Título: IGPs em baixa e dólar barato derrubam reajuste de tarifas
Autor: Leila Coimbra e Sergio Lamucci
Fonte: Valor Econômico, 05/09/2005, Brasil, p. A3
Energia Consumidor já começa a se beneficiar com correções menores
O consumidor residencial de energia já sente no bolso a queda da inflação e o recuo do dólar. Desde julho, três empresas já aplicaram índice negativo no reajuste de suas tarifas para o cliente residencial: a Eletropaulo fez em julho uma redução de 7,8% nas tarifas; a Companhia Energética de Brasília (CEB), diminuiu 4,78% o preço de sua energia em agosto e a Elektro, no interior paulista, reduziu em 0,9%. Os próximos índices de correções das tarifas de energia também deverão ser baixos ou até mesmo virar descontos tarifários, segundo análise da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), responsável pelos reajustes e revisões tarifárias do setor. Vários fatores vêm influenciando essa queda. O Índice Geral de Preços de Mercado (IGP-M) registrou em agosto a quarta deflação seguida, acumulando alta de 0,75% no ano. Outra boa notícia é o comportamento do dólar, que continua abaixo de R$ 2,40, mesmo num cenário de crise política. O superintendente de regulação econômica da Aneel, César Antônio Gonçalves, ressalta que além da deflação dos IGPs, a queda do dólar barateia a compra de energia da hidrelétrica de Itaipu. Hoje, 25% da energia comprada pelas distribuidoras do Sul e do Sudeste para revenda vem de Itaipu, cujo preço é em dólar. Além disso, segundo Gonçalves, os leilões de energia existente feitos no fim do ano passado e começo deste ano colocaram os preços da energia em patamares mais baixos. "Para as distribuidoras, os custos de compra de energia estão bem abaixo do verificado no ano passado". Em 2004, Eletropaulo, Elektro e CEB aplicaram aumentos médios entre 17% e 20%. Gonçalves explica que nos casos de revisão tarifária, no entanto, a pequena alta dos IGPs não terá grande influência. Isso porque, para a Aneel, os reajustes tarifários e as revisões de tarifa são coisas distintas. Os reajustes, feitos anualmente, levam em consideração uma fórmula que envolve o IGP-M, e dele se subtrai o fator X, que funciona como um redutor tarifário. O fator X é a incorporação às tarifas de parte dos ganhos de produtividade das empresas. Mas, nas revisões tarifárias, feitas a cada quatro anos, a Aneel leva em conta os custos financeiros e a remuneração dos ativos da concessionária. Nas revisões, portanto, é aplicada outra fórmula. " Na revisão, a agência estabelece os novos custos operacionais da empresa, de modo eficiente". Agora em setembro, serão feitas as revisões tarifárias da Chesp e da Celg, ambas em Goiás. Em outubro, será a vez do reajuste das distribuidoras CEEE, no Rio Grande do Sul, Bandeirante e CPFL Piratininga, as duas últimas em São Paulo. Segundo o superintendente da Aneel, a CEEE, a Bandeirante e a Piratininga terão também mudança na sua base de revisão, que foi dada de forma provisória nos anos anteriores. Em novembro, será a vez da Light e, em dezembro, a Ampla, ambas no Rio. Com a perspectiva de os IGPs fecharem o ano abaixo de 2% e a forte valorização do câmbio, o economista Carlos Thadeu de Freitas Gomes Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), traça um cenário bem mais tranqüilo para a alta da energia no resto deste ano e também em 2006. Gomes Filho estima que o grupo energia no IPCA deve subir 7,5% em 2005. No começo do ano, ele previa uma alta de 9,5%. De janeiro a junho, os preços da eletricidade subiram 5,3%. Para atingir a previsão de 7,5%, o reajuste médio de agosto a dezembro deve ficar em 0,41% ao mês. Desse modo, a aposta em reajustes modestos de energia daqui para a frente ajudou a tornar mais benigno o quadro para a inflação em 2005 e 2006. A previsão do mercado para o IPCA, que serve de referência para o regime de metas, está em 5,26%, depois de atingir 6,39% em meados de maio. Depois da mudança do regime de câmbio em 1999, os preços de energia foram uma das principais fontes de pressão inflacionária, dificultando a vida do BC em sua tentativa de controlar a inflação, nota Gomes Filho. O quadro foi dramático principalmente em 2003, quando as cotações de energia aumentaram nada menos de 25%, muito acima dos 9,3% do IPCA. Esse movimento se deveu em grande parte à alta significativa dos IGPs nos últimos anos, mas também a fatores como o seguro-apagão, instituído em 2002. De janeiro de 1999 a julho deste ano, o grupo energia aumentou 175,6%, enquanto o IPCA teve alta de 70,1% no mesmo período. Gomes Filho prevê que a diferença vai se estreitar bastante, principalmente em 2006. Ele acredita que os preços de energia vão subir 5% no ano que vem e o IPCA, 4,9%. A economista Tatiana Pinheiro, do ABN AMRO, também avalia que o principal impacto favorável vai se sentir em 2006. Com os IGPs fechando 2005 na casa de 2%, o reajuste de energia contratado para o ano que vem tende a ser mais modesto. "Os preços administrados devem puxar o IPCA para baixo em 2006." Com isso, haverá mais espaço para os preços livres subirem, facilitando a tarefa do BC de cumprir a meta de 2006, de 4,5%, com 2 pontos percentuais de tolerância. Para o especialista em energia e diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (Cbie), Adriano Pires, a principal preocupação no momento é a mudança na política tarifária proposta pelo governo, de trocar o IGP-M pelo IPCA como indexador dos contratos de energia. "Quem perde com essa troca é o consumidor", diz ele. Para Pires, se a crise política se agravar, pode ocorrer uma nova alta do dólar. "E aí, o IGP-M volta a crescer". O superintendente da Aneel diz que mudanças na política tarifária não são de responsabilidade da agência, e sim do governo. Mas ele não acredita que essa mudança traga impactos ao setor. "No longo prazo, IPCs e IGPs sempre apresentaram a mesma evolução". De janeiro de 1999 até julho deste ano, porém, a história é um pouco diferente: o IPCA subiu 70,1%, enquanto o IGP-M acumula alta de 125,6%.