Título: O uso da arbitragem nos processos de recuperação judicial
Autor: Aclibes Burgarelli e Luiz Fernando do Vale de Alme
Fonte: Valor Econômico, 11/08/2005, Legislação & Tributos, p. E2

"É possível usar a arbitragem para solucionar conflitos entre credores e devedores"

Encontra-se em vigor, desde o dia 9 de junho deste ano, o novo sistema jurídico que deverá ser adotado para a solução de crises econômico-financeiras de empresários ou de sociedades empresárias que se encontrarem em estado de insolvência ou em estado de iliquidez. No antigo sistema da Lei de Falências - o Decreto-lei nº 7.661, de 1945 -, o comerciante ou a sociedade comercial que estivessem em crise econômico-financeira não dispunham de opções favoráveis ao oferecimento de um plano de recuperação empresarial junto aos seus credores, com a finalidade de se buscar um caminho para a solução de pagamentos e a manutenção da empresa. Aliás, o conceito de empresa era vago e até impróprio, porque na atividade econômica prevalecia a atividade mercantil, na qual se destacavam os comerciantes individuais e as sociedades comerciais. A falência ou a concordata eram os mecanismos legais que podiam ser utilizados relativamente aos comerciantes ou sociedades comerciais em estado de insolvência ou em estado de iliquidez. Considerava-se em estado de insolvência o comerciante (pessoa física ou pessoa jurídica) que, mesmo alienando todos os seus bens e direitos, não conseguia numerário suficiente para honrar seus compromissos imediatos. De outra sorte, considerava-se em estado de iliquidez o mesmo comerciante que, de imediato, não dispusesse de numerário para pagamento imediato, mas poderia fazê-lo ao longo de certo tempo. Para o caso de insolvência, reservava-se o processo de falência, e para o caso de iliquidez, o processo de concordata. A nova Lei de Falências - a Lei nº 11.101, de 2005 - alterou de forma significativa os critérios antigos e, além de ampliar o prisma de sua aplicação, abraçou a tendência moderna da tentativa de recuperação da crise econômico-financeira do empresário ou da sociedade empresária, remanescendo a falência como exceção para casos de insolvência, a respeito da qual não se apresente, extrajudicialmente, um caminho recuperatório. Na forma do que estabelece o artigo 1º da nova Lei de Falências, são pessoas sujeitas à recuperação e à falência o empresário individual e a sociedade empresária. Apesar da complexidade da estrutura da nova lei, é possível utilizar a arbitragem para solucionar conflitos entre credores e devedores na recuperação. Vejamos o seguinte esquema: admita-se, como ponto de partida, uma linha horizontal na qual, na parte central, situa-se o pedido formulado ao juiz e o despacho de processamento da recuperação. Do lado esquerdo da linha horizontal, a lista nominativa de credores que deve acompanhar o pedido inicial. Do lado direito da linha horizontal, o plano de recuperação, que deverá ser apresentado no prazo de 60 dias, a partir da publicação do despacho de processamento.

O presidente da assembléia de credores poderá propor um compromisso arbitral para solucionar litígios

Abaixo da linha da lista dos credores, tem-se o procedimento denominado verificação de créditos (por parte do administrador, habilitação e divergência, e por parte do juiz impugnações). Abaixo da linha central a indicação dos órgãos da recuperação (administrativo, deliberativo e fiscalizador). Ao lado direito tem-se o procedimento de deliberação, alteração ou rejeição do plano de recuperação. No lado esquerdo, quanto ao procedimento de verificação de créditos, caberá ao administrador judicial, em uma primeira fase, examinar os eventuais pedidos de habilitações e oposição de divergências e, mediante o auxílio de técnicos, elaborar o quadro provisório de credores, se possível sustentado em parecer a respeito do que for importante. Portanto, necessário se faz, neste momento, o conhecimento da técnica de auditoria jurídica para que se produza um parecer com base sobre os direitos de possíveis credores. Tem-se, do outro lado, o plano de recuperação, o qual poderá ser levado à deliberação da assembléia de credores, que será convocada por qualquer credor, com possibilidade de aprovação, de alteração ou de rejeição do plano. Somente se for rejeitado o plano, decidirá o juiz decretando a falência. No mais, prevalecerá a vontade da assembléia quanto ao destino e estrutura do plano. Na assembléia, o presidente da assembléia de credores poderá propor que seja instrumentalizado o compromisso arbitral com o objetivo de solucionar determinados litígios - cujo objeto é o direito patrimonial disponível - com a ajuda da arbitragem. O presidente da assembléia de credores é o administrador judicial (nomeado pelo magistrado) e, se houver interesse da assembléia, será constituído o comitê de credores, órgão meramente fiscalizador dos trabalhos e do cumprimento do plano de recuperação da empresa em questão. Assim, a arbitragem, por ser uma forma simplificada e célere de soluções de conflito, poderá ajudar muito na recuperação das empresas.