Título: Sereno admite ter discutido campanha com Valério
Autor: Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 24/08/2005, Política, p. A9

Crise Ex-assessor de Dirceu disse que encontros ocorreram no Planalto

O ex-assessor da Casa Civil Marcelo Sereno admitiu ontem, em depoimento à CPI dos Bingos, que tratou de assuntos políticos e discutiu campanhas eleitorais do PT com o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza dentro do Palácio do Planalto. As conversas teriam ocorrido "duas ou três vezes", na Casa Civil, para onde ele foi levado pelo ex-ministro José Dirceu. Sereno desligou-se do governo em maio de 2004 para assumir a secretaria de Comunicação do PT, que deixou somente em julho deste ano. Em depoimento bastante tenso, marcado por um tom agressivo dos senadores oposicionistas e pela postura sempre desafiadora de Sereno, o ex-secretário petista negou repetidamente que lidasse com assuntos políticos na Casa Civil. Pressionado, no entanto, caiu em contradição pouco depois. Disse que Marcos Valério "aproveitava que estava lá (no Palácio do Planalto) e passava (na Casa Civil)". "Ele queria que a empresa de marketing político dele aumentasse o seu espaço no Rio de Janeiro", afirmou Sereno, referindo-se a campanhas eleitorais no Estado. Segundo ele, Marcos Valério acabou fazendo a campanha do PT nas eleições municipais de Petrópolis, no ano passado. Sereno também confirmou publicamente o que Waldomiro Diniz, outro ex-assessor de Dirceu na Casa Civil, havia negado na CPI há duas semanas. O ex-secretário petista disse que Waldomiro era uma peça-chave do Palácio do Planalto nas relações com deputados e senadores. "Waldomiro era o termômetro do governo no Congresso Nacional", afirmou. Ao ser questionado sobre como Waldomiro fazia isso, Sereno respondeu: "Era a pessoa que se encarregava de catalogar as emendas (parlamentares)". Em seu depoimento, o ex-subchefe da Casa Civil, flagrado recebendo propina do empresário de jogos Carlos Cachoeira, garantiu que não lidava com a negociação de emendas. O relator da CPI, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), considerou a ida de Sereno importante para os trabalhos da comissão. Mesmo munido de "habeas corpus" preventivo, ele acabou dando duas "derrapadas", avaliou Garibaldi. Nos últimos minutos de sua fala de quatro horas à CPI, o ex-secretário petista Sereno foi confrontado com uma acusação feita pelo presidente da CPI, senador Efraim Morais (PFL-PB). Efraim perguntou a Sereno se ele conhecia Aleni Rodrigues e Cosete Barbosa, respectivamente ex-secretária de Finanças e ex-prefeita de Campina Grande (PB) até o fim de 2004, em gestão petista no município. Sereno respondeu que não. Em seguida, o presidente da comissão fez uma denúncia: segundo ele, Aleni teria dito ao Ministério Público da Paraíba que entregara, entre 2003 e 2004, R$ 600 mil pessoalmente a Sereno. O ex-secretário teria informado a Aleni que repassaria o dinheiro a José Dirceu. "A afirmação é mentirosa", rebateu Sereno. A informação foi recebida como uma bomba na CPI, mas foi logo desmentida pela própria Aleni e pelo MP da Paraíba. O promotor Clístenes Bezerra confirmou que ela prestou depoimento na segunda-feira, mas "sequer ventilou" os nomes de Sereno ou de Dirceu. Mais tarde, a ex-secretária informou que depositou R$ 800 mil em contas que a sócia de Duda Mendonça, Zilmar Fernandes, indicara a ela. A agência de publicidade dos dois fez campanhas de marketing pessoal para a ex-prefeita Cosete Barbosa. O MP suspeita de irregularidades. O clima na primeira metade do depoimento de Sereno foi bastante tenso. Ele adotou um tom duro para as suas respostas. Quando o senador Leonel Pavan (PSDB-SC) perguntou se aceitaria acareações com Waldomiro e com o ex-secretário Luiz Eduardo Soares, ele disse que sim. Pavan provocou. "Sem habeas corpus?", questionou. "Depende da orientação dos meus advogados", disse Sereno. O advogado dele, Roberto Podval, retrucou com gestos e instalou-se uma confusão generalizada na CPI. Iniciou-se uma discussão sobre a possibilidade de que o advogado do depoente fale com o cliente em meio às perguntas, quando o "habeas corpus" for concedido. Os senadores entendiam que não. Podval protestou e o presidente Efraim Morais, vermelho e aos berros, ameaçou tirá-lo da mesa. "Cale a boca! Cale a boca!", gritou o senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA), dirigindo-se ao advogado. A briga durou aproximadamente cinco minutos. Podval atuou em favor da Schincariol em recente operação da Polícia Federal e defende o empresário Sérgio Gomes da Silva, o Sombra, acusado de ser o mentor do assassinato do ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel, em 2002. Apesar das "derrapadas", Sereno negou praticamente todas as ligações insinuadas pelos senadores. Disse que não arrecadou recursos para a campanha de Benedita da Silva a governadora do Rio, em 2002, e que não fez qualquer indicação pessoal para a diretoria dos fundos de pensão das estatais. Segundo ele, sua missão na Casa Civil era "encaminhar" indicações originárias de acordos entre os partidos políticos da base aliada. A agenda da CPI dos Bingos depende agora da confirmação do advogado Rogério Buratti sobre a sua ida à comissão, marcada para hoje. Ele tenta adiar o novo depoimento.