Título: Soy loco por ti América
Autor: Flavia Lima
Fonte: Valor Econômico, 25/08/2005, EU &, p. D1

Captação de fundos que aplicam em ações de empresas latino-americanas chega a 27,27% no ano, o melhor resultado entre os países emergentes

Os investidores estão cada vez mais de olho nos países emergentes e, nesse universo, dão especial atenção para a América Latina. Enquanto os fundos de mercados emergentes em geral registram uma captação líquida no ano perto de 7% do patrimônio, as carteiras focadas exclusivamente em ações de empresas latino-americanas captam o correspondente a 27,27% em igual período. É o maior percentual entre as regiões pesquisadas pela consultoria americana Emerging Portfolio Fund Research (EPFR). O estudo mostra que os fundos voltados para a América Latina receberam US$ 1,346 bilhão no ano, até o dia 17. No período, o patrimônio como um todo, incluindo a rentabilidade e dinheiro novo, cresceu 70%, dos US$ 4,8 bilhões reunidos em janeiro para os US$ 8 bilhões atuais. Em termos de novos recursos, é o maior avanço percentual entre os emergentes, à frente até mesmo dos fundos voltados para ações do badalado Leste Europeu, do Oriente Médio e da África (ver quadro ao lado). Até o dia 17, estas carteiras captaram US$ 3,3 bilhões, uma alta de 22,3% sobre o patrimônio de dezembro de 2004. Há pelo menos três anos, os mercados emergentes vivem em um ciclo virtuoso, no qual a alta dos preços das commodities favorece os ativos destes países que, ao competirem com as baixas taxas de juros pagas pelos mercados desenvolvidos, têm levado vantagem, diz o gestor de portfólio offshore da HSBC Investments, Luiz Ribeiro. Segundo ele, a expectativa era de que essa fase de alta dos emergentes terminasse este ano, com o recuo das commodities, o que não se confirmou. "A expectativa de ganhos continua, pelo menos por mais seis meses", diz o executivo, acrescentando que a instituição estuda lançar um fundo para a América Latina. O interesse dos estrangeiros aparece claramente nos números do mês da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Até dia 19, o saldo das aplicações externas está positivo em R$ 558,9 milhões - o quarto melhor saldo mensal do ano -, ampliando o total em 2005 para R$ 3,566 bilhões. Por isso, os estrangeiros têm sido o motor da alta da Bovespa, mesmo com toda a instabilidade política. E a festa para os latinos-americanos parece estar longe do fim. Nos sete dias encerrados em 10 de agosto, os fundos de ações globais voltados para ações da região atingiram o recorde de captação semanal de US$ 164 milhões. Na semana seguinte, o resultado foi ligeiramente menor, US$ 139 milhões, mesmo assim bem acima da média semanal, de US$ 34,6 milhões. De modo geral, os fundos voltados para mercados emergentes vão muito bem. Até o dia 17, as carteiras receberam US$ 8,7 bilhões - o triplo do registrado no ano passado, superando o recorde de US$ 8,6 bilhões de 2003. Esses dólares estão impulsionando os mercados da região. Dados da Economática indicam que, em dólar, os principais índices de bolsas latino-americanas superam os americanos. Os destaques ficam para a bolsa colombiana, em alta de 64,6% em dólar, o Índice de Energia Elétrica brasileiro (IEE), que sobe 24,9% no ano, e o indicador peruano, em alta de 24,7%. O chileno Ipsa ganha 21,3% e a bolsa mexicana, 18,3%. O principal indicador argentino, o Merval, sobe 13,6%, à frente do Ibovespa, em alta de 12,5% em dólar. Tudo isso frente a uma alta de 0,5% do S&P 500, e de quedas de 1,8% do Nasdaq e de 2,4% do Dow Jones. Alguns fundos latino-americanos administrados por gestores brasileiros confirmam o bom momento pelo qual passam os emergentes. O BNP Paribas Parvest Latin America, por exemplo, registra rentabilidade de cerca de 20% no ano em dólar até 23 de agosto. Em 2004, o ganho acumulado foi de 35,26% e, um ano antes, de 72,82%. "É difícil encontrar uma aplicação com três anos consecutivos de performance parecida com esta", diz o diretor de renda variável da asset do BNP Paribas, Jacopo Valentino. Segundo ele, o patrimônio do fundo praticamente dobrou em 12 meses e hoje acumula US$ 210 milhões. As principais apostas da carteira são Brasil e México - em linha com os fundos latino-americanos que, em média, têm cerca de 50% de seus recursos investidos em ações de empresas brasileiras e outros 30% em papéis de companhias mexicanas. Valentino diz que 2005 tem sido um ano favorável às carteiras voltadas para a América Latina em especial porque as economias americana e chinesa vão bem. "Enquanto o ritmo de crescimento destes países for bom, estes fundos terão boa performance", diz. "A exceção talvez seja o Brasil, que só cresce quando o assunto é exportação." Outro fundo voltado para ações latino-americanas e que também tem gestão local é o ABN Latin America Equity Fund. O fundo ganha 21,7% em dólar no ano até o dia 23. Segundo dados do site Fortuna, no período, a carteira captou US$ 135 milhões, fazendo com que o patrimônio total chegasse a US$ 751,335 milhões. "Faz sentido investir em emergentes, um título de um banco americano paga de 3% a 4% em dólar ao ano, muito abaixo do retorno desses fundos", diz Gilberto Nagai, gestor de América Latina da asset do ABN Amro. Por isso, diz, muitos fundos globais escolhem a região para melhorar a performance da carteira. Para Ribeiro, do HSBC, os preços das ações continuam atrativos em termos relativos. A pesquisa mensal com gestores globais da Merrill Lynch confirma esta percepção. Em termos de preferências regionais, 44% dos 288 gestores estão com baixa exposição a ativos americanos e 42% estão acima da média em ações de mercados emergentes. Ribeiro afirma, no entanto, que alguns fatores podem reverter o quadro favorável, como uma alta da inflação nos Estados Unidos. Isso obrigaria o banco central americano a elevar os juros, puxando o freio da economia global e roubando um pouco do apelos dos emergentes. "Uma queda abrupta do crescimento chinês seria também muito ruim", diz. Jacopo, do BNP Paribas, lembra que o principal problema do Brasil hoje não é a crise política, mas a falta de crescimento. "É assim que o investidor estrangeiro enxerga o país, embora ele esteja bem mais otimista do que os próprios brasileiros." (Colaborou Luciana Monteiro)