Título: Conselho é unânime pela cassação de Jefferson
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 02/09/2005, Política, p. A9

Crise Petebista ameaça fazer "discurso devastador" no plenário

A decisão unânime tomada ontem pelo Conselho de Ética - por 14 votos a 0 - a favor da cassação do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) dificulta a situação do parlamentar em plenário. Jefferson será julgado pelos 512 colegas provavelmente no dia 14. Em reunião na noite de quarta-feira com correligionários, em que já estava ciente da derrota que sofreria no Conselho de Ética, Jefferson antecipou que fará um discurso devastador na tribuna no dia em que a Câmara decidirá se ele perde ou não o mandato e os direitos políticos pelos próximos oito anos. Ele pretende revelar o que fez com os R$ 4 milhões que recebeu do PT por caixa 2. O parecer aprovado foi elaborado pelo deputado Jairo Carneiro (PFL-BA), que se sentiu ofendido pelos advogados de Jefferson. Os dois advogados - Itapuã Prestes de Messias e Luiz Francisco Barbosa - deixaram o plenário, sob vaias, antes da votação, alegando cerceamento de defesa. Eles já anteciparam que, se cassado, Jefferson recorrerá ao Supremo Tribunal Federal sob a alegação de que os ritos foram violados durante o processo. O bate-boca dos advogados com o relator levou à suspensão da sessão. O Conselho nomeou o deputado José Militão (PTB-MG) como defensor dativo de Jefferson, para evitar ilegalidade no processo. Constrangido, o deputado mineiro se calou: "Estou aqui apenas atendendo a uma convocação do presidente do Conselho. Vou abrir mão de qualquer tempo que possa ser utilizado". No encontro com petebistas, realizado na casa do senador Sérgio Zambiasi (PTB-RS) , em Brasília, Jefferson disse ainda que a lista proposta pelas CPIs para abertura de processos contra 18 parlamentares, incluindo ele próprio, é "muito pequena". Entre as insinuações, Jefferson reforça que o líder do PP, José Janene (PR), ainda não revelou o que sabe. "Se ouvirem o Janene e a turma toda, terão 80, 100 nomes. E esses ai é que vão votar pela cassação do Roberto Jefferson?", alfinetou o deputado Nélson Marquezelli (PTB-SP), principal aliado do petebista e único que o defendeu no Conselho. Na última semana, circularam no Congresso rumores de que o PTB tentava um acordo com o PP para poupar Jefferson. As tratativas não prosperaram. A prova é que o membro do PP no Conselho, Benedito de Lira (AL), votou pela cassação. O anúncio de um discurso bomba no plenário do ex-presidente do PTB é uma forma de intimidar os parlamentares. O voto, no plenário, é secreto. A cassação exige a aprovação de no mínimo 257 deputados. Uma das possibilidades é que Jefferson diga para quem distribuiu o dinheiro. Ou que o devolva, admitem amigos do petebista. "Ele não vai assumir essa pecha de que o dinheiro ficou com ele. Não pode assumir. Se o dinheiro estiver com ele, tem que devolver. Se não estiver, ele vai dizer para quem deu", afirmou Marquezelli. Como suplente, Marquezelli foi impedido de votar. O único titular do PTB, Ricardo Izar (SP), não votou porque é presidente do Conselho. Ao ser indagado se a decisão do Conselho dá legitimidade à cassação, Marquezelli reagiu: "Toda unanimidade é burra". O deputado apresentou recurso à Comissão de Constituição e Justiça solicitando que a cassação de Jefferson só seja votada após a conclusão final dos trabalhos das CPIs no Congresso. Não há chance de ser atendido. Jefferson apresentou versões conflitantes sobre o destino dos R$ 4 milhões, que recebeu na sede do partido, entregues pelo publicitário Marcos Valério de Souza. Primeiro, disse que guardou no cofre do PTB. Depois, afirmou que o distribuiu para petebistas que disputaram eleições e tinham dívidas de campanha. Ele disse que assumiria as responsabilidades sozinho pelo fato, como pessoa física, e não delataria os colegas. "Sublimei meu mandato", reiterou diversas vezes. Agora, a situação mudou. Foi o recebimento dos recursos do PT o que mais complicou a situação de Jefferson. Segundo o relator do Conselho de Ética, o esquema do mensalão não se confirmou na forma denunciada por Jefferson - pagamento mensal de R$ 30 mil a deputados do PP e PL, pelo PT, para que votassem a favor do governo. "O que hoje é público e notório é que houve um esquema de pagamento ilícito a parlamentares de diversos partidos, mas do qual o próprio representado foi beneficiário e é réu confesso", alegou Carneiro, em esclarecimento por escrito que integrou ontem ao voto. O relator disse ainda que é "risível" a argumentação dos advogados de Jefferson de que ele, ao receber os R$ 4 milhões, "não estava no exercício de nenhuma atividade parlamentar, senão como presidente do PTB": "O decoro parlamentar não se extingue quando atravessamos os muros deste prédio". Durante a votação do parecer, houve preocupação dos parlamentares em enfatizar que Jefferson deve ser cassado porque foi beneficiário do esquema que ele próprio denunciou, além de ter praticado tráfico de influência em estatais para favorecer financeiramente seu partido. "Está confirmada a insofismável existência do mensalão. A não comprovação da periodicidade e da quantia distribuída não afasta essa confirmação", enfatizou o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), que também é membro da CPI Mista dos Correios. "No plenário, o Roberto tem a simpatia da Casa", garantiu o líder do PTB, José Múcio Monteiro (PE). Segundo ele, Jefferson permanece confiante. Não houve encontro de confraternização da bancada com ele, disse o líder: "Para comemorar o que? Só queríamos que ele soubesse que a bancada é solidária".