Título: PMDB ameaça parar trabalhos na Câmara
Autor: Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 28/10/2004, Política, p. A8

Pemedebistas reagem à não- liberação de recursos das emendas Insatisfeitos com o governo, parlamentares do PMDB podem dificultar a vida do governo Lula onde, até agora, não houve dificuldades: a Câmara dos Deputados. Os motivos da insatisfação, que colocaram a cúpula do governo em estado de alerta, são variados e já tiveram impacto negativo - a paralisia dos trabalhos legislativos na Câmara. Um ministro com trânsito no Palácio do Planalto informou ao Valor que a principal razão para a insatisfação é orçamentária. Recentemente, o ministro do Planejamento, Guido Mantega, anunciou que o governo não liberará mais este ano recursos referentes a emendas de parlamentares ao orçamento. O anúncio caiu como uma bomba não só para o PMDB, mas para todos os partidos da base governista. No mesmo dia em que anunciou o represamento dos recursos, Mantega informou que, por causa do excesso de arrecadação de tributos federais, o governo fará créditos suplementares da ordem de R$ 15 bilhões ao orçamento de vários ministérios. "As emendas dizem respeito a apenas R$ 800 milhões, mas o ministro vem a público dizer que não há dinheiro para elas. Isso, claro, gerou muita insatisfação na base", contou um ministro. Convocados para resolver o problema, os ministros José Dirceu (Casa Civil), Aldo Rebelo (Articulação Política) e Antonio Palocci (Fazenda) desmentiram o ministro do Planejamento, assegurando que, após o segundo turno das eleições municipais, os recursos serão liberados. "Até lá, prevalecerá a declaração de Mantega", ponderou um parlamentar da base do governo. "O governo precisa cumprir os seus compromissos." Como segundo maior partido da base de apoio ao governo na Câmara - o maior é o PT - e primeiro no Senado, o PMDB foi o que mais deu ressonância à anunciada escassez de recursos. Até o início de julho, o partido foi aquinhoado com 18,11% dos empenhos feitos no orçamento deste ano a partir das emendas de parlamentares. A questão orçamentária não é o único problema da relação do PMDB com o governo neste momento. Os pemedebistas acham que, em geral, o governo dá um tratamento de segunda classe ao partido. Uma queixa antiga é o fato de o ministro Amir Lando não ter tido liberdade para montar a própria equipe no Ministério da Previdência. Outro assunto que tem dificultado a relação é a emenda constitucional que institui a possibilidade de reeleição para as presidências da Câmara e do Senado. Quando o substitutivo da emenda foi apreciado na Câmara, orientada pelo ministro das Comunicações, Eunício Oliveira, a maioria dos pemedebistas votou contra, ajudando a rejeitar a proposta. A emenda interessa aos atuais presidentes da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), e do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Os dois querem que o tema volte a ser apreciado e, dessa vez, por meio da emenda original e com o apoio do Palácio do Planalto. Na semana passada, o presidente Lula teria instruído seus ministros e líderes a trabalharem para aprovar a emenda. A suposta disposição de Lula em apoiar a emenda está criando fissuras no PMDB porque o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), que controla a bancada do partido no Senado, é contra a reeleição - ele é candidato à presidência da Casa. Nas últimas semanas, Renan trabalhou junto à bancada do partido na Câmara para obstruir as votações e, assim, evitar que a emenda seja apreciada a tempo de influir na eleição das Mesas no início do próximo ano. Renan acredita que, por causa dos feriados, novembro só terá duas semanas efetivas de funcionamento do Congresso. Seu propósito é, portanto, obstruir os trabalhos nessas duas semanas, dificultando sobremaneira a tramitação da emenda da reeleição. Apesar de todos os problemas, o risco de um rompimento do PMDB com o governo ainda não existe. No próximo dia 10, os diretórios regionais do partido vão se reunir para avaliar o resultado das eleições e a relação com o governo. "Os pemedebistas cansaram de ser amantes do governo e, agora, querem casar, com véu e grinalda", diz um parlamentar.