Título: Modelo de Dilma prevalece
Autor: Gonçalves, Marcone
Fonte: Correio Braziliense, 21/04/2010, Economia, p. 21

Costura intensa para conseguir a participação de mais de um grupo e garantir a disputa

O sucesso do leilão da usina de Belo Monte representa uma vitória política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da pré-candidata do PT, Dilma Rousseff, ex-ministra da Casa Civil e de Minas e Energia. Ambos insistiram na realização da disputa, enfrentaram ¿ e venceram ¿ os principais grupos privados do setor que haviam desistido da disputa. Eles alegaram que a tarifa de R$ 83 a ser cobrada pela energia não cobriria os R$ 19 bilhões necessários para tocar as obras. No fim, a tarifa foi ainda menor: R$ 77,97.

¿O leilão de Belo Monte mostra que a ministra Dilma Rousseff fez no setor elétrico o mesmo que Palloci na economia. Ela soube aperfeiçoar o modelo que recebeu do governo Fernando Henrique Cardoso¿, avaliou uma fonte do próprio governo Lula. Ao contrário da gestão anterior, que priorizou investimentos em termelétricas, a ministra apostou nas hidrelétricas. E a vitória de Dilma se deu também no âmbito interno. Diferentemente do que pretendia a corrente majoritária do PT, ela não desistiu do modelo baseado em competição no setor privado.

Não foi fácil viabilizar a venda da terceira maior obra do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) dentro do preço pretendido. O governo precisou fazer um costura política, empresarial e administrativa sem precedentes. De acordo com analistas, o pacote de subsídios poderia chegar a quase R$ 6 bilhões. Para tanto, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) entrou financiando 80% dos recursos com juros subsidiados, ao mesmo tempo que os fundos de pensão das estatais foram convocados a participar dos consórcios.

A isenção de até 70% no Imposto de Renda e a entrada das subsidiárias da Eletrobras deixaram claro que o Palácio do Planalto estava disposto a bancar o empreendimento. ¿O deságio obtido no preço mostra que o governo nem precisa fazer tantas concessões¿, analisou um especialista da Eletrobras. Para Luiz Nelson Araújo, especialista da consultoria BDO, mesmo com o sucesso do leilão o preço acertado ainda preocupa. Isso porque, disse, o custo da obra pode ir a R$ 30 bilhões. ¿Não sabe se lá para frente essa equação fecha. A questão das linhas de transmissão é outra coisa complicada, pois sabemos que ela custa mais caro que a própria geração de energia¿, alertou.

Já o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto, assinalou que o resultado do leilão da hidrelétrica de Belo Monte é ¿uma sinalização importante¿ de que o país terá oferta de energia elétrica. ¿Os dois consórcios que concorreram pela obra têm competência e qualificação técnicas indiscutíveis. O que vale destacar, no encerramento do leilão, é que existe a garantia de que o Brasil vai ter energia elétrica no futuro para continuar crescendo¿, destacou Monteiro Neto.

O número R$ 6 bilhões Valor a que pode chegar o total do pacote de subsídios oferecido pelo governo para permitir a venda da usina

Crescimento assegurado

A construção da hidrelétrica de Belo Monte é uma das peças que podem assegurar o crescimento do Brasil que, até o fim da década, deve ocupar o posto de quinta maior economia do mundo. No entanto, os especialistas do setor consideram que a nova usina, embora essencial, não vai resolver, sozinha, as necessidades do país e nem mesmo afastar de vez o risco de um possível racionamento no futuro.

¿Estamos sendo favorecidos por índices pluviométricos excepcionais. O problema é quando enfrentarmos uma pluviometria ruim com um ritmo de crescimento entre de 5% e 6% ao ano¿, alertou Luiz Nelson de Araújo, da consultoria BDO. De acordo com o especialista, o Brasil tem que insistir em projetos que gerem entre 10 e 11 mil megawatts de energia.

Um estudo realizado pela consultoria estima que entre 2010 e 2013 serão investidos R$ 274 bilhões em obras em energia elétrica, telecomunicações, saneamento e transportes, valor 37,3% superior ao registrado no quadriênio de 2005 a 2008. Pelo menos 33,3% de todo esse recurso, o correspondente a R$ 92 bilhões, serão investidos no setor elétrico.

Os grandes investimentos previstos para o setor já começam a se refletir no valor de mercado das empresas. A Link Consultoria de Investimentos reavaliou a alta das ações das três maiores empresas privadas do setor até o fim do ano: a AES Tietê (valorização de 40%), a Cesp (12%) e a Tractebel (38%). (MG)