Título: Serra prega a "reconstrução" da política econômica
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 05/09/2005, Política, p. A7

Crise Tucano faz discurso de candidato, ataca a área mais elogiada do governo de Lula e diz que país está paralisado

Na semana em que o governo comemorou bons números na economia, o prefeito de São Paulo, José Serra, pregou a necessidade de se "reconstruir a política econômica", de forma a conciliar estabilidade e crescimento. "Este governo não vai fazê-lo. Não tem vontade política, competência técnica nem credibilidade para tanto", disse o tucano em palestra no Conselho de Empresários da América Latina (Ceal), realizada no Clube São Paulo no fim de semana. Intitulado "Crise e Oportunidade", o texto de Serra tem o tom de uma plataforma de campanha. As principais críticas do prefeito são à condução da política econômica, a área mais elogiada do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas há também intervenções sobre a infra-estrutura e sobre ética. Para Serra, as ações necessárias para a reconstrução da política econômica "pressupõem a restauração da moralidade na máquina pública", tarefa que, segundo ele, "vai muito além da reforma política". Único nome a bater Lula nas pesquisas de opinião mais recentes, Serra faz discurso de candidato. Um discurso estruturado. Para o prefeito, "o Brasil atravessa uma das piores crises políticas da história republicana". Em contraste com o passado, observa que "as dificuldades atuais não têm origem em choque externo da natureza daqueles que marcaram a história econômica brasileira", especialmente na segunda metade dos anos noventa. Serra é taxativo: "Trata-se de crise de natureza interna e essencialmente política", diz, e isso num momento "em que o país teria condições de aproveitar a chance singular para crescer mais rápido e de forma sustentada". No entanto, disse Serra aos empresários reunidos no Clube São Paulo, "o Brasil apresenta um dos piores desempenhos em termos de crescimento entre os países emergentes" - o crescimento de 4,9% do PIB em 2004 foi inferior à expansão da economia mundial, de 5,1%, à da América Latina e à de países como a Argentina. Para Serra, o PIB de 1,4% do segundo trimestre não é motivo para tanta comemoração do governo. "O Brasil continua como um dos emergentes menos dinâmicos da economia mundial". Baseado nos "números mais recentes" do IBGE, o tucano afirma que as projeções para 2005 indicam um crescimento pouco acima de 3%, inferior ao da economia mundial e da América Latina. Serra acredita que o país "está perdendo uma grande oportunidade de promover um salto de crescimento", pois, segundo afirma, "as condições gerais da economia mundial de grande liquidez e forte expansão da demanda externa são as mais favoráveis desde a crise de 1929". "Diante de uma oportunidade de ouro, o país está paralisado, sem rumo", disse Serra aos empresários. Candidato do PSDB derrotado por Lula nas eleições presidenciais de 2002, o prefeito de São Paulo faz cobranças: "Choca da mesma forma a distância entre as promessas de campanha e as realizações práticas". O exemplo seria a política de juros, recordista mundial num governo que, na oposição, passou 20 anos criticando a política de juros altos. Segundo o tucano, essa política "tem consequência nefasta sobre o potencial de crescimento da economia em virtude de três fatores". O primeiro: o custo fiscal. De acordo com Serra, em 2003 e 2004 gastou-se, respectivamente, 7,8% e 7,07% do PIB em juros, o que teria sido "suficiente para reverter superávits primários acima de 4% para déficits nominais de 3,62% e 2,47%". Segundo fator: a apreciação da taxa de câmbio. De acordo com o prefeito paulistano, a taxa real do câmbio hoje está em "níveis próximos àquele que prevalecia por ocasião da crise cambial em dezembro de 1998". Por fim, a combinação de juros elevados e taxa de câmbio "excessivamente apreciada inibe os investimentos produtivos, especialmente em capacidade exportadora". O discurso de Serra tenta tirar uma bandeira freqüentemente levantada pelo governo Lula: "A estabilização dos preços foi conquistada a duras penas pela sociedade brasileira e constitui bem público a ser preservado". Mas o caminho da estabilidade, adverte, "não passa pela manutenção imprudente de elevadíssimas taxas de juros que comprometem as contas públicas e destroem o potencial de desenvolvimento do país". Segundo Serra, essa política "não reflete, como poderia parecer à primeira vista, uma convicção de austeridade do atual governo", mas "denuncia, isto sim, falta de qualquer compromisso no passado com a estabilidade e conseqüente ausência de credibilidade e reputação para promover políticas menos custosas de controle monetário". O tom é de campanha: "Reflete, ademais, inépcia, falta de imaginação para assegurar os ganhos no controle da inflação, sem condenar o país a um crescimento medíocre".