Título: Lei de Informática apóia embriões de empresas
Autor: Sérgio Leo
Fonte: Valor Econômico, 15/08/2005, Brasil, p. A2

Longe como está dos holofotes onde se revezam publicitários calvos e pouco éticos, secretárias cínicas, políticos deploráveis e, quem sabe até uma cafetina de Brasília, uma decisão, tomada na semana passada, por resolução do Comitê Gestor da Área de Tecnologia de Informação (Cati), arrisca-se a passar desapercebida. A decisão foi publicada no "Diário Oficial" e não na popular TV Senado, mas mostra como setores alheios à crise continuam gerando bons exemplos do que se pode fazer mesmo em um governo acuado por denúncias e insinuações contra os principais gabinetes da República. O setor é o da política industrial, mais especificamente, o de ciência e tecnologia, e o bom exemplo a ser publicado nos próximos dias no "Diário Oficial" é a decisão, adiada há anos, de permitir a aplicação de recursos gerados pela Lei de Informática para apoiar as chamadas incubadoras de empresas, destinadas a lançar no mercado firmas iniciantes na produção de base tecnológica. Pela Lei de Informática, empresas brasileiras recebem incentivos fiscais como a redução gradual do IPI, uma renúncia fiscal de cerca de R$ 1,1 bilhão por ano, mas têm de aplicar 5% do faturamento bruto no mercado interno, em pesquisa e desenvolvimento de tecnologia de informação. Essa obrigatoriedade cria uma fonte de financiamento para pesquisas e desenvolvimento de produtos no setor entre R$ 460 milhões a R$ 530 milhões por ano, grande parte dos quais aplicada em setores das próprias empresas incentivadas, em associação com centros de pesquisa. Até hoje, só os centros de ensino e pesquisa, como universidades, podiam ser beneficiados com recursos dos incentivos da Lei de Informática. A resolução aprovada permitirá o uso do dinheiro para empresas incubadas, firmas ainda sem condições de disputar fatias de mercado, mas capazes de desenvolver e aplicar produtos inovadores em informática. Para se ter idéia do que representam esses quase R$ 500 milhões em recursos gerados pela Lei de Informática, basta lembrar que o orçamento dos fundos setoriais, destinados a promover inovações e estimular pequenas e médias empresas em setores de ponta, soma R$ 700 milhões. Para o representante dos empresários no Cati, Alexandre Moura, da empresa Light Infocom, a decisão é um "divisor de águas", porque deve estimular a criação e manutenção de incubadoras na área de tecnologia da informação. A decisão não foi tomada sem alguma resistência, porém. Há temores no setor acadêmico de que a permissão para aplicação desses recursos em organismos de caráter quase privado poderia drenar verbas aplicadas em pesquisa pura, e em centros universitários. Embora faça algum sentido, o objetivo da Lei de Informática é, exatamente, estimular a criação de empresas no setor, algo que o apoio direto a incubadoras faz de maneira exemplar.

Decisão é "divisor de águas", dizem empresários

Onze incubadoras já procuraram o Ministério da Ciência e Tecnologia, interessadas nessa fonte de recursos. O ministério espera que o número de instituições interessadas em credenciamento cresça, a partir desta semana, com a publicação da resolução no "Diário Oficial". "Em 15 dias deveremos ter 10 a 15 credenciadas e o sistema em funcionamento", acredita o secretário de Política de Informática do ministério, Marcelo Lopes. Até recentemente, a maior parte da atividade do Comitê Gestor da Área de Tecnologia de Informação se resumia à avaliação dos pedidos de credenciamento das candidatas a receber os recursos previstos pela lei. Essas decisões são, agora, tomadas por voto eletrônico e os integrantes do comitê se reúnem para discutir a política do setor, como a iniciativa sobre as incubadoras. Essa nova forma de agir também aumentou a pressão por resultados nas empresas beneficiadas pela lei, cujas prestações de contas estão acumuladas no ministério. "Hoje ainda discutimos processos de cinco anos atrás", lamenta Lopes, que garante terminar, antes de outubro, a análise de todos os relatórios das empresas relativos a 2000 e 2001 (apenas os das maiores já foram analisados). Até 20 de agosto as análises dos relatórios restantes devem ser concluídas, e as beneficiadas com problemas terão 30 dias "improrrogáveis" para esclarecer o ministério, ou adaptar-se à lei. Entre os beneficiários da Lei de Informática entre 2000 e 2001, cerca de 240 (hoje são 274), o percentual de firmas que não cumpriram com todas as obrigações previstas na lei, ou que têm inconsistências nos relatórios pode estar entre 60% a 70%. É um número alto, e é salutar que, ao lado de decisões sobre a ampliação dos beneficiários, também se esteja cobrando resultados.