Título: Governo tenta mais uma vez acabar com a "farra" do IR
Autor: Josette Goulart
Fonte: Valor Econômico, 25/08/2005, Legislação & Tributos, p. E1

Tributário Novo texto da MP 252 revoga artigo e cobra imposto economizado em fusões, cisões e incorporações

O governo federal tenta mais uma vez acabar com a "farra" do Imposto de Renda inserida na última lei assinada por Fernando Henrique Cardoso e Everardo Maciel. A Lei nº 10.637 permite por meio de um planejamento tributário em fusões, cisões e incorporações que as empresas reduzam drasticamente seu IR a pagar. O artigo 36 dessa norma está novamente para ser revogado e desta vez a previsão está no artigo 99 do projeto de lei de conversão da Medida Provisória nº 252, aprovado ontem na Câmara dos Deputados. Além da revogação do artigo, o governo inseriu ainda na MP do Bem o artigo 37 que prevê que todas as empresas que já tenham se beneficiado do esquema tenham que pagar o Imposto de Renda que economizaram. A primeira tentativa de acabar com a benesse ocorreu com a MP 232, editada no fim do ano de 2003 e que foi veemente combatida pelo empresariado. Apesar de todos os recortes que sofreu, a revogação do artigo 36 da Lei 10.637 permanceu na MP. Mas o Congresso Nacional, entretanto, ao transformar a MP na lei nº 11.119 retirou a revogação, em 25 de maio deste ano. Desde essa data, advogados correm atrás de empresas interessadas em se beneficiar da legislação, que não tem como ser contestada pelo Fisco. A corrida por clientes não é à toa, já que alguns advogados conseguem honorários de até 20% sobre a economia que a empresa tiver com imposto de renda. E essa economia pode atingir bilhões. Tanta economia pode ser obtida com uma manobra relativamente simples. Com o artigo 36 da Lei nº 10.637, o governo permitiu que as empresas que estivessem com seu capital desatualizado fizessem a reavaliação sem pagar os tributos que decorreriam deste ganho de capital. O advogado Alessandro Amadeu da Fonseca, do escritório Mattos Filho, dá um exemplo concreto. Se uma empresa de participações, por exemplo, possui ações de uma empresa operacional que está com seu capital desatualizado, ela precisa apenas criar uma terceira empresa. Essa terceira empresa recebe o capital já reavaliado a valor de mercado por meio de um laudo contábil. Depois disso, o novo empreendimento incorpora a operacional e pode se beneficiar da dedutibilidade do ágio, prevista na legislação do Imposto de Renda. O artigo 386 da Lei do IR diz que a pessoa jurídica que incorpora outra pode amortizar o valor do ágio em 1/60 (um sessenta avos) do total para cada período de apuração, ou seja, pode deduzir o ágio de seu imposto de renda a pagar, mensalmente, por cinco anos. Mas antes da 10.637, a empresa controladora, no caso exemplificado, a de participações, teria que pagar o Imposto de Renda sobre o ganho de capital que ela teria, já que seu balanço também é atingido pela operação. O tributarista Eduardo Fleury explica que o artigo 36 justamente veio isentar a empresa controladora de pagar o IR sobre a reavaliação de capital de empresas coligadas ou controladas. Esses tributos ficam diferidos no balanço e o imposto de renda só seria cobrado no caso de venda de ativos. Os advogados contam um caso real de uma companhia que valorizou seu capital de R$ 800 milhões para R$ 8 bilhões. O desconto desse ágio de R$ 7,5 bilhões permitiu uma economia de R$ 200 milhões, por ano, em imposto de renda. No caso dessa empresa, IR zero por cinco anos. Mas o governo está empenhado em acabar com essa "farra" do IR. E quer que as empresas que já se beneficiaram paguem o imposto de renda da operação a partir de janeiro de 2006. O artigo 37 do projeto de lei de conversão da MP 252 diz que o saldo, existente em 31 de dezembro de 2005, correspondente à diferença entre o valor de integralização de capital, ou seja, do valor da empresa antes da reavaliação, e o valor apurado após a reavaliação dos ativos, ("nos termos do art. 36 da Lei nº 10.637", diz o texto), terá que ser computado na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL em 20% do total da diferença a cada período de apuração. Fonseca, do Mattos Filho, explica que aquele ganho de capital que ficou diferido e que só seria pago no caso de venda da empresa, precisa agora ser pago a partir de 2006. Mas o assunto vai gerar muita discussão porque os advogados já dizem que se trata de direito adquirido. Por outro lado, o governo pode alegar que está criando uma norma tributária e que em nenhum momento falou em retroatividade da lei. Tanto o artigo 37 da MP 252 quanto o artigo 99 passaram ontem na Câmara dos Deputados e agora enfrentam o Senado. Da última vez que o governo tentou aprovar a revogação do citado artigo da 10.637, no Congresso Nacional, o tema passou despercebido. O tributarista Wilson Alves Polônio, da WAP Consultoria, diz que a esperança é que os artigos não passem, caso contrário, será difícil para as empresas que não concretizaram o planejamento corram atrás do benefício e depois discutam com o Fisco. Isso porque a operação leva pelo menos dois meses para ser montada e a revogação passa a valer a partir da aprovação MP.