Título: Apoio de Dirceu ao ITI criou disputa interna
Autor: Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 15/08/2005, Empresas &, p. B3

Uma acirrada disputa dentro do governo retardou, por pelo menos dois anos, a adoção de softwares livres (de código aberto) no setor público federal. A controvérsia começou no início da gestão Lula, quando dois órgãos - a Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento e o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), autarquia vinculada à Casa Civil - entraram em conflito quanto à definição da política de software livre no governo federal. De acordo com a legislação, cabe à secretaria do Ministério do Planejamento formular a política de TI (Tecnologia da Informação). Já a tarefa do ITI é implementar as políticas de certificação digital. Ocorre que, ao compor as oito câmaras técnicas do Comitê Executivo do Governo Eletrônico, o então ministro da Casa Civil, José Dirceu, nomeou o presidente do ITI, Sérgio Amadeo, para coordenar a câmara responsável pela implementação do software livre. Com o aval de Dirceu, que como ministro da Casa Civil presidiu o Comitê Executivo de Governo Eletrônico, Amadeo deu início a uma agressiva política de disseminação de softwares de código aberto dentro do governo. No primeiro ano da administração Lula, o ministro Dirceu chegou a assinar uma portaria, orientando todos os órgãos da administração pública federal a migrarem para softwares livres. Na ocasião, Amadeo afirmou que, num primeiro momento, o governo induziria os vários ministérios e órgãos públicos a fazerem a migração, mas avisou que, mais adiante, a substituição seria obrigatória. Enquanto isso não acontecia, o presidente do ITI promoveu intensa campanha para convencer ministérios e órgãos públicos a mudarem os sistemas operacionais de suas estações de trabalho ("desktops"). Cinco ministérios (Cidades, Ciência e Tecnologia, Desenvolvimento Social, Cultura e Educação) chegaram a iniciar a migração, que, no entanto, nunca foi concluída. Não demorou muito para que Amadeu e o secretário de Logística e TI do Ministério do Planejamento, Rogério Santana, batessem de frente. Santana reclamava do fato de Amadeo interferir numa área que não era prerrogativa sua. Amadeo, por sua vez, sustentava que cumpria ordens do ministro José Dirceu e que, sendo o coordenador da câmara de software livre, estava apenas desempenhando uma de suas atribuições. O secretário, por sua vez, alegava que o ITI, com 40 funcionários, tem apenas um terço da estrutura de sua secretaria para realizar a tarefa. Além disso, Santana discordava da estratégia usada pelo presidente do ITI para fazer a migração. Na avaliação do secretário, a migração para softwares livres deveria começar pelos sistemas operacionais dos servidores e dos chamados "mainframes" (os grandes sistemas). Para ele, a mudança inicial deve ser a que menos impacta o usuário final de computadores. Santana sugeriu também que a troca nos "desktops" acontecesse quando os prazos das licenças dos softwares proprietários vencessem. Em março deste ano, Amadeo elaborou proposta de decreto presidencial que instituía a obrigação do uso de softwares livres no setor público. Além disso, pediu ao Ministério do Planejamento R$ 200 milhões para implantar esses softwares em 22 mil computadores e 600 servidores. Tanto o decreto quanto a solicitação de recursos não avançaram. Pouco depois de assumir o Ministério do Planejamento, Paulo Bernardo ordenou a Santana que elaborasse uma proposta mais barata e alternativa à de Amadeo. O secretário concluiu que poderia fazer a mesma migração gastando R$ 50 milhões. Bernardo começou a discutir com a ministra da Casa Civil, Dilma Roussef, a volta do ITI para a órbita do Planejamento, uma vez que é lá que são definidas as políticas de TI do governo. Hoje isso não ocorre porque, no governo anterior, ao trocar o Planejamento pela Casa Civil, o então ministro Pedro Parente levou o ITI para a sua nova Pasta.