Título: Brasil e China negociam autolimitação de importações
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 26/08/2005, Brasil, p. A3

Comércio exterior Negociação envolve têxteis, máquinas e calçados

Os governos do Brasil e da China negociarão um acordo de autolimitação das exportações chinesas para o país. O Brasil pleiteará restrições para os embarques de tecidos e confecções, calçados, ótica, máquinas e brinquedos. O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, reúne-se na segunda quinzena de setembro com o ministro do Comércio da China, Bo Xilai, para tratar do assunto. Segundo Armando Meziat, secretário-interino de Comércio Exterior, Furlan recebeu na quarta-feira uma carta de Bo Xilai concordando com a negociação e com a visita do Brasil. É a terceira correspondência trocada entre os dois ministros sobre o assunto. A aproximação foi feita pelos chineses. Bo Xilai sugere na carta a ida de uma missão técnica precursora. O Brasil concordou e uma equipe da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), liderada por Meziat, segue para Pequim entre 10 e 12 de setembro. Furlan chegaria a cidade por volta do dia 19, depois de acompanhar visita presidencial a Nova York em 15 de setembro. "Nosso grande objetivo será conseguir um acordo de autolimitação das exportações chinesas. Isso seria uma forma de estreitar as relações Brasil e China", afirmou Meziat ao Valor. Ele salientou que a negociação bilateral não está relacionada a publicação do decreto de salvaguardas, que se encontra em análise na Casa Civil. "Os dois processos seguem em paralelo", disse. A regulamentação das salvaguardas, previstas no protocolo de entrada da China na Organização Mundial de Comércio (OMC) e aprovadas pela Câmara de Comércio Exterior (Camex) há dois meses, ainda não foi publicada. Segundo Meziat, a organização dos dados para o acordo está "adiantada". Os setores preparam números que demonstram o impacto das importações chinesas no mercado interno. Até julho, as importações da China subiram 48% ante igual período de 2004, para US$ 2,755 bilhões A participação da China na pauta de importação do Brasil passou de 5,5% para 6,9%. Os dados do setor privado devem indicar que as importações chinesas estão desorganizando o mercado, deslocando a indústria nacional e reduzindo a margem de lucro. O governo espera sugestões de qual deve ser a cota imposta aos chineses. Meziat diz que os setores tem até segunda-feira para enviar os estudos. "Só vai participar da negociação quem fornecer os dados", ressalta. O Mdic acredita que deve receber documentação dos setores têxtil, calçados, máquinas, ótica, e, talvez, de brinquedos. "Temos grandes chances de ter êxito". Críticos ferozes do reconhecimento da China como economia de mercado pelo Brasil, os empresários estão divididos sobre um acordo de restrição voluntária das importações chinesas. Alguns demonstram animação, outros não concordam com o mecanismo. Quem é contra teme um enfraquecimento do Brasil nas negociações com a Argentina, já que é o mesmo mecanismo que o parceiro do Mercosul tenta impor ao Brasil. "Não tenho dúvida que os resultados serão positivos", disse o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Josué Gomes da Silva. Ele argumenta que o mecanismo de salvaguardas também prevê uma negociação entre os países. "O objetivo é um só", diz. O empresário acredita que as futuras cotas serão respeitadas pelos chineses ou o governo brasileiro "tomará atitudes rígidas". Mesmo assim, Gomes da Silva insiste na regulamentação das salvaguardas, que "não devia ser um bicho-de-sete-cabeças". Mas baixou o tom das críticas sobre o atraso na publicação do decreto. "Gostaríamos que a implementação de medidas tivesse a velocidade da iniciativa privada, mas isso não ocorre no governo". A Abit não informa quais produtos pretende incluir na negociação. As importações brasileiras de têxteis chineses aumentaram 47%, de janeiro a julho, para US$ 82,8 milhões. Fontes do setor relatam forte crescimento nas compras da China de tecido de filamento em poliéster, calça de malha de fibra sintética feminina e calça de malha de algodão masculina. Newton de Mello, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), informa que o setor está solicitando proteção contra as importações chinesas de injetoras plásticas. As importações dessa máquina, que era próxima de zero em 2003, saltou para 500 unidades em 2004, pouco menos que metade do mercado, que está estimado em 1,2 mil. Ele acredita que a compra de cerca de 300 unidades seria "aceitável". Segundo Heitor Klein, diretor-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), a entidade não foi informada formalmente pelo governo da intenção de negociar um acordo de auto-limitação com a China. Ele informou que está pedindo providências por conta do forte aumento das importações de produtos chineses. Segundo Klein, os problemas são críticos para tênis de pano, sapatos feitos com material sintético, e alguns tipos de calçados masculinos de couro. O acerto costurado por Brasília e Pequim deve seguir o modelo adotado no acordo entre União Européia e China para restringir as exportações de produtos têxteis do país asiático. O acordo foi fechado em junho e já está provocando problemas. As importações de blusas, camisetas e sutiãs chineses pela UE excederam em mais de 70% as cotas permitidas para o ano. Os produtos chineses estão retidos nos portos, provocando sérias perdas para o varejo europeu. Uma equipe técnica da UE está em Pequim para tentar resolver o problema.