Título: Refeição indigesta
Autor: Maritins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 10/04/2010, Economia, p. 14

Entre janeiro e março, comer fora de casa ficou 2,1% mais caro no Brasil. O trabalhador gasta, em média, 75% do salário mínimo por mês com o almoço. Em Brasília, o desembolso diário é de R$ 20,10

A alta dos alimentos não se tornou um tormento apenas para as donas de casa. Os trabalhadores que são obrigados a comer todos os dias fora de casa também estão cortando um dobrado para satisfazer as necessidades e, ao mesmo tempo, manter o orçamento equilibrado. Somente nos três primeiros meses deste ano, a alimentação nos restaurantes ficou 2,1% mais cara. Em média, o brasileiro paga R$ 18,20 por dia só para almoçar. Em Brasília, onde os preços subiram 2,23%, o desembolso diário é ainda maior: R$ 20,10 um dos valores mais altos do Brasil. Na Asa Norte, um dos bairros mais nobres da capital do país, a refeição sai, em média, por R$ 24,30, valor superior até mesmo à do local mais caro do país, o Rio de Janeiro (R$ 20,40). Por mês, as refeições fora de casa consomem entre 75% (Brasil) e 83% (Brasília) do salário mínimo.

Os dados que comparam o gasto médio com refeições na rua são parte de um levantamento da Associação das Empresas de Refeição e Alimentação Convênio para o Trabalhador (Assert) e da Sodexo. Esses valores são parâmetros para os nossos clientes, como sugestão de quanto deve ser pago em benefícios de refeição ao trabalhador, explicou Raquel Trindade, diretora de Marketing e Rede de Estabelecimentos da Sodexo Motivation Solutions. Na pesquisa, o Centro-Oeste divide com o Sudeste o posto de regiões mais caras do Brasil. Os restaurantes cobram, em média, R$ 19,10 por um almoço. Na outra ponta dessa tabela, o Sul figura como o local mais em conta, onde se gasta R$ 15,40 por dia. Nem mesmo o popular prato feito escapou do rol de preços altos. Em algumas cidades, o trabalhador desembolsa até R$ 20 por essa refeição.

Café amargo A inflação, além de ter atingido em cheio o bolso do consumidor que come fora de casa, não deixou escapar nem mesmo o cafezinho, bebida que para muitos serve de sobremesa e até para evitar a sonolência após o almoço. Em 12 meses, o produto ficou amargos 12,05% mais caro. Foi o item que sofreu o maior reajuste entre os que compõem a cesta de produtos da refeição longe do lar. O aumento é quase três vezes superior à inflação do período e se explica pela bienalidade do produção de café no campo. A cada dois anos, a safra perde produtividade expressivamente. Na de 2009, além dessa situação, as perdas foram agravadas pelo excesso de chuva.

Segundo especialistas, o preço da alimentação fora do lar acompanha o custo de vida e o poder aquisitivo de cada região. Brasília, por ser uma cidade com grande quantidade de servidores públicos e também por possuir a renda per capita mais elevada do país, ocupa o topo do ranking dos preços altos. A alimentação aqui é muito cara. Por mês, gasto R$ 300 com comida em restaurantes. Em casa, com esse dinheiro, daria para mais gente comer por um mês inteiro e ainda com mais variedade, afirmou a assistente financeira Dayana Gomes Fernandes, 25 anos.

A gerente de farmácia Débora Ribeiro da Silva, 27, também acha um absurdo o preço dos restaurantes. Como todos os dias na rua e gasto entre R$ 25 e R$ 30 só com o almoço, ponderou a gerente, que deixa no comércio R$ 660 por mês em refeições. Para Fátima Pires, 43, que acabou de ficar desempregada, o problema é que hoje em dia está difícil almoçar em casa. O que, se fosse possível, seria mais barato e saudável.

O levantamento da Assert reflete os preços altos relatados pelas duas consumidoras. De quatro locais pesquisados no Distrito Federal, em três o preço da refeição está maior do que a média nacional (veja quadro). Taguatinga cobra R$ 19,80. A Asa Sul, 18,70, e a Asa Norte, R$ 24,30. Apenas o Setor Comercial Sul ficou abaixo do restante do Brasil: lá, paga-se R$ 15,80. Os taguatinguenses ainda ostentam o título de ter o serviço a la carte mais caro do DF R$ 36,70.

HAPPY HOUR SALGADO » Alimentar-se fora do lar está pesado para o consumidor e, para os que ainda arriscam fazer um happy hour, o problema é ainda maior. Principalmente para quem gosta de uma bebida para relaxar. O custo desses produtos superou a inflação dos últimos 12 meses em pelo menos duas vezes. A cervejinha foi a que menos subiu no último ano: 6,01%. O chopp ficou 8,66% mais caro. No conjunto, as bebidas alcóolicas, que são derivadas da cana de açúcar (cujas cotações dispararam no mercado internacional por causa da quebra da safra na Índia e da especulação no mercado financeiro), foram reajustadas em 8,27%. Até mesmo os salgados e os lanches que acompanham as bebidas não deixaram por menos: subiram 6,35% em 12 meses. (VM)

BC vai agir, diz Meirelles

Se alguém tem dúvidas de que o Banco Central permitirá a escalada da inflação, é melhor não arriscar. Foi esse o recado que o presidente da instituição, Henrique Meirelles, passou ontem ao mercado ao ser questionado sobre a atual disparada dos preços. Para ele, infelizmente, ainda há vozes que questionam até que ponto há problema em assumir um pouco mais de risco de inflação. Na minha avaliação, tem, disse. Ou seja, se o BC tiver que aumentar a taxa básica de juros (Selic) para manter a inflação nas metas o que todos dão como certo , vai fazê-lo independentemente do desejo daqueles que pregam o contrário.

Um dos segredos desse crescimento que o Brasil atingiu nos últimos anos é a previsibilidade (da economia) e o fato de se ter uma inflação previsível, afirmou Meirelles em São Paulo. No seu entender, o país não pode abrir mão da previsibilidade, que traz grandes benefícios, como taxas de juros menores e inflação em patamares que protegem, sobretudo, os mais pobres. A previsibilidade permite o planejamento por parte das empresas, estimulando os investimentos, o emprego, a renda e o bem-estar social, assinalou.

O presidente do BC enfatizou ainda que a instituição está comprometida com o sistema de metas de inflação. E, na sua opinião, é preciso ter o banco no manche da economia. Evidentemente, o BC não vai exagerar. Vai deixar a demanda suficientemente aquecida de maneira a dar condições aos empresários de projetar vendas à frente e investir o máximo possível, frisou. E cutucou: Agora não pode dizer que o piloto só pode ter acelerador, não pode ter breque. Ou que o piloto não pode ter também direção, só pode ir reto, tem uma curva e passa por cima e chega do outro lado.

Outras cidades

Preço médio pago pela alimentação por cidade

São Paulo - R$ 19

Belo Horizonte - R$ 15,80

Rio de Janeiro - R$ 20,40

Porto Alegre - R$ 16,60

Salvador - R$ 17,20

Manaus - R$ 15,50

Fonte: Assert