Título: Material que ofereça risco tende a ser substituído
Autor: Amundsen Limeira
Fonte: Valor Econômico, 24/08/2005, Valor Especial / ECOEFICIÊNCIA, p. F2

A Produção Mais Limpa (PmaisL), lançada pelos programas da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Unep) e o Desenvolvimento Industrial (Unido) para estimular a economia de recursos naturais em processos e produtos tornou-se importante instrumento da ecoeficiência. Esta expressão mais abrangente foi cunhada em 1992 pelo empresário Stephan Schmidheiny, presidente do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (WBSCD). Trata-se de gerar produtos e serviços competitivos para satisfazer as necessidades humanas, promover qualidade de vida e reduzir os impactos ecológicos e o uso de recursos naturais no processo produtivo, em todo ciclo de vida do produto. É um conceito que veio para ficar, prevê Fernando Almeida presidente executivo do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds), o braço brasileiro do WBCSD. Hoje está provado, diz ele, que atuar ecologicamente desde a retirada da matéria-prima até o pós-consumo gera lucro e vantagens competitivas. As empresas ganham valor no mercado, quando têm bom desempenho ambiental. Criado em 2002, o programa de ecoeficiência do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial de São Paulo (Senac/SP), que conquistou a ISO 14.001 para seu hotel em Águas de São Pedro (SP), optou pela certificação interna para as 60 unidades no Estado. De início, propôs indicadores de racionalização do uso de energia, água e materiais típicos de instituições de ensino: papel, toners e cartuchos de impressoras e copos descartáveis. De agosto de 2003 a agosto de 2004, o consumo de copinhos caiu de 12,8 mil para 6 mil unidades. Em 2005, deu-se a largada para a certificação. Apesar de voluntária, todas unidades mandaram colaboradores para o treinamento, relata Alcir Vilela, coordenador dos cursos de engenharia ambiental e ecoeficiência. O time de auditores também foi capacitado, para entrar em campo em setembro. "Por ser certificação interna, o custo é mais acessível. É um processo que atende nossa proposta de incorporar a variável ambiental nos processos de gestão e de ensino, e disseminar práticas ambientais", explica. Tecnologias limpas são outro recurso para a ecoeficiência, ressalta Carlos Adílio Maia do Nascimento, presidente do Instituto Brasileiro de Produção Sustentável e Direito Ambiental (IBPS). Entre muitos exemplos brasileiros, ele destaca o desenvolvimento de uma nova variedade de eucalipto com menor teor de lignina, substância eliminada durante o fabrico de celulose. Este avanço tecnológico, que decorre da seleção de árvores mais aptas, reduz o uso soda cáustica e enxofre para retirar a lignina. Torna a produção brasileira de celulose mais ecoeficiente e competitiva, deduz Nascimento. O país está saindo do modelo clássico industrial, de extrair e transformar recursos naturais, despejando resíduos na natureza, para o modelo ecoeficiente, que incorpora os impactos ambientais no custo do produto e age para minimizá-los. Mas também este conceito está evoluindo, avisa João Salvador Furtado, Consultor do Programa de Gestão Estratégica Sócio-Ambiental da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo (USP). Ecoefetividade, diz ele, é um dos caminhos promissores, que propõem que qualquer resíduo volte obrigatoriamente à roda da produção, como insumo no mesmo processo, ou na fabricação de outro produto. O conceito impõe uma retaguarda tecnológica sofisticada, pois quem cria uma tecnologia deve prever para quem as sobras servirão. Nada deve ir para aterros ou incineração. E materiais com risco potencial ao ambiente ou à saúde tendem a ser substituídos. Na mesma linha, estão os ecoparques industriais, segundo Furtado, ainda um sonho no Brasil. Diferente de distritos industriais, onde empresas só compartilham alguns serviços, neste caso tudo entra num arranjo ambientalmente produtivo. O resíduo que não volta para ao sistema de produção da própria empresa, tem de ser insumo para a vizinha. Estudos de "metabolismo" industrial podem identificar, inclusive, a quem e a que processo direcionar, por exemplo, o excedente do calor de uma siderúrgica. Empresas mais avançadas já adotam o ecodesign, que avalia fatores ambientais, pela análise de ciclo de vida, para conceber produtos inovadores e ecoeficientes. A Philips , na Holanda, por exemplo, promove estudos da intensidade de material por unidade de serviço que usa dois vetores: reduzir a quantia de matéria-prima por produto, e o número de materiais, para facilitar a desmontagem e reciclagem. Trocar produtos por serviços é outra tendência. A americana Interface é o exemplo de negócio citado por Fernando Almeida, do Cebds. Em vez de vender seus carpetes de fibra natural, cobra pela instalação e manutenção. E troca gratuitamente, quando preciso. O velho vira matéria-prima para o novo. Mas é preciso um novo salto. Almeida informa que cerca de 60% de todos os ecossistemas do planeta estão degradados ou têm uso não-sustentável. "Sem recursos naturais, empresas não sobreviverão", diz. Por isso, ele aposta na desconstrução de velhos modelos econômicos, para a construção de um novo paradigma, sustentável no longo prazo.