Título: As PPPs federais e o fundo garantidor
Autor: Marina Fochesato Cintra
Fonte: Valor Econômico, 31/08/2005, Legislação & Tributos, p. E2

"A possibilidade de satisfação de créditos pela execução da garantia do FGP vem motivando discussões sobre eventual violação à Constituição"

O fundo garantidor das parcerias público-privadas (PPPs) foi instituído para garantir uma eventual falha da administração pública em honrar sua parte na execução dos contratos. Em abril deste ano, foi publicado o Decreto nº 5.411, que autoriza a integralização de cotas no fundo garantidor de PPP (FGP) por meio de ações que representam o excedente da participação acionária da União em sociedades de economia mista e por ações que representam participações minoritárias da União (em percentual inferior a 5% do capital total) em outras empresas. Nos termos da Lei federal das PPPs - a Lei nº 11.079, de 2004 -, o fundo garantidor das parcerias poderá contar com o aporte de recursos pela União, por suas autarquias e fundações públicas, no limite total de R$ 6 bilhões, e é classificado como fundo de natureza privada, visto que o seu patrimônio estará segregado do patrimônio de seus cotistas, o que sujeitará o FGP a direitos e obrigações próprios. A Lei das PPPs também é clara ao dispor que as obrigações e responsabilidades dos cotistas diferem-se das do fundo, regendo que o fundo garantidor "responderá por suas obrigações com os bens e direitos integrantes de seu patrimônio, não respondendo os cotistas por qualquer obrigação do fundo, salvo pela integralização das cotas que subscreverem". A propriedade sobre os bens transferidos a seu patrimônio, por meio da integralização de cotas, é um dos direitos do FGP. O fundo poderá fazer uso desses bens para a concessão de direitos reais de garantia, faculdade essa comum no direito privado. Entretanto, a possibilidade de se satisfazer créditos perante a União em contratos de PPP, por meio da execução da garantia outorgada pelo FGP, vem motivando inúmeras discussões quanto à eventual violação ao artigo 100 da Constituição Federal, que dispõe sobre o regime especial de execução de crédito por precatórios. A esse respeito, não há como se falar em violação ao citado artigo da Constituição, uma vez que esse somente se aplica ao processo de execução forçada dos bens da União e, na execução de garantia prestada pelo FGP, não há a execução de bens da União, mas sim a execução de bens e direitos de propriedade única e exclusiva do FGP.

A propriedade sobre os bens transferidos a seu patrimônio, por meio da integralização de cotas, é um dos direitos do FGP

A Lei das PPPs dispôs que a integralização das cotas do fundo poderá se dar por meio de aporte em dinheiro, cessão de títulos da dívida pública, alocação de bens imóveis dominicais ou de bens móveis, transferência de ações de sociedade de economia mista federal (contanto que seja em quantidade suficiente para manter a União no controle) e outros direitos com valor patrimonial. Nesse sentido, a União optou, com a edição do Decreto nº 5.411, de 2005, pela transferência de ações de sociedade de economia mista federal e de ações que representam participações minoritárias da União, exatamente por serem essas ações ativos de liquidez permanente. Nesse aporte, foram utilizados ativos avaliados pelo governo federal em aproximadamente R$ 4 bilhões, constituídos por ações da União nas empresas Eletrobrás, Coelba, Celpe, Comgás, Coelce, Gerdau, Rhodia-Ster, bem como por ações do Banco do Brasil, da Vale do Rio Doce, Embraer, Petrobras, Usiminas e Tractebel (ex-Eletrosul) que estão vinculadas ao Fundo Nacional de Desestatização e que serão transferidas para o fundo (o mesmo ocorrerá com as ações da Eletropaulo e da CTEEP que integram o Fundo de Amortização da Dívida Pública Mobiliária Federal). Esses ativos dependerão ainda da edição de uma portaria para serem efetivados. Apesar de longa espera, finalmente foi publicada, no Diário Oficial da União, no dia 8 de agosto deste ano, a Resolução nº 1 do Comitê Gestor de PPP, dispondo acerca da gerência do fundo garantidor das PPPs federais. O Comitê Gestor das PPPs atribuiu ao Banco do Brasil a criação, administração, gerência e representação, judicial e extrajudicial do fundo garantidor. A resolução também autorizou a Secretaria do Tesouro Nacional a contratar, juntamente com a Caixa Econômica Federal (CEF) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), fundos da mesma natureza, caso necessário. A resolução ainda foi expressa ao determinar que a prestação das garantias não pode se dar pela mesma instituição administradora dos fundos que vier a financiar as parcerias, salvo se sua participação no empréstimo for minoritária e não exercer a função de estruturador ou coordenador do financiamento. Resta-nos, agora, aguardar o empenho do governo na assinatura de contratos de parcerias público-privadas, dando executoriedade a este novo mecanismo de contratação do poder público.