Título: STJ autoriza promotores a fazerem investigação criminal
Autor: Thiago Vitale Jayme
Fonte: Valor Econômico, 29/10/2004, Política, p. A11

O Ministério Público ganhou uma boa argumentação para convencer os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) da faculdade de promotores de realizar investigações criminais. Os magistrados da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiram, ontem, aceitar recurso do MP do Rio de Janeiro e acataram a tese de que o órgão presidido pelo procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, pode realizar diligências. A argumentação dos procuradores foi acatada por três dos cinco ministros da Sexta Turma. O MP-RJ defendia a legalidade de apurações de irregularidades no Procon carioca realizadas pela 9ª Promotoria de Investigações Penais do estado. A Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça fluminense havia determinado a interrupção das investigações. Os desembargadores entenderam já haver investigação em andamento por parte da Polícia Civil. A alegação do MP é semelhante à tese levantada junto ao STF. Tanto o artigo 129 da Constituição quanto a Lei Orgânica Nacional do MP dão prerrogativas investigatórias ao órgão. Os procuradores lembraram que a Quinta Turma do próprio STJ já tem decisão anterior favorável a eles. Argumentaram também que as polícias não têm exclusividade na condução dos inquéritos. Justamente o relator do caso na turma, ministro Paulo Medina, não aceitou a tese levantada pelo MP. Foi contrariado por três colegas e o resultado final foi de três votos a dois. Quem iniciou a tendência contrária foi o ex-presidente do STJ, Nilson Naves. Como o MP, o magistrado não aceita a exclusividade policial para fazer investigações. Ele explicou que não há artigo na Constituição que dê à polícia o direito privativo de liderar inquéritos. E não há proibição da participação do MP, pelo contrário. "Há indícios aqui, ali e acolá em direção à legitimidade da atuação do Ministério Público". O ministro usou argumentação do próprio MP para sustentar seu ponto de vista. Deu o exemplo do poder investigatório de comissões parlamentares de inquérito do Congresso Nacional e de Assembléias Legislativas. Naves rebateu o entendimento defendido por policiais de que investigações feitas pelo MP não seriam fiscalizadas por ninguém e abusos poderiam ser cometidos. Para o ministro, essa tarefa cabe aos juízes. Paulo Gallotti e Hamilton Carvalhido acompanharam o seu voto. Hélio Quaglia Barbosa votou com o relator Medina. A Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) divulgou nota em comemoração à decisão da Sexta Turma do STJ. "A decisão tem reflexos extremamente positivos e acreditamos que ela seja referendada pelo STF", disse o presidente da entidade, João de Deus Duarte. Embora importante, a decisão não altera a forma como investigações vêm sendo feitas. O julgamento fundamental para o futuro do MP está em andamento no Supremo. Caberá à mais alta corte do país definir até onde vão prerrogativas investigatórias de procuradores e promotores. O julgamento já começou e foi interrompido por um pedido de vista do ministro Cezar Peluso no dia 1º de setembro. Os magistrados julgam o Inquérito 1.968 no qual o deputado federal Remi Trinta é acusado de desvio de recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) por meio da Clínica Santa Luzia, em São Luís. Os advogados do parlamentar questionaram a validade das investigações feitas, exclusivamente pelo MP. Os ministros Marco Aurélio Mello, relator do caso, e o presidente do STF, Nelson Jobim, já votaram. Entendem ser da polícia a faculdade de fazer investigações criminais. Joaquim Barbosa, Eros Grau e Carlos Britto votaram favoravelmente aos procuradores. O advogado Celso Vilardi lembrou que várias decisões semelhantes já foram tomadas em outros tribunais brasileiros. "Mas não acho que elas influenciarão tanto os ministros do STF", diz. Ele é contra o poder de investigação do MP. "A experiência demonstra que inquéritos liderados pela polícia são mais concretos e aprofundados."