Título: UE e Mercosul buscam retomar negociações
Autor: Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 01/09/2005, Brasil, p. A5

Relações externas Para Celso Amorim, "há elementos concretos que permitem fazer avanço" em Bruxelas

Para o ministro das Relações Exteriores, será um "reality check" (teste de realidade); para o recém-nomeado embaixador da União Européia no Brasil, João Pacheco, português de nascimento, a chance de estabelecer um "road map" (mapa do caminho). É assim, em inglês, a língua internacional dos negócios, que representantes do Brasil e do bloco europeu preferem definir as expectativas em relação ao encontro de ministros do Mercosul e da União Européia, que começa hoje em Bruxelas, para eliminar o impasse que, há seis meses, paralisou as negociações livre comércio entre os dois blocos. Espera-se que os ministros fixem um roteiro para a retomada das negociações. Embora não chamem a atenção para as negociações, para não criar falsas expectativas, os europeus estão decididos a fazer avançar as discussões, e tentar, se possível, um acordo até a próxima reunião da União Européia com os países da América Latina, em maio, afirma Pacheco. A paralisação das negociações ameaça a iniciativa de cair no descrédito do setor privado, o que a Comissão Européia quer evitar. Os europeus esperam extrair, da reunião em Bruxelas, sinais políticos fortes o suficiente para reacender o interesse do setor privado nas negociações. "Há disposição na Europa de rever as ofertas", disse Pacheco. "Não posso dizer que vamos agora destravar tudo; mas há elementos concretos que permitem fazer um avanço", afirmou o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim. Ele reafirmou que o Mercosul está disposto a oferecer garantias de abertura do mercado de serviços, como telecomunicações e serviços financeiros, aos fornecedores europeus. a Amorim define o "reality check" como o esforço, entre os negociadores, de relacionar os limites reais para as concessões, em matéria de abertura do mercado a fornecedores de mercadorias e serviços, com o futuro acordo de livre comércio. Amorim deixou claro, porém, que as ofertas do Mercosul dependerão de sinais, dos europeus, de empenho real para melhorar o acesso dos exportadores agrícolas do Mercosul ao mercado da Europa. O ministro advertiu, ainda, que o bloco de países do Cone Sul insistirá em obter dos europeus um tratamento diferenciado, de acordo com o desequilíbrio de desenvolvimento das duas regiões. Esse tratamento se realizaria sob a forma de prazos mais elásticos para derrubada de barreiras à importação ou menor percentual de queda de tarifas, no período de transição do acordo, para os países do Mercosul. "São países de níveis diferentes; quando negociamos com os países andinos levamos em conta as assimetrias", argumentou Amorim. Diplomatas que assessoram o ministro comentam que só a reunião ministerial poderá remover obstáculos que levaram à paralisação das negociações, como as condições impostas pelos europeus para aumento das cotas com tarifa reduzida para produtos agrícolas (como carnes) do Mercosul. Uma dessas condicionalidades é a previsão de uma cláusula de ajuste, pela qual, a cada ano, a cota poderia ser reduzida na mesma proporção das exportações que fossem vendidas além da cota, no ano anterior. O embaixador Pacheco, até recentemente um dos principais encarregados da negociação de assuntos de agricultura pela União Européia, afirma que as concessões do bloco dependerão, em grande medida, da disposição mostrada pelos negociadores do Mercosul. Tanto Pacheco quanto Amorim acreditam que a negociação não terá condições de avançar muito em termos concretos, até pela proximidade da reunião ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), em dezembro, em Hong Kong, onde os 148 sócios da instituição esperam obter avanços na liberalização do comércio mundial, especialmente para as exportações agrícolas. "É importante avançar entre nós agora, porque uma expectativa positiva terá importância também para as negociações na OMC", comentou Pacheco. "Não é perda de tempo, é ganhar tempo fazer essa reunião entre os dois blocos", diz o diplomata.