Título: Reforma da Previdência deveria ser tema central na eleição de 2006, diz ministro
Autor: Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 23/08/2005, Brasil, p. A2

O ministro da Previdência, Nelson Machado, quer que os partidos políticos aproveitem a campanha eleitoral de 2006 para iniciar, com a sociedade, a discussão sobre uma nova reforma previdenciária no Brasil. Para ele, as possíveis soluções para dar sustentabilidade de longo prazo ao regime de previdência social brasileiro "deveriam ser ponto fundamental dos programas de todos os candidatos" à Presidência da República. "Esse é um bom tema para as eleições. Todos os partidos deveriam olhar para isso e discutir o que eles imaginam que poderia ser feito", disse Machado, em entrevista ao Valor. Na sua opinião, assim como já ocorre com muitos países da Europa, o Brasil também terá de reavaliar a sustentabilidade de seu sistema de previdência diante de fatores como o aumento da expectativa de vida da população. Com 23 milhões de beneficiários, o regime geral de previdência social (RGPS) brasileiro tem apresentado déficits bilionários e crescentes nos últimos anos, demandando cada vez mais recursos fiscais do Tesouro Nacional. Só em 2004 foram R$ 31, 9 bilhões. O que cabe ao atual governo, diz o ministro, já está sendo feito: um choque de gestão para aumentar a arrecadação, melhorar o atendimento à população, suspender benefícios indevidos já existentes e, ainda, combater as vulnerabilidades do sistema de concessão para evitar novas fraudes e irregularidades. Segundo ele, a melhoria na gestão é necessária para que o governo consiga ter a dimensão do valor correto das obrigações do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) para com aposentados, pensionistas e outros beneficiários e, assim, saber a verdadeira magnitude do déficit, que não se consegue extinguir só com medidas administrativas. Para Machado, só depois disso é que se poderá debater se é preciso ou não uma nova reforma previdenciária. Antes, diz, é preciso ter clareza sobre quanto a atual legislação gera de gastos com benefícios. Por entender que a melhoria da gestão é uma etapa prévia e obrigatória, Machado defende que uma possível nova mudança nas regras de acesso à aposentadoria e de financiamento do regime "não é dicussão para este governo e sim para o próximo", a começar pela campanha que o elegerá. "Na hora em que houver convicção de que o regime está enxuto e limpo (sem pagamento de benefícios indevidos), a sociedade terá que olhar para isso", afirma o ministro. O INSS paga por ano cerca de R$ 140 bilhões em benefícios previdenciários. Duas medidas estão sendo tomadas pelo ministério para separar o que é despesa correta, gerada pelo atendimento à atual legislação, do que é resultado de irregularidade. Uma delas, preventiva, é o levantamento das vulnerabilidades dos sistemas de registro e controle usados na concessão de novos benefícios. Com investimentos em tecnologia de informação, Machado assegura que as brechas descobertas estão sendo fechadas. Outra medida é um pente fino no cadastro de benefícios já existentes para pegar e suspender os irregulares, a partir de um censo virtual, informa o ministro. Foram selecionados para averiguação os cadastros que apresentavam alguma inconsistência ou falta de dados. Quando os respectivos beneficiários comparecerem à rede bancária e acessarem os caixas eletrônicos para sacar sua aposentadoria ou pensão, os terminais emitirão uma mensagem solicitando o comparecimento a uma agência do INSS. Se a pessoa não atender ao pedido de regularização de cadastro na primeira vez, antes de ter o benefício suspendido será chamada outras vezes, da mesma forma e também por publicação de edital. O tempo de espera tolerado pelo INSS antes de suspender o benefício - em caso de não-comparecimento do segurado para regularização de cadastro - ainda está sendo definido. A definição deve sair no fim do mês. Machado explica que o modelo precisa ser bem pensado, para não ser juridicamente contestado. O ministro não tem ainda estimativa confiável sobre o percentual dos benefícios indevidos, sujeitos à suspensão. "Já ouvi falar em 10%, o que seriam R$ 14 bilhões. Mesmo que sejam só 2%, é muito dinheiro (R$ 2,8 bilhões)." No dia 18, um decreto do presidente Lula mudou a estrutura do INSS, criando uma diretoria de atendimento e gerências regionais. Conforme o ministro, isso vai trazer ganhos de eficiência. A nova diretoria vai cuidar do relacionamento com os segurados e recebedores de benefícios. Também terá como missão garantir o bom funcionamento dos sistemas informatizados utilizados nas agências, e o relacionamento dessas com a Dataprev, empresa de processamento de dados da Previdência. As gerências regionais, por sua vez, vão cuidar da padronização de procedimentos entre as 102 gerencias executivas do instituto. Machado diz que o foco na melhoria do atendimento é possível porque o ministério deixou de cuidar da arrecadação de contribuições, com criação da Receita do Brasil, no âmbito do Ministério da Fazenda, resultado da fusão da Receita Federal com a Receita Previdenciária. "Não fazia sentido manter duas máquinas de arrecadação e de fiscalização sobre o mesmo objeto, que são as empresas." O ministro não acredita que a fusão traga perda de arrecadação para a Previdência, nem mesmo na fase de transição. Independente disso, Machado confirmou que o ministério talvez tenha que rever a meta-teto de déficit para 2005, fixada inicialmente em R$ 32 bilhões e considerada por ele muito ambiciosa. Machado não quis adiantar qual seria a nova meta, porque os números ainda estão sendo estudados.