Título: Para conselheiros da República, momento justifica sua convocação
Autor: Caio Junqueira e Cristiane Agostine
Fonte: Valor Econômico, 15/08/2005, Política, p. A7

Com o depoimento do publicitário Duda Mendonça e a revelação de que seus serviços na campanha que elegeu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2002 foram pagos com caixa 2, a crise política atingiu seu nível de maior gravidade e, com isso, aumentaram as pressões para que Lula convoque o Conselho da República. Nos últimos dias, os presidentes da OAB, Roberto Busato, e do PT, Tarso Genro, manifestaram-se em favor da convocação desse órgão, cuja competência para ser acionado é de exclusividade do presidente da República. Na mesma linha, alguns conselheiros também já cobram sua instalação imediata, independentemente de fazerem parte ou não da base governista. "O Conselho não tem sido convocado e deixa os conselheiros tristes, porque nós temos obrigação de apoiar o presidente e de aconselhá-lo", afirma o senador Ney Suassuna (PMDB-PB), integrante do Conselho em razão de ser líder da maioria no Senado. Para o deputado Edmar Moreira (PL-MG), eleito pela Câmara para integrar o órgão, "há motivos e razões de sobra para o Conselho ser convocado, mas esse timing é do presidente". E continua: "Seria o momento oportuno esse de agora, mas só o presidente pode responder porque não convoca", afirma Moreira. O deputado José Carlos Aleluia (PFL-BA), líder da minoria na Câmara, critica o presidente pelo que classifica de descaso com o órgão. "Seria extremamente conveniente que se ouvisse e fosse organizada uma pauta de trabalho pelo Conselho. Mas o presidente está procurando desconhecer a crise." A história recente da Nova República, porém, mostra que o Conselho é mais uma ilustração constitucional do que um órgão que, de fato, tenha alguma vez servido aos presidentes. Desde a sua legitimação pela Constituição Federal de 1988, o país passou por graves crises políticas, como a que acarretou no impeachment do presidente Fernando Collor de Melo, em 1992, e o episódio da compra de votos de parlamentares para a aprovação da emenda da reeleição durante o governo Fernando Henrique Cardoso, em 1998. Ainda assim, nunca foi instalado, apesar de a Constituição prever que o Conselho deva se pronunciar acerca "das questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas" -item no qual a atual situação ensejaria a convocação. Lula prometeu fazer diferente. Foi o primeiro presidente a formar, de fato, o Conselho com todos os seus integrantes: o vice-presidente, os presidentes do Senado e da Câmara, os líderes da maioria e da minoria do Senado e da Câmara, o ministro da Justiça e mais seis membros, dos quais dois nomeados pelo presidente, dois eleitos pela Câmara e dois eleitos pelo Senado, - todos esses com mandato de três anos. Em 10 de março de 2004, empossou o advogado Aldo Lins e Silva, o político Almino Affonso e o deputado federal Edmar Moreira (PL-MG). Em seu discurso, afirmou que, se dependesse dele, o Conselho "certamente" se reuniria muito mais vezes do que havia se reunido até então. "Eu quero desejar a vocês toda sorte do mundo, e dizer que, embora sejam os mais novos membros do Conselho da República, certamente vocês participarão mais das atividades do Conselho do que os velhos membros", afirmou. Nove meses depois e nenhuma reunião realizada, deu posse a Paulo Brossard e ao deputado federal Roberto Balestra (PP-GO) e voltou a garantir que o Conselho se reuniria. "Quero agradecer desde já a disponibilidade e a vontade de participação dos novos membros que, certamente, serão chamados a colaborar com os seus conselhos e pareceres ao Presidente da República, sempre que os interesses superiores da nação brasileira justificarem tal convocação." O que pode estar influenciando a não-convocação do Conselho até o momento é a sua própria formação. Diferentemente do gabinete de crise instalado por Lula, cujos integrantes são pessoas próximas a ele e de dentro do governo -os ministros Márcio Thomaz Bastos (Justiça), Dilma Rousseff (Casa Civil), Antonio Palocci (Fazenda) e Jaques Wagner (Relações Institucionais) - no Conselho da República há parlamentares que fazem oposição acirrada ao governo, como o deputado José Carlos Aleluia e o vice-presidente do PFL, senador José Jorge (PE), além de integrantes da hoje esfacelada base governista, caso dos deputados Roberto Balestra (PP-GO) e Edmar Moreira (PL-MG). Se alguns conselheiros se manifestam pela convocação, outros -como Paulo Brossard e Almino Affonso- mantém a discrição e evitam comentar o assunto. Mas em conversas reservadas cobram a promessa de Lula de que tornaria a convocação do Conselho um hábito. Mesmo com esse quadro, os conselheiros insatisfeitos pela sua não-instalação até agora poderiam seguir as próprias instruções do presidente Lula nas duas posses que deu e cobrar o chamamento: "Muitas vezes o problema pode ser tão grande que o presidente não consiga enxergá-lo. Qualquer membro do Conselho tem o direito, a obrigação, o dever, de tomar a iniciativa, de propor as reuniões, e que isto não seja visto, de forma alguma, como o descumprimento da função do conselheiro. O descumprimento seria se vocês percebessem que alguma coisa não está ocorrendo corretamente e que terá um grave resultado e vocês se omitissem. Isso é muito mais grave do que se tomarem a posição em defesa de que o presidente convoque o Conselho, até porque seus membros têm uma carreira política, administrativa; têm histórias que por si só podem orientar qualquer presidente a errar menos do que habitualmente se erra no Brasil."