Título: Política de saneamento perderá regime de urgência
Autor: Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 15/08/2005, Brasil, p. A3

O governo federal vai retirar a urgência constitucional do projeto de lei que institui diretrizes e uma política nacional para os serviços de saneamento básico no país. O anúncio foi feito pelo relator da matéria na Câmara, deputado Julio Lopes (PP-RJ), em entrevista ao Valor, após reunir-se com representantes de todos os ministérios que participaram de sua elaboração. O fim do regime de urgência vinha sendo reivindicado, com apoio do relator, tanto pela Aesbe, associação que representa as empresas estaduais de água e esgoto, quanto pela Abcon, que reúne as concessionárias privadas do setor. Caso o pedido não fosse atendido, o projeto passaria a trancar a pauta da Câmara, assim que fossem votadas todas as medidas provisórias na mesma situação, informou o parlamentar. O governo federal só concordou com o pleito após a troca do titular do Ministério das Cidades, órgão que coordenou a elaboração e que mais influência teve no desenho final da proposta encaminhada ao Legislativo. O ex-ministro Olívio Dutra, que propôs a tramitação em regime de urgência, era contra. A iniciativa de pedir ao Palácio do Planalto que voltasse atrás foi do atual ministro, Márcio Fortes, após ouvir os argumentos do presidente do Fórum Nacional de Secretários Estaduais de Saneamento, Frederico Antunes, secretário do Rio Grande do Sul. Os dois estiveram reunidos quinta-feira, no gabinete do ministro. Para o deputado Julio Lopes, a complexidade do assunto exige tempo para discussão. Mais do que complexa, a matéria é polêmica. Evidência disso é que 862 emendas foram apresentadas ao texto original encaminhado pelo Executivo. Embora tenha passado mais de dois anos debatendo o assunto internamente e com os setores envolvidos, o governo não conseguiu produzir um texto que tivesse apoio dos Estados e de suas companhias de saneamento. Tanto que, para se contrapor à proposta do governo, a Aesbe e o fórum de secretários estaduais da área apresentaram, no Senado, por meio do senador Gerson Camata (PMDB-ES), projeto alternativo. A Associação Brasileira de Indústrias de Base (Abdib) também prefere o projeto de Gerson Camata. E a Abcon, embora tenha aplaudido a iniciativa do governo, faz reparos à proposta. Entre os segmentos envolvidos, só a Assemae, que representa as autarquias e departamentos municipais de água e esgoto, defende o projeto do ex-ministro Olívio Dutra, considerado muito municipalista. As divergências são muitas, entre elas o fato de o projeto do governo tratar também de resíduos sólidos (lixo). O ponto mais polêmico, no entanto, continua sendo quem deve ser o poder concedente dos serviços de distribuição de água nas regiões metropolitanas- se o Estado ou os municípios. A Aesbe e o fórum de secretários de saneamento entendem que, ao não assegurar a titularidade dos Estados nesses casos, o projeto apresentado pelo governo estimula grandes municípios a romper com as companhias estaduais, para poder assumir e licitar os serviços. Isso prejudicaria municípios pequenos, onde, por falta de escala, os serviços são deficitários e, portanto, precisam ser subsidiados pela tarifa cobrada nas capitais e outras cidades maiores.