Título: Combate à pobreza exige estratégias distintas
Autor: Denise Neumann
Fonte: Valor Econômico, 12/08/2005, Brasil, p. A4

Desenvolvimento Países da América Latina não podem perseguir um só caminho para redução da desigualdade

América Latina não pode ter uma estratégia única de combate à pobreza e à desigualdade social. Apesar de semelhantes no tamanho da pobreza, cada nação tem características distintas e por isso precisa de formas próprias de combate do problema. Em 2002, Brasil, Argentina e Honduras lideravam - pelo lado negativo - o ranking de países mais desiguais da América Latina. Pelo Índice de Gini (síntese de indicadores que quanto mais próximo de zero revela maior igualdade) os três países receberam classificação de "muito desiguais" em 2002, situação que se repete há décadas. O diagnóstico do combate diferenciado é do economista Ricardo Paes de Barros e foi apresentado, ontem, no seminário Distribuição de Renda na América Latina, organizado pelo Instituto Fernando Henrique Cardoso e pelo Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets). Para o Brasil, Paes de Barros conclui que o país precisa de uma estratégia com foco duplo em pobreza e desigualdade. "Se tentarmos reduzir a pobreza só com crescimento, vai demorar; se ao contrário, o país combinar crescimento com políticas de combate à desigualdade, o tempo diminui". Nas contas de Paes de Barros, um crescimento médio de 3% ao ano durante 15 anos reduziria drasticamente a pobreza no Brasil. Se junto com o crescimento, a desigualdade for combatida, o mesmo resultado pode ser alcançado na metade do tempo. Honduras, compara ele, é um país tão desigual quanto o Brasil. Mas se aqui a escolaridade média da população economicamente ativa é de pouco mais de cinco anos, no país da América Central ela já avançou e hoje supera oito anos. "Lá, o caminho é outro", defende. Para Paes de Barros, a chave para combater a desigualdade no país é a educação. O Brasil precisa não necessariamente de mais vagas nas escolas. Essa parte do "trabalho" já foi feita. O aparte de Simon Schwartzman, do Iets, indicou o caminho: "É preciso melhorar a competência da escola". Além do consenso de que a superação da desigualdade no país passa pela educação - mas não se resume a ela -, o seminário se propôs a avaliar experiências latino-americanas de combate à pobreza. Na platéia, muitos ex-integrantes das áreas social, de educação e mesmo econômica do governo Fernando Henrique Cardoso. Apesar da proposta de debate "transversal e apartidário", o governo federal não esteve representado à mesa de debates. Mas também não foi alvo de críticas superficiais. A preocupação era olhar pra frente. O segundo debate do dia se propôs a discutir as "melhores práticas no setor público" de combate à desigualdade e à pobreza. O painel mostrou que a América Latina, infelizmente, ainda não tem experiências maduras e bem-sucedidas para relatar. Afinal, como resumiu Wanda Engel, do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a desigualdade, após recuar nos anos 80, voltou a crescer na região. Entre os gestores públicos, economistas, sociólogos e demais profissionais envolvidos no combate à desigualdade, contudo, já há pistas de bons caminhos a seguir e de erros a evitar. Duas idéias transpareceram: a necessidade de programas muito bem focados, sem que a "focalização" seja encarada como antônimo de um projeto universal, amplo, que atenda camadas expressivas da população; e a importância do "agente" dos programas sociais. Paes de Barros elogiou o programa chileno de combate à pobreza e observou que naquele país a figura do agente pisco-social (que acompanha a família no seu processo de "saída" da pobreza) é fundamental. O Chile, observa ele, pensou em estratégias individuais, no porquê determinada família não reage à pobreza. No Brasil, compara, há diferenças e é preciso, muitas vezes, apostar em estratégias locais pois uma comunidade inteira fica imobilizada. A socióloga Ruth Cardoso, presidente do Comunitas (organização da sociedade civil que deu continuidade a programas do Comunidade Solidária) é uma das estudiosas absolutamente convencida de que no Brasil a descentralização dos programas de combate à desigualdade e à pobreza é fundamental e precisa ser muito mais profunda, senão não eles não funcionarão. Além da descentralização, sustenta, é preciso conhecer, de fato, o "beneficiário". "Os programas de primeiro emprego deram errado. Foram pensados do ponto de vista da estabilidade. Quem disse que os jovens querem emprego estável?", questionou. No México, o governo adotou como estratégia "vender" as reformas necessárias junto com políticas de redistribuição de renda. Além do tripé (pobreza, concentração de renda e baixo crescimento), desigualdades históricas, de raça e etnias, compõem a face estrutural da desigualdade social no país, relatou Gonzalo Hernández Licona, representante do Ministério do Desenvolvimento Social.