Título: Tradição esbarra em desinteresse de novas geraç
Autor: Mônica Scaramuzzo
Fonte: Valor Econômico, 05/09/2005, Especial, p. A12

Uma tradição passada de pai para filho está prestes a se quebrar. O cafeicultor Davi Engel, de 81 anos, deverá se desfazer de sua fazenda de 164 hectares plantadas com café para se dedicar somente à sua aposentadoria. Ele afirma que o café está mais do que enraizado na sua família e que a cultura foi passada de geração para geração, mas que a linha deverá ser quebrada porque seus filhos seguiram carreiras diferentes e não estão interessados em dar prosseguimento ao legado familiar. A decisão de se desfazer dos negócios ainda não está totalmente tomada, uma vez que para Engel está sendo difícil largar uma história de mais de 50 anos ligada ao café. Engel diz, sem convicção, que quer viajar com sua mulher pelo Brasil para aproveitar sua aposentadoria, depois de tantos anos dedicados à cafeicultura. "Já viajei bastante para o exterior". Proprietário de uma fazenda de 164 hectares em Alfenas, no sul de Minas Gerais, com uma produção estimada em 2 mil sacas nesta safra, Engel lembra que já teve que se desfazer de fazendas de sua família para cobrir as despesas durante a crise do setor. Engel até que tentou fugir do café no começo de sua trajetória profissional para tentar a vida como comerciante de secos e molhados. Mas a tradição falou mais alto e Engel acabou assumindo os negócios da família. A família de sua esposa, dona Lúcia Engel, também tem tradição no setor. "Meu avô herdou terras de café", afirma dona Lúcia. Para seu Engel, pesa na decisão de se desfazer de sua fazenda de café o fato de seus seis filhos serem bem-sucedidos em suas profissões - médicos, dentistas e fisioterapeutas - e não terem interesse algum em trabalhar no campo. "Não tenho mais saúde suficiente para percorrer os cafezais. O ideal era que um dos meus filhos assumisse essa tarefa". O produtor conta com a ajuda de um engenheiro agrônomo para as vistorias diárias na fazenda. As vendas de propriedades rurais são mais comuns durante crises do setor, o que não é o caso neste momento. Luiz de Castro Martins, proprietário da Castro Imobiliária, observa que a crise na cafeicultura e a situação financeira do país influenciam na decisão das negociações de terras rurais. Segundo ele, as terras agrícolas para café estão valorizados nestes últimos dois anos. Durante a crise do café, é comum cafeicultores colocarem suas terras à venda por preços bem abaixo dos praticados no mercado. De acordo com Castro, existem alguns cafeicultores de Alfenas que também são proprietários de imóveis na cidade. "Durante a crise, eles conseguem garantir a renda com os aluguéis desses imóveis", observa Castro. "Quem mexe com café é um apaixonado pelo setor", afirma Nivaldo Maximiano, cafeicultor de Campos Gerais, também no sul mineiro. Segundo ele, o tradicional cafeicultor pode até arriscar-se em outras culturas para driblar a crise, mas é no café que está sua verdadeira paixão. Nivaldo também planta milho e tem gado, mas garante que é nas lavouras de café que investe quando está capitalizado.(MS)