Título: Senado aprova reforma para baratear campanhas
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 19/08/2005, Especial, p. A14

Crise Projeto também considera a bancada eleita para disputa da Mesa

As denúncias de caixa 2 de campanha que envolveram os maiores partidos políticos do país e estremeceram os pilares do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva levaram o Senado a aprovar ontem, em caráter emergencial, uma reforma eleitoral cujo eixo central é a redução de gastos das campanhas eleitorais. Para atingir esse objetivo, a campanha fica mais curta - apenas 60 dias -, os programas eleitorais deixam de ser espetáculos televisivos, ficam proibidos os showmícios e distribuição de brindes. As punições a irregularidades tornam-se mais severas. O texto aprovado é polêmico e incluiu uma alteração inesperada: permissão para que entidades sindicais e de classe façam doações a políticos, o que é vedado pela legislação vigente. Outra modificação relevante é que os tesoureiros de campanha passam a dividir a responsabilidade pela prestação de contas com o candidato. O texto atual da lei 9.504/97 diz que o candidato é "único responsável pela veracidade das informações financeiras e contábeis de sua campanha". "Pode-se chamar a reforma de Lei Delúbio", brincou o relator, senador José Jorge (PFL-PE), referindo-se a Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, um dos personagens centrais da crise política. Caixa 2 não será mais um crime eleitoral brando. A punição passa a ser de três a cinco anos de detenção, resultando ainda na perda de registro do candidato e do fundo partidário. Apesar de a reforma emergencial não tratar de questões estruturais, o texto estabeleceu uma mudança importante: para efeitos de representação na Câmara e definição de tempo de TV dos partidos vale a bancada eleita, e não a empossada. Esta mudança tende a coibir o troca-troca partidário que marca os meses antes do início da legislatura. A proposta foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, por 12 votos a 1, em caráter terminativo (sem necessidade de votação em plenário). Se nenhum senador apresentar recurso para votação em plenário, a reforma será apreciada na CCJ da Câmara. Para que as regras entrem em vigor em 2006, a votação deve estar concluída até 30 de setembro. O autor da proposta, senador Jorge Bornhausen (PFL-SC), rechaçou a abertura para doações de sindicatos, incluída de última hora pelo relator e apoiada por petistas. "A contribuição sindical é estabelecida em lei. Trabalhadores querem que os sindicatos defendam seus direitos perante os empregadores, e não apóiem políticos. O dinheiro dos sindicatos vem de cada trabalhador", disse. "Só pode financiar campanhas o mundo do capital? Por que o mundo da cidadania não pode?", questionou o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). Se as regras forem acatadas pela Câmara, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e membros do governo não poderão fazer pronunciamentos em cadeia de rádio e TV seis meses antes das eleições, "salvo em caso de grave e urgente necessidade pública". A União também não pode, um semestre antes do pleito, realizar transferência voluntária de recursos a Estados aos Municípios. Pelo mesmo período ficam vedadas publicidade institucional e inauguração de obras. O limite de doação de pessoas jurídicas permanece o mesmo, ou seja, 2% da receita bruta. Além disso, se for detectada irregularidade na doação, a empresa fica proibida de participar de licitação pública e celebrar contratos com a administração pública por cinco anos. Irregularidade em arrecadação também pode deixar os partidos à míngua. O texto diz que as legendas que descumprirem as normas ficarão sem as cotas do fundo partidário por três anos. O relator acatou sugestão para que até 30% das doações das empresas a políticos possam ser revertidas em benefício fiscal. Essa regra, no entanto, precisará estar explicitada em lei específica e não deve valer para 2006. Outra idéia que não deve vingar, por ser inconstitucional, é a proibição para que institutos de pesquisa divulguem sondagens 15 dias antes do pleito. A reforma eleitoral de emergência proíbe doações de ONGs, sociedades esportivas e beneficentes, e pessoas jurídicas sem fins lucrativos. "Nada do que é proibido deixa de existir. Acho que não deve haver restrições exatamente para evitar o caixa 2. Mas vamos começar aos poucos, com os sindicatos", disse José Jorge, que admitiu ter feito uma concessão para aprovar o texto. O entrave à aprovação da reforma eleitoral deve ser muito maior na Câmara, sobretudo pelas restrições impostas ao horário eleitoral gratuito e inserções. Só os candidatos e filiados do partido podem aparecer nos programas. São vedadas gravações externas, montagens, trucagens, computação gráfica, uso de efeitos especiais, e até desenhos animados. "Vamos substituir artifícios televisivos pela política", concluiu Mercadante. Emenda do petista, aprovada, "veda a distribuição, ao longo de toda a campanha, de camisetas, bonés, chaveiros, brindes e afins, assim como qualquer outro bem que possa proporcionar vantagens ou utilidade ao eleitor". Para evitar poluição visual, a proposta veda ainda propaganda política em locais públicos.