Título: Usiminas pagou por fora para evitar o assédio de políticos aos controladores
Autor: Ricardo Balthazar
Fonte: Valor Econômico, 24/08/2005, Política, p. A5

A siderúrgica Usiminas preferiu repassar clandestinamente as doações que fez na campanha eleitoral de 2004 para evitar o assédio de políticos mineiros aos poderosos grupos econômicos que detêm o controle da companhia, segundo dois empresários familiarizados com o assunto ouvidos pelo Valor. A direção da companhia tem evitado se manifestar sobre o tema em público. Análises feitas pela CPI dos Correios nas contas do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza e depoimentos de políticos que receberam dinheiro dele indicam que pelo menos R$ 866 mil foram distribuídos nas eleições municipais do ano passado por orientação da Usiminas. Seis candidatos de cinco diferentes partidos foram identificados como beneficiários dos recursos. De acordo com os dois empresários ouvidos pelo Valor, a Usiminas costuma receber de políticos mineiros dezenas de pedidos de ajuda nos anos em que há eleições, mas prefere fazer suas contribuições por fora para evitar que a exposição pública de suas doações gere mais pressões desse tipo e crie constrangimentos para os controladores da empresa. Fazem parte do bloco de controle da siderúrgica o Bradesco, o grupo Votorantim e a construtora Camargo Corrêa. A contabilidade oficial dos partidos indica que nos últimos anos esses grupos gastaram legalmente milhões de reais para apoiar candidatos de sua preferência, mas somente em alguns casos eles ajudaram os mesmos candidatos. A Usiminas tem há mais de dez anos um contrato de publicidade com a SMP&B, uma das agências de propaganda de Valério. Segundo a CPI dos Correios, a siderúrgica pagou R$ 13,6 milhões à agência nos últimos cinco anos. As notas fiscais que podem comprovar as despesas feitas com esses dinheiro ainda não foram analisadas pelos técnicos que apóiam as investigações da CPI. Nas explicações que apresentou à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão encarregado de fiscalizar companhias abertas como a Usiminas, a empresa negou ter feito contribuições eleitorais e declarou que os recursos repassados à SMP&B foram usados apenas para cobrir despesas de suas campanhas publicitárias. Segundo um dos empresários ouvidos pelo Valor, no entanto, a origem das doações está na parcela apropriada pela agência de propaganda como remuneração pelos serviços prestados, estimada em 10% do total. Marcos Valério tem negado a existência de vínculos entre a Usiminas e as contribuições recebidas pelos políticos que apontaram o dedo para a companhia. Mas o presidente da SMP&B, Cristiano de Mello Paz, reconheceu há duas semanas em depoimento às CPIs dos Correios e do Mensalão que os candidatos apoiados pela agência foram indicados pela direção da siderúrgica. Paz explicou que o presidente da Usiminas, Rinaldo Campos Soares, recebe "trinta, quarenta propostas políticas" em anos eleitorais e "manda passar todas para a agência". Dias depois, Rinaldo fez sua única manifestação pública sobre o assunto até agora. "Estamos muito aborrecidos com o que está se falando por aí", disse. "Mas nos reservamos o direito de não fazer comentários." Entre os políticos que atribuíram à Usiminas as contribuições que receberam de Valério, há dois deputados federais, Roberto Brant (PFL) e Romeu Queiroz (PTB), e um ex-senador, João Leite (PSB). Brant e Leite disputaram a prefeitura de Belo Horizonte e foram derrotados pelo petista Fernando Pimentel. Segundo Valério, Pimentel também recebeu contribuições suas, mas não há sinal de que ele também tenha sido encaminhado pela Usiminas. A proximidade da Usiminas com Valério ajudou a abrir portas após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em agosto de 2003, acompanhado por Valério e pelo ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares de Castro, Rinaldo fez uma visita ao então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu. Segundo o Valor apurou, Rinaldo foi pedir o apoio de Dirceu para um projeto de fusão da Usiminas com outras siderúrgicas, abandonado meses depois.