Título: Crise pode impedir recorde de 10 trimestres de PIB em alta
Autor: Denise Neumann
Fonte: Valor Econômico, 15/08/2005, Brasil, p. A4

O Brasil encerrou o segundo trimestre com crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em torno de 1% em relação ao primeiro trimestre, já descontados os efeitos sazonais. Se esta estimativa dos analistas estiver correta, o país terá crescido pelo nono trimestre consecutivo. Uma façanha que nos últimos 15 anos foi atingida uma só vez, na virada de 2000 para 2001. A possibilidade do Brasil crescer por 10 trimestres seguidos existe, mas corre o risco de ser abortada não pela recente escalada dos juros, mas pela crise política. O resultado da produção industrial no segundo trimestre surpreendeu os analistas. A alta foi de 2,1% em relação ao primeiro trimestre, um ritmo 3,0% maior que o do terceiro trimestre de 2004, quando o Comitê de Política Monetária (Copom) iniciou a alta da taxa Selic. Para os economistas, a queda de juros - quando começar - será suave, mas ajudará a dar um fôlego extra aos últimos meses do ano. O professor Caio Prates, do grupo de conjuntura do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE-UFRJ), espera um pequeno recuo da produção industrial em julho. Indicadores antecedentes - como produção de automóveis e consumo de energia - explicam a projeção. Até agora, a UFRJ projetava alta de 4,7% para a indústria em 2005. "Se o setor industrial apenas ficar parado no nível de junho, vai crescer mais de 5% no ano", observa Prates. O maior crescimento da indústria, explica o professor, seria suficiente para levar a uma revisão, levemente para cima, do PIB de 3,5% projetado para este ano. "O quadro político mais confuso pede cautela na revisão. Ele pode influenciar a economia", diz ele. A MB Associados trabalha, até agora, com uma projeção menos otimista para o PIB do ano: 2,8%. Mônica Baer, da MB, admite que o ritmo do primeiro semestre indica que o resultado pode ser melhor. "Mas estamos mais para 3,0% que 3,5%", avalia. "A economia não está em rota de aceleração. Julho pode vir mais fraco que junho, mas temos uma retomada na margem", explica Mônica. Os pontos a mais de crescimento do PIB, diz a economista da MB, estão vindo do setor externo. Antes, a consultoria projetava que o setor externo teria uma contribuição negativa para o crescimento do país este ano. "As projeções para o saldo comercial, que passaram de US$ 28 bilhões para US$ 40 bilhões frente a um PIB semelhante indicam que a contribuição externa ficou maior que o esperado", pondera Mônica. Enquanto a produção industrial encerrou o segundo trimestre com alta de 6,1% em relação ao mesmo período do ano passado, o volume exportado de bens manufaturados cresceu 12% na mesma comparação, indicando que uma parcela maior da produção foi para o exterior. Além das exportações, também o crédito continuou forte. "A composição do PIB ficou semelhante a de 2004", diz Mônica. Antes, se esperava impulso maior dos bens não e semi-duráveis. Para o economista-chefe da MCM Consultores, Celso Toledo, a "sensação" de que o país cresceu menos ou de que a economia perdeu fôlego quando na verdade ela já estava em trajetória de recuperação decorre de um fenômeno real. "O país, de fato, migrou de um ritmo de crescimento entre 4,0% e 4,5% ao ano para um ritmo mais próximo de 3,0%", diz ele. "A política monetária teve seu efeito", completa Mônica, da MB Associados. Para Toledo, o cenário do terceiro trimestre é compatível com um PIB de 3,0% no ano. "O resultado não será tão favorável como o do segundo, que cresceu sobre uma base muito fraca", pondera. Ele calcula uma alta de 1,1% do PIB no segundo trimestre ante o primeiro. O BC, pondera ele, conseguiu controlar a inflação sem ter parado a economia, uma novidade em relação a ciclos anteriores. "Mas ainda temos preços fora do equilíbrio", diz ele, citando juros e câmbio. Caio Prates, da UFRJ, explica que a economia cresceu em maio e junho, quando a política monetária completava nove meses de aperto, porque os juros futuros, que refletem o humor dos agentes, já estavam em queda. "Em nenhum momento em que se abriu uma diferença como esta entre a taxa Selic e o juro futuro, a produção industrial deixou de crescer", diz. A diferença entre as duas taxas estava, na semana passada, em quase dois pontos. Por isso, olhando pro passado, Prates vê um futuro de crescimento suave até dezembro. Mas depende da política.