Título: Marinalva, à margem da sociedade desde os 9 anos
Autor: Maria Inês Nassif
Fonte: Valor Econômico, 29/08/2005, Especial, p. A12

Marinalva Ferreira da Silva teve, neste final de semana, os únicos dias de lazer de sua vida. Mas pediu licença para se incorporar aos seus outros 49 companheiros do encontro promovido pelo Instituto DNA Brasil e agradeceu antes de ir embora. "Muito obrigada. Vocês me respeitaram." Respeito não é uma coisa muito comum na vida de Marinalva, de 37 anos, moradora de Natal, capital do Rio Grande do Norte. Ela era menina de rua aos 8 anos. Morava na rua e pedia esmolas para "dar de comer à mãe". Aos nove começou a se prostituir. Tem 37 e ainda está na rua. "Já está difícil, vai ficar mais." Marinalva não apenas ganha a vida, mas briga pelo que chama de "meu público-alvo". É presidente do Sindicato das Profissionais do Sexo de Natal, que reúne mais de 80 mulheres. Conseguiu atendimento de saúde público voltado às necessidades das prostitutas. Recentemente, conseguiu do poder público local uma escola de alfabetização e adultos que reúne não apenas o "seu público", mas donas de casa bem-comportadas. É lá que ela aprende as primeiras letras. "Já sei ler a primeira e a segunda letra, o resto da palavra alguém tem que ajudar. Era melhor ler tudo, não era?", pergunta ela, mas com a certeza de que já faz um grande feito. Tenta convencer as mais moças a estudar, para ter a alternativa que ela não teve, de um outro emprego melhor. "Se você é Mobral, ninguém te emprega, vai ser prostitura". E isso, garante Marinalva, não é bom: "A gente arrisca a vida todo dia; a gente não sabe quem é o cliente, se é um maníaco, se tem DST (doenças sexualmente transmissíveis). Não tem direito nenhum, só uma cama de hospital e às vezes o cemitério". É vendo da rua, onde está ainda toda noite ganhando o seu sustento, que Marinalva vê o Brasil real: "É um país muito rico para uns e muito pobre para muitos". (MIN)