Título: Rumores de 'acordão', acirra disputa entre CPIs
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 26/08/2005, Política, p. A6

A disputa política entre as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) instaladas no Congresso beirou a irracionalidade ontem. Em resposta aos rumores de que pode haver um "acordão" para poupar parlamentares e reduzir o ritmo de investigações, integrantes das três comissões - dos Bingos, do Mensalão/Compra de Votos, e dos Correios - aprovaram uma avalanche de convocações e transferências de sigilos, sem se importar se invadiam a seara de apuração da comissão alheia. Um grupo de parlamentares teme que o "embaralhamento" entre comissões inviabilize as investigações. A oposição usa a CPI dos Bingos para pressionar o governo, já que todos os integrantes são senadores, a presidência é do PFL, e a relatoria é de um pemedebista mais independente. A base aliada trabalha para jogar na CPI Mista do Mensalão assuntos mais delicados e concentrar só lá toda a apuração envolvendo parlamentares, já que lá tem maioria garantida. A CPI dos Correios, cujas investigações estão mais adiantadas, fica no meio da encruzilhada. O resultado da batalha investigativa, ontem, foi um corre-corre, insatisfação generalizada, convocações replicantes de depoentes, e a elevação, à última potência, da guerra de egos dos políticos. Uma guerra, aliás, que obrigou a TV Senado, sob pressão de um sem número de parlamentares, a fazer um rodízio para transmitir ao vivo as sessões das três CPIs. O presidente do Senado, Renan Calheiros, foi acionado para tentar dirimir conflitos. Em resposta ao presidente da CPI dos Correios, Delcídio Amaral (PT-MS), disse que não tomará a iniciativa de reunir os integrantes das comissões, pois isso poderia parecer interferência no andamento das investigações. Prometeu, no entanto, colaborar no que for necessário para trazer as CPIs "de volta à racionalidade". Na segunda-feira, PFL e PSDB farão uma reunião para analisar o quadro de balbúrdia nas CPIs. "Tudo que o governo se negar a investigar nos Correios nós vamos jogar para a CPI dos Bingos", disse um oposicionista, admitindo que a comissão é o instrumento de pressão do PFL e do PSDB. Não por acaso a oposição colocou na comissão dos Bingos senadores de maior expressão e experiência política, como Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) e Tasso Jereissati (PSDB-CE). "O problema é que o Delcídio (dos Correios) estava até agora fazendo tapeação. Agora que aprovamos as coisas aqui resolveram agir. Nós vamos fazer o melhor relatório", garantiu ACM. Foi dele o requerimento aprovado para convocar o doleiro Antonio Oliveira Claramunt, o Toninho da Barcelona. A oposição ameaça quebrar, também na CPI dos Bingos, os sigilos do presidente do Sebrae, Paulo Okamotto, que ontem foi derrotado na CPI Mista dos Correios. Enquanto isso, na CPI do Mensalão, os parlamentares avançavam na investigação sobre fundos de pensão. Três hipóteses foram apresentadas pelos próprios deputados e senadores para justificar o fato: 1) represália à CPI dos Correios, que na próxima semana vai apresentar um relatório parcial sobre indícios de que parlamentares quebraram o decoro e podem ser cassados; 2) reação às críticas de que é a comissão do "acordão"; 3) uma decisão inevitável diante da desastrada sessão sigilosa realizada com dirigentes dos fundos. Um dia antes, dirigentes de três fundos - Previ, Funcef e Petros - apareceram espontaneamente na CPI para prestar esclarecimentos. "Eles chegaram na CPI sem aviso prévio", disse o relator, deputado Ibrahim Abi-Ackel (PP-MG). "Foi uma estratégia burra. Caíram de ponta cabeça", emendou um outro governista membro da CPI. Abi-Ackel considera que investigar os fundos não é tarefa da CPI do Mensalão. "A CPI chegou a um entendimento de que, agora, se esses dirigentes dos fundos não fossem ouvidos, passaríamos a sensação de que fizeram alguma revelação na sessão fechada", explicou o relator. Para Delcídio Amaral, a disputa é insensata. "Sinceramente, se continuar assim vamos criar um ambiente de desordem no Congresso que será um desastre", disse o petista. Cabe à CPI dos Correios, lembrou ele, investigar a origem dos recursos das contas do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza. "Os fundos de pensão são fontes por conceito", disse o senador. "Ou nos entendemos, ou seremos totalmente desmoralizados. O presidente do Congresso terá que definir as atribuições das CPIs. Não vejo outra maneira", desabafou Osmar Serraglio. (MLD)