Título: Brasil prepara reunião do G-4 para desbloquear Rodada Doha
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 05/09/2005, Brasil, p. A2

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, informou que o Brasil deve ter reunião ministerial com EUA, União Européia (UE) e Índia ainda este mês, em Paris, em novo esforço para destravar a Rodada Doha na Organização Mundial de Comércio (OMC). Trata-se do G-4, grupo informal onde Amorim, o ministro indiano Kamal Nath, o representante americano Rob Portman e os comissários europeus Peter Mandelson (comércio) e Marianne Boel (agricultura) discutem as barganhas cruzadas entre setores. Se esses países-chave não "aproximarem posições", nada avança na OMC. A convocação das reuniões do G-4 é feita por rodízio. Agora, é a vez do Brasil, mas Amorim disse que a data não está definida. O Brasil e a Índia continuam sendo pressionados por Washington e Bruxelas a assumir compromissos de amplos cortes de tarifas industriais. Mas tudo passa primeiro pelo que sairá da agricultura. Nesse contexto, o diretor-geral de agricultura da União Européia, Silva Rodrigues, estará hoje em Brasília para examinar novas opções para cortar tarifas e subsídios. A visita de Rodrigues antecede a reunião ministerial do G-20, sexta-feira e sábado próximos no Paquistão, para afinar sua plataforma. As atuais propostas agrícolas que estão dando o tom na Organização Mundial do Comércio são do G-20, já que americanos e europeus ainda não colocaram as cartas na mesa. Os europeus continuam na expectativa de que os Estados Unidos se comprometam mais com a redução de subsídios domésticos, ao invés de só insistir no corte de tarifas. Na sexta-feira, na retomada da negociação União Européia-Mercosul, os europeus tampouco deram a esperada sinalização, para Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, do que podem efetivamente oferecer numa nova oferta agrícola, para concluir o chamado "´maior acordo de livre comércio do planeta". Ministros e comissários dos dois blocos limitaram-se a reafirmar a importância estratégica bilateral, fixaram reuniões técnicas para antes (novembro, em Montevidéu) e depois (fevereiro) da conferência da OMC em Hong Kong, deixando claro o vinculo entre as negociações. Mas para o ministro argentino Roberto Lavagna, a reunião de Bruxelas foi um "êxito" só com o fato de o Mercosul recusar de vez todas as ofertas agrícolas até agora feitas pelos europeus. "A palavra exata é explorar agora qual a margem possível de cada lado" para concessões adicionais, segundo o europeu Karl Falkenberg. "Já vi esse filme três anos atrás, agora não há mesmo nada concreto", reagiu, perplexo, o representante da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária, Antonio Donizete. No entanto, técnicos europeus disseram informalmente que a reforma da Política Agrícola Comum (PAC) começa a dar resultados. A redução de subsídios tem provocado aumento de importações e pode permitir nova oferta agrícola "importante" para o Mercosul, que por força de um acordo preferencial dará mais acesso do que pela Rodada Doha. Para retomar a negociação UE-Mercosul, os ministros preferiram uma "abordagem política" - concentrando-se nos temas mais problemáticos - para um balanço ministerial em março. Amorim propôs três temas: oferta agrícola européia, setor de serviços e flexibilidade para o Mercosul (mais prazo para cortar tarifas etc). Lavagna incluiu um acordo fitossanitário para evitar que o melhor acesso dos produtos agrícolas seja bloqueado por exigências adicionais na Europa. Os europeus reagiram, dizendo que querem negociar indicações geográficas (mais proteção para alguns produtos) e acesso de suas empresas nas licitações de compras governamentais no Mercosul. "Não haverá concessões em indicações geográficas, nem no setor automotivo, basta ver o conceito de flexibilidade que introduzimos no comunicado", avisou Lavagna, refletindo o fosso entre aspiração política e o concreto.