Título: Delcídio acusa Correios de boicotar investigações
Autor: Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 24/08/2005, Política, p. A9

Alvo principal da primeira das Comissões Parlamentares de Inquérito que apuram corrupção no governo, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) foi acusada pelo presidente da CPI, senador Delcídio Amaral (PT-MT) de boicotar as investigações. "Caso esse comportamento inadmissível continue, a comissão pode encarar a situação como desobediência, e pedir a destituição da diretoria dos Correios", ameaçou Delcídio. Ele acusou a ECT de "atraso injustificado" na entrega de documentos, omissão de informações nas bases de dados enviadas, "especialmente sobre o Correio Postal Noturno", respostas evasivas às diligências e "informações sobre dados numéricos que induzem a erros, sobre a receita e a despesa operacional" e sobre contratos. Delcídio Amaral enviou uma equipe de parlamentares da comissão para transmitir a ameaça e requisitar dados ao novo presidente dos Correios, Jânio Pohren. O endurecimento contra a empresa ocorreu em um dia no qual o próprio Delcídio foi duramente criticado por integrantes da oposição na CPI, que descobriram ter sido enviado somente no dia 18 o requerimento de informações sobre os fundos de pensão aprovado há cerca de 20 dias. A testemunha de ontem, o ex-presidente do Banco Popular do Brasil, Ivan Guimarães, teve de esperar cerca de cinco horas enquanto os parlamentares lamentavam a lentidão dos trabalhos da comissão e o que acusam de tentativa do governo de esvaziar as investigações. "A CPI não pode ter uma posição covarde, ficar com a pauta do peixe miúdo; temos de ser uma Operação Mãos Limpas", discursou, quase gritando, o deputado Onyx Lorenzoni (PFL-RS). "Essa CPI está morrendo", disse o senador Heráclito Fortes (PFL-PI), lamentando que a audiência da CPI na TV Senado e o envio de correspondência eletrônica a integrantes da comissão estão menores do que nas outras CPIs em curso no Congresso. "Não estou preocupado em fazer da CPI líder de audiência, me preocupo com os resultados", respondeu Delcídio, que marcou para hoje uma sessão que deverá discutir o pedido da oposição para que sejam convocados à CPI o ex-ministro Luiz Gushiken, o presidente do Sebrae, Paulo Okamotto, e o doleiro Toninho da Barcelona. Parlamentares da oposição fizeram questão de mencionar as pretensões políticas de Delcídio, apontado como pretendente à candidatura ao governo de Mato Grosso, pelo PT, e pediram-lhe que não cedesse a eventuais pressões do governo ou do partido, para conter as investigações da CPI. Houve também acusações de que os parlamentares não estariam tendo acesso a informações antes de sua divulgação à imprensa, nas entrevistas coletivas marcadas pelo presidente, relator e sub-relatores da comissão, às sextas-feiras. Os governistas acusam a oposição de deixar em segundo plano a análise de documentos, em favor dos depoimentos, que garantem cobertura de imprensa. O depoimento de ontem, do ex-presidente do Banco Popular do Brasil, Ivan Guimarães, serviu de exemplo involuntário da falta de resultados práticos de algumas das audiências com testemunhas. Guimarães afirmou que nunca teve responsabilidade sobre os contratos de publicidade firmados entre o Banco Popular e a DNA, firma do publicitário Marcos Valério de Souza. Em 2004, as despesas com publicidade do Banco Popular somaram R$ 24 milhões, mais que os R$ 21 milhões emprestados ao público de baixa renda do banco. Guimarães repetiu explicações já dadas ao Senado, de que o alto gasto de publicidade se devia à necessidade de popularizar uma iniciativa pioneira, e que o plano de negócios da instituição previa um gasto naturalmente mais alto que os desembolsos, nos primeiros três anos do banco. Guimarães respondeu pelo menos oito vezes às mesmas questões sobre a publicidade do banco, sempre repetindo que a diretoria de Marketing do Banco do Brasil, chefiada por Henrique Pizzolato, era a responsável pela licitação e concretização dos contratos do gênero. Outro tema citado pelo menos cinco vezes pelos deputados foi a compra do apartamento da ex-mulher do deputado e ex-ministro José Dirceu (PT-SP), Maria Ângela Saragoça, pelo sócio de Marcos Valério Rogério Tolentino. Guimarães, que alugou de Tolentino o apartamento, onde sua mãe passou a morar, disse ter sabido que o imóvel era de Saragoça só no dia de assinatura do contrato. A versão contraria explicações da ex-mulher de Dirceu, que, há dias, afirmou ter negociado a venda para Ivan Guimarães, e ter se surpreendido ao ver que Tolentino era o verdadeiro comprador do imóvel. Pressionado pelo deputado Antonio Carlos Magalhães Neto, o executivo informou ter comprado um jipe Land Rover, por R$ 145 mil, mas garantiu ter rendimento suficiente para isso.