente a fidelidade partidária e listas fechadas.