Título: IGPs em baixa indicam inflação comportada em 2006
Autor: Sergio Lamucci
Fonte: Valor Econômico, 29/08/2005, Brasil, p. A3

Com a forte valorização do câmbio e a queda dos preços agrícolas nos últimos meses, os Índices Gerais de Preços (IGPs) devem fechar o ano em níveis baixos, talvez abaixo de 2%. O comportamento favorável dos IGPs aponta para uma menor inércia inflacionária em 2006, já que boa parte dos preços administrados, como tarifas de telefonia e energia elétrica, são corrigidos por esses indicadores. Isso deve facilitar a tarefa do Banco Central (BC) de fazer a inflação medida pelo IPCA convergir para o centro da meta de 2006, de 4,5%, abrindo espaço para uma queda mais significativa dos juros - principalmente se o dólar não subir muito. O alvo de 2005, de 5,1%, também está próximo de ser atingido, mas com uma política monetária excessivamente dura, com juros reais de 13%, o que acentuou a valorização do câmbio. Nos últimos meses, as notícias no front inflacionário são muito positivas. Os IGPs caminham para o quarto mês seguido de deflação. De janeiro a junho, o IGP-DI subiu apenas 1,12% e pode fechar o ano em 1,8%, de acordo com o economista Carlos Thadeu de Freitas Gomes Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A projeção média do mercado é de um IGP-DI de 2,6%. Depois da adoção do câmbio flutuante em 1999, um dos grandes problemas para o cumprimento das metas de inflação tem sido o comportamento dos IGPs. Em 2002, o IGP-DI ficou em 26,41% ; em 2004, em 12,14%. Esses resultados acabam por empurrar para cima o IPCA do ano seguinte, uma vez que 30% do indicador - que serve de referência para o regime de metas - é composto por preços administrados. Para compensar essa pressão e tentar cumprir metas ambiciosas, o BC teve várias vezes que derrubar os preços livres para níveis muito baixos, por meio de uma política monetária excessivamente apertada. Esse quadro não deve se repetir em 2006. Para o economista-chefe do ABN AMRO, Mário Mesquita, as perspectivas para a inflação são bastante favoráveis, devido a um cenário marcado por IGPs baixos, queda das projeções de mercado para os índices de preços e um câmbio tranqüilo. Com isso, abre-se espaço para um quadro de reduções mais expressivas da taxa Selic, atualmente em 19,75% ao ano. Mesquita vê os juros em 17,75% no fim de 2005 e em 15% no fim do ano que vem. O IPCA, para ele, deve ficar em 4,6% em 2006, muito próximo da meta de 4,5%. Para que esse quadro se concretize, porém, ele diz que é necessário que os IGPs sigam comportados também no primeiro semestre do ano que vem: há uma concentração forte de reajustes de tarifas públicas em junho e julho, e a correção é feita pelo indicador acumulado em 12 meses. O economista-chefe do Credit Suisse First Boston (CSFB), Nílson Teixeira, faz avaliação parecida com a de Mesquita. Se os IGPs ficarem tranqüilos na primeira metade de 2006, a inércia inflacionária para o ano que vem será mais baixa, afirma ele. Diminuir o coeficiente da inércia, o mecanismo pelo qual a inflação passada alimenta a futura, será um vitória importante na luta contra a alta dos preços. Mas há riscos também. Para Gomes Filho, os IGPs mais baixos limitam uma fonte tradicional de pressão sobre os preços, mas o comportamento do câmbio e de commodities internacionais como o petróleo podem atrapalhar. Uma alta maior do dólar tende a piorar as perspectivas para a inflação, impedindo uma queda mais forte da Selic. Os analistas citam uma deterioração do cenário externo ou um agravamento da crise política como fatores que poderiam levar a uma desvalorização mais significativa do câmbio. Pelo menos por enquanto, esse não é o cenário base do mercado. Com o fluxo comercial expressivo e a liquidez internacional abundante, a expectativa é de um câmbio comportado. Teixeira avalia que, se o dólar ficar próximo de R$ 2,45 neste ano e no próximo, há grandes chances de o IPCA de 2006 vem ficar próximo da meta de 4,5%, ou até abaixo desse número. "Isso pode ocorrer mesmo com uma redução mais significativa dos juros", afirma ele, que projeta uma Selic de 17,75% no fim deste ano e de 15% no fim de 2006. O economista-chefe do BankBoston, José Antônio Pena, ressalta outro ponto importante para que se projete uma cenário favorável para a inflação: a convergência das expectativas para as metas. Ele lembra que, no regime de metas, é crucial o BC controlar as expectativas. O raciocínio é que, se os agentes econômicos acreditam que a inflação vai ficar próxima da meta, o trabalho da autoridade monetária de atingir o alvo fica mais fácil, possibilitando juros mais baixos. Neste ano, o BC teria sido muito duro na condição da política monetária em boa parte porque o mercado mostrou por muito tempo ceticismo quanto à viabilidade da meta de 5,1%. Em maio, por exemplo, os analistas apostavam num IPCA de 6,39% para 2005; hoje, projetam 5,34%. Para 2006, as expectativas apontam para um IPCA de 4,94%, mas Pena acredita que elas tendem a convergir ao longo do tempo para a meta de 4,5%. Com as projeções do mercado sob controle, o BC pode ter mais espaço para cortar os juros, diz ele.