Título: A função e uso do termo de arbitragem
Autor: Selma Lemes
Fonte: Valor Econômico, 08/09/2005, Legislação & Tributos, p. E2

"O termo é um instrumento processual organizador da arbitragem para delimitar a matéria objeto do procedimento"

O termo de arbitragem é um instrumento processual arbitral que está previsto em regulamentos de diversas instituições arbitrais no Brasil, tendo a importante função ordenadora da arbitragem. Por meio dele as partes podem efetuar as adaptações nas regras do regulamento que julgarem necessárias às suas especificidades e que sejam possíveis (sem violar normas cogentes, tais como os princípios da igualdade de tratamento das partes e do contraditório). Cite-se, por exemplo, a questão referente aos prazos previstos em alguns regulamentos, que podem ser considerados exíguos em face da complexidade da matéria tratada e que podem ser alterados pelas partes. O termo de arbitragem também tem a finalidade de delimitar a controvérsia, esclarecer sobre o local sede da arbitragem, a lei aplicável, a autorização para os árbitros decidirem por equidade, qualificar os árbitros etc. O termo em tudo se assemelha à ata de missão da Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI). A ata de missão passou a integrar o regulamento da CCI em 1955 e teve suas origens no primeiro regulamento redigido em 1922, que dispunha sobre o formulário de submissão, no qual deveria constar o nome das partes e do árbitro, o local e objeto da arbitragem, as razões das partes etc. Tinha o duplo objetivo de (1) oficializar as arbitragens da CCI e (2) cumprir com a exigência do compromisso arbitral, instrumento que outorgava efeito vinculante à arbitragem em muitas legislações, haja vista a CCI dedicar-se, em especial, às arbitragens internacionais. O termo de arbitragem é um instrumento processual organizador da arbitragem. Fornece às partes e aos árbitros a oportunidade de acordarem sobre o procedimento, prazos, documentos e, principalmente, para identificar e delimitar a matéria objeto da arbitragem, que repercute no mister dos árbitros, garantido que a sentença arbitral decida nos limites do pedido. A conceituação jurídica do termo de arbitragem e a sua relação com a convenção de arbitragem merecem estudo e reflexão doutrinária, haja vista as distinções de situações em que nos deparamos na prática, que não afetam o regular e legal processamento da arbitragem, mas que têm conotações diferentes. Explicamos. A primeira situação a ser considerada é quando as partes comparecem e participam regularmente da arbitragem e, estando acordes, assinam o termo de arbitragem. Nesta hipótese, o termo de arbitragem em tudo se assemelha ao compromisso arbitral (artigo 10 da Lei n° 9.307, de 1996). A segunda situação é quando o demandado, regularmente intimado a participar da arbitragem e indicar árbitro, não comparece. Neste caso, conforme as disposições do regulamento de arbitragem eleito, o presidente da instituição arbitral indica um árbitro em nome da parte ausente, bem como a falta de assinatura no termo de arbitragem não obstaculiza o regular processar da arbitragem. Estas disposições supridoras da atuação da parte faltante estão de acordo com as normas legais e devem ser interpretadas na suas respectivas dimensões lógica, sistemática e teleológica. A arbitragem está instituída quando os árbitros aceitam a investidura (artigo 19) e o compromisso arbitral não é, portanto, imprescindível. Ademais, a revelia não obsta o regular processar da arbitragem (artigo 22, parágrafo 3°). Destarte, nesta situação, o termo de arbitragem não teria a efetiva conotação de um compromisso arbitral.

O termo de arbitragem tem o condão de ressaltar a missão do árbitro para não gerar motivos para a anulação da sentença

Nessa hipótese, em que o demandado não comparece para firmar o termo de arbitragem, recomenda-se aos seus redatores que se mantenham fiéis à convenção de arbitragem e não alterem nenhuma estipulação do regulamento de arbitragem. O tribunal arbitral deve pautar-se no regulamento e o termo de arbitragem ratificar todas as suas disposições sem nenhuma alteração de forma e conteúdo. A jurisprudência comparada, ao se manifestar sobre a natureza jurídica da ata de missão da CCI, por vezes equipara-a ao compromisso arbitral e, em outras, salienta que há distinção entre a convenção de arbitragem e a ata de missão, cujo objeto consiste "em definir os pontos do litígio e a missão do árbitro". O termo de arbitragem tem na delimitação do objeto do litígio e do pedido das partes seus pontos mais importantes, que representam a estabilização da demanda. Apesar de ser a convenção de arbitragem o instrumento originário e vinculante da arbitragem, não se pode deixar de considerar que o termo de arbitragem tem o condão de reiterar os termos da convenção de arbitragem, delimitar a controvérsia e ressaltar a missão do árbitro, que deverá ater-se às suas disposições, para não gerar motivos para a anulação da sentença arbitral. Em suma, deste importante instrumento ordenador do processo arbitral denominado termo de arbitragem podemos exarar as seguintes considerações finais e conclusivas: 1) diante de um termo de arbitragem em que as partes estão presentes, este pode ser equiparado ao compromisso arbitral; 2) quando o demandado estiver ausente, operando-se a revelia (artigo 22, parágrafo 3°), o termo de arbitragem deve manter-se fiel ao regulamento da instituição arbitral; 3) segundo a Lei n° 9.307/96, o que vincula as partes é a convenção de arbitragem válida e cheia (indique a arbitragem administrada por uma instituição arbitral); 4) que a arbitragem está instituída quando os árbitros aceitam a investidura; e 5) que a arbitragem é plenamente válida em ambas as situações (termo de arbitragem assinado pelas partes ou diante da ausência do demandado). Estará, assim, regularmente instaurada a arbitragem e a sentença arbitral proferida receberá a chancela legal.