Título: Empresas aceleram seus programas de inclusão social
Autor: Andrea Giardino
Fonte: Valor Econômico, 24/08/2005, EU &, p. D6

Recursos Humanos Para cumprir a lei, elas buscam contratar e integrar os portadores de deficiência

O Brasil sempre esteve atrasado em relação aos outros países no que se refere às políticas de emprego envolvendo portadores de deficiência. Mas esse panorama começa a mudar. Pressionadas a cumprir a Lei 10.097/2000 - conhecida como Lei de Cotas, que obriga as companhias com mais de 100 funcionários a terem de 2% a 5% de deficientes em seus quadros de funcionários -, as empresas estão criando programas de inclusão que prevêem a contratação de deficientes. É o caso da HP e da Schering , que deram os primeiros passos no início deste ano. Para se ter uma idéia do cenário atual, dados do Ministério do Trabalho em São Paulo mostram que em 2003, apenas 316 empresas atendiam à legislação. No ano passado, esse número pulou para 1.965 e no primeiro semestre de 2005 chegou a 2.110 - representando um crescimento de 7,4%. A multinacional alemã do setor farmacêutico, por exemplo, acaba de finalizar a primeira etapa de seu programa, batizado de "Caminho Aberto", onde foi realizada uma avaliação técnica das unidades da empresa em São Paulo (sede e fábrica). A idéia foi identificar as áreas que poderiam receber os portadores de deficiência. Além disso, a empresa também avaliou onde teria de fazer adaptações do espaço físico para os novos profissionais, com a instalação de rampas de acesso ao prédio. A segunda etapa do programa, que ainda está em andamento, tem como foco sensibilizar e conscientizar todos os funcionários, incluindo os principais executivos da companhia. Para isso, a empresa pretende reunir cerca de 500 pessoas que passarão por uma série de treinamentos e palestras. "Queremos orientar todos sobre a importância da iniciativa e prepará-los para receber os portadores de deficiência", afirma Elisabete Rello, diretora de RH da Schering do Brasil. Só a partir daí é que o laboratório irá ao mercado selecionar esses profissionais. "Já estamos destinando as vagas que serão preenchidas por eles em breve", diz Elisabete. De acordo com ela, a iniciativa faz parte de um projeto maior da Schering, o da diversidade cultural. "Também estamos começando agora a trabalhar no país a questão da inclusão de afro-descendentes." Na HP, a seleção de portadores de deficiência ficará a cargo de um responsável dedicado exclusivamente a essa atividade. "É a fase de romper barreiras internas", diz Jair Pianucci, diretor de RH da HP Brasil. Para tanto, a companhia vem realizando treinamentos e seminários. "Os deficientes já enfrentam a adversidade no dia-a-dia, enquanto nós não estamos preparados para conviver com isso." Com a meta de ter, em dois anos, 5% de portadores de deficiência em seus quadros, a subsidiária brasileira hoje participa do "Fórum Permanente de Empresas para a Inclusão Econômica de Pessoas com Deficiência", criado pelo Instituto Paradigma e quem tem a adesão da Serasa, do Grupo Abril, da Visanet, da PricewaterhouseCoopers, da Vivo e da Schering. O objetivo é discutir saídas para problemas como a falta de profissionais qualificados. "Nosso negócio exige mão-de-obra bastante especializada. Hoje, 85% dos funcionários HP possuem nível superior", diz. Dificuldade, aliás, que permeia todas as empresas. Foi pensando em ajudar as organizações a se ajustarem a Lei de Cotas que nasceu o fórum em junho passado. "A maioria não cumpre a legislação, mas precisa se mobilizar já que o cerco apertou e as Delegacias Regionais do Trabalho começaram a notificar as companhias e até a multá-las", afirma Flávia Cintra, coordenadora do Programa de Inclusão Econômica do Instituto Paradigma. Hoje, há aproximadamente 24 milhões de pessoas com deficiência no país, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). "Mas apenas 2% deles trabalham no mercado formal", ressalta Flávia. No próximo dia 30, acontece a 3ª plenária do fórum, que discutirá os resultados alcançados e os novos desafios para a inclusão de deficientes no mercado de trabalho. A Serasa, que atua na área de análises e informações para decisões de crédito, também tem dado bastante foco no assunto. "É uma troca de experiências importante que visa acelerar a aprendizagem das empresas comprometidas com a inclusão dos deficientes", afirma João Baptista Ribas, coordenador do Programa Serasa de Empregabilidade. A instituição, por sua vez, é atualmente referência nos projetos de inclusão no Brasil. A empresa implantou em 2001 seu programa voltado para portadores de deficiência física, visual e auditiva. Conta em seus quadros no Brasil inteiro com 84 deficientes, de um total de 2 mil funcionários. O edifício sede possui rampas apropriadas, piso com texturas e relevos diferenciados para deficientes visuais, banheiros masculinos e femininos adequados em todos os pavimentos, sintetizador de voz nos elevadores para os deficientes visuais e indicadores em braile nas teclas dos elevadores. Segundo Ribas, além dos investimentos em infra-estrutura - há um orçamento semestral de R$ 100 mil para o programa -, o Serasa possui um plano de carreira para esses profissionais. "Temos um portador de deficiência visual que se formou em direito e foi promovido a advogado júnior", conta. "Temos também uma deficiente auditiva que está terminando faculdade de web design e ocupa a função de analista pleno." Na opinião do executivo, qualificar os profissionais com deficiência física é uma questão importante para as empresas. "É claro que dependendo do perfil do cargo, você encontre problemas, mas existem muitas oportunidades em diversas funções", defende Ribas. "As empresas investem pesado em treinamento, por que não levar isso para os deficientes?", questiona.