Título: Projeto vai reger direito de greve de servidor
Autor: Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 08/09/2005, Brasil, p. A3

Funcionalismo Ministério quer garantir em lei o desconto dos dias parados de grevistas do setor público

O governo Lula prepara um projeto de lei para regulamentar o direito de greve no serviço público. O texto está sendo negociado com representantes de entidades sindicais e deverá ser submetido a audiência pública em meados de outubro, anuncia o secretário nacional de Relações do Trabalho, Oswaldo Bargas. Segundo ele, a intenção é encaminhar a proposição ao Congresso ainda este ano. Dificilmente, antecipa, haverá acordo sobre todos os pontos. Ciente de que as lideranças sindicais não vão aceitar, o governo não abre mão de incluir no projeto um dispositivo que lhe garanta o direito de "cortar o ponto" e, assim, descontar os dias parados do salário de quem fizer greve. A falta dessa garantia, hoje, torna o governo refém do funcionalismo público. Na ausência da regulamentação, as decisões judiciais sobre pagar ou não os dias parados dependem da cabeça de cada juiz e, na maioria dos casos, são favoráveis aos grevistas. Isso tira dos administradores públicos um importante instrumento de barganha. "As greves não podem ser férias. O governo não pode continuar pagando a quem não está trabalhando", diz o secretário. Outro dispositivo que o governo já decidiu incluir no projeto diz respeito à representatividade das assembléias que decidem pelas paralisações. Na proposta do Executivo, só servidores ativos poderão deliberar. Não raras vezes, elas são deflagradas ou prorrogadas em assembléias nas quais a grande maioria é de aposentados, o que favorece a radicalização e a longa duração dos movimentos. Como não podem ser atingidos pelo eventual "corte do ponto", os servidores inativos, graças à regra da paridade, só têm a ganhar, porque os reajustes salariais são extensivos às aposentadorias e pensões. Bargas antecipa que o projeto de regulamentação dá ao governo o direito de fazer contratações de emergência e temporárias de pessoal, para assegurar a não-interrupção de serviços essenciais à população e ao funcionamento da máquina administrativa. O direito de greve no serviço público existe desde a Constituição de 1988. Como nunca foi regulamentado, tem sido exercido de modo abusivo por segmentos do funcionalismo, diz o secretário de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Sérgio Mendonça. O mais emblemático exemplo de greve abusiva, na sua opinião, é a dos funcionários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), movimento que fechou postos por quase três meses. Ele também considera abusivas as paralisações no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nos últimos anos. "O pessoal do IBGE fez três greves (desde o início do atual governo), todas muito longas." O governo Lula entende que não basta disciplinar o direito de greve. "Não pode haver uma lei de greve sem que se crie junto um sistema de negociação coletiva e de solução de conflitos", diz Bargas, ex-sindicalista. Por isso, informa, o projeto em elaboração trata desse aspecto e está sendo discutido com entidades sindicais. A idéia é institucionalizar e aprimorar a experiência da Mesa Nacional de Negociação Permanente, fórum criado pelo atual governo para discutir questões salariais com lideranças do funcionalismo. O sistema previsto no projeto permite, no âmbito federal, negociações coletivas em três diferentes níveis: geral, setorial e específico (demanda localizada de uma carreira, por exemplo). A lei que resultar do projeto valerá para os servidores federais, estaduais e municipais. E caberá a Estados e municípios definir como funcionarão os seus sistemas de negociação. As negociações deverão levar em consideração a disponibilidade de recursos nos orçamentos públicos e o princípio da reserva legal do Poder Legislativo, a quem cabe aprová-los. Em outras palavras, ambos os lados terão de considerar que o Executivo tem autonomia relativa e limitada para negociar aumentos salariais. De acordo com o projeto, os gestores públicos não poderão se recusar a negociar. Se não houver acordo e os servidores deliberarem greve, serão exigidos procedimentos anteriores, como avisar com pelo menos 72 horas de antecedência e acertar um funcionamento mínimo dos serviços. Os acordos firmados serão como um contrato, com prazo definido de duração. Em algumas atividades - serviço militar, representações diplomáticas e emergências de hospitais - não poderá haver greve.