Título: Desacelera o crédito consignado
Autor: Maria Christina Carvalho e Ivana Moreira
Fonte: Valor Econômico, 29/08/2005, Finanças, p. C1

Empréstimos Retração do BMG e revisão de regras para aposentados reduzem concessões

O crédito consignado deu sinais de desaceleração entre junho e julho, pela primeira vez desde que foi relançado no início do ano passado. A redução das operações do Banco BMG, um dos principais players do mercado, teria tido papel determinante no refluxo do consignado, que vinha puxando o trem da expansão da oferta de crédito e contendo os juros cobrados às pessoas físicas. Envolvido na crise política que tira o sossego do país, o BMG, dono de cerca de 45% do mercado de crédito consignado a aposentados, estaria reduzindo as operações. "O BMG pisou no freio", disse um dos players do mercado, afetado pela redução da oferta de funding. Os próprios promotores do banco estariam retraídos e sendo disputados pelos outros bancos. Procurado pelo Valor, a direção do banco informou, por meio da assessoria de imprensa, que não comentaria o desempenho das operações de crédito consignado nos dois últimos meses. Os dados divulgados pelo Banco Central (BC) na semana passada, mostram que as novas concessões médias diárias de crédito consignado atingiram o pico de R$ 105,8 milhões em abril, estabilizaram em R$ 102 milhões em maio, recuaram para R$ 99 milhões em junho e para R$ 92 milhões, uma queda de 13% em três meses. Entre junho e julho, a queda foi de 7%, arrastando o crédito pessoal como um todo, cujas concessões recuaram 2,2%. As novas concessões de crédito são o termômetro mais adequado do mercado. Os dados de estoque, comumente utilizado, têm o inconveniente de crescer simplesmente com a apropriação dos juros e correção cobrados. O estoque de crédito consignado continuou crescendo mesmo com a diminuição das novas concessões, atingindo R$ 19,683 bilhões em julho, mais do que dobrando dos R$ 9,388 bilhões de um ano antes; crescendo 4,8% no mês e 56,1% no ano. Os dados apurados pelo BC incluem o crédito consignado a aposentados e trabalhadores da ativa, dos setores público e privados; e são levantados nos treze maiores bancos que oferecem o produto e respondem por 80% desse mercado. Não só a retração do BMG teria determinado a redução da concessão do consignado. Teria tido influência também a redução do espaço para as concessões de empréstimo aos aposentados das faixas de renda mais baixas, que são os maiores tomadores. De acordo com dados do INSS, pouco mais de 50% dos créditos a aposentados e pensionistas são concedidos a quem ganha até dois salários mínimos. "Os copinhos estão enchendo", disse o diretor de um banco. "Há um limite de comprometimento", disse o analista do ABN AMRO Real, José Francisco Cataldo. O mercado também teria se ressentido do movimento de alerta aos riscos do endividamento pelo consignado, que culminou com a decisão do INSS de suspender temporariamente as autorizações à entrada de novos bancos no mercado e com a reformulação de regras. As operações com aposentados e pensionistas respondem por metade do total de crédito consignado. O INSS suspendeu a autorização para a entrada de novos bancos de 27 de maio a 11 de julho, mas já voltou a apreciar os pedidos, dentro de novas regras. Uma delas restringe o uso do telefone para finalizar as operações. No entanto, os especialistas acreditam que o refluxo é temporário. "Já há oferta de recursos por 60 meses. Nem financiamento de automóvel tem um prazo tão longo", disse o diretor de um banco, embora outra fonte tivesse lembrado que nem todos bancos consideram confortável esse prazo, por causa do eventual descasamento de funding. "A tendência é extremamente favorável", disse o superintendente do Banco Cruzeiro do Sul, Adolpho Nardy Filho, para quem a instabilidade política teve influência na redução dos negócios. Ele lembrou que julho é sazonalmente um mês mais fraco para o consignado, cuja demanda cresce a partir de agora. Para o analista de bancos do Pactual, Pedro Guimarães, "o efeito substituição" explica o forte crescimento do empréstimo consignado, que está sendo usado principalmente para liquidar dívidas mais caras como o crédito pessoal e o cheque especial. Pesquisa encomendada ao Instituto Vox Populi pela Associação Brasileira de Bancos (ABBC) apurou que 69% dos aposentados tomou o crédito consignado com essa finalidade. Guimarães afirmou que foi o crescimento do crédito consignado que contribuiu para melhorar a inadimplência e o risco uma vez que o cliente troca uma dívida mais cara por uma mais barata. "Isso explica a queda da inadimplência nos bancos apesar de os juros estarem elevados", acrescentou. Mas a "carteira de consignado é jovem", alertou. Para ele, o consignado tem risco de inadimplência especialmente em um cenário de retração econômica e aumento das demissões. "O consignado é pró-cíclico. Vai bem quando a economia está crescendo. A linha ainda não foi testada em um momento de crise, quando houver desaquecimento e desemprego", explicou. Para o analista do Pactual, a curto prazo, o consignado melhorou a inadimplência e o risco; mas, a médio prazo, afetará a receita de spread e pode apresentar perdas se a economia retroceder.