Título: Pior resultado da história
Autor: Vânia Cristino
Fonte: Correio Braziliense, 23/04/2010, Economia, p. 12

TRANSAÇÕES CORRENTES

Saldo das contas externas de janeiro a março tem rombo superior a US$ 12 bilhões. Mas BC acredita ser possível financiá-lo com sobra

O fraco desempenho da balança comercial, aliado a um maior gasto com serviços ¿ especialmente viagens internacionais e aluguel de equipamentos ¿ fez o Banco Central errar em pelo menos US$ 1 bilhão a previsão de deficit para as transações correntes no mês de março. Essa conta, negativa em US$ 5,067 bilhões, é quase quatro vezes maior do que o apurado em março do ano passado (US$ 1,559 bilhão). No trimestre, o deficit alcançou US$ 12,145 bilhões. Tanto para o mês, quanto para o trimestre, o resultado de transações correntes ¿ que engloba os saldos da balança comercial, de serviços e das transferências unilaterais (dinheiro que os brasileiros no exterior mandam para o país) ¿ é o pior da série histórica das contas externas, que começou em 1947. Apesar do tamanho do rombo, que não conseguiu, nem no mês nem no trimestre, ser coberto pelo ingresso de investimentos estrangeiros, o chefe do Departamento Econômico do Banco Central (Depec), Altamir Lopes, não demonstrou qualquer preocupação. Muito pelo contrário. Lopes procurou tranquilizar o mercado ao listar as diferenças da economia brasileira hoje e no passado, quando o financiamento do balanço de pagamentos se constituiu num sério problema. ¿O crescimento do deficit em transações correntes já era esperado por força do nível de atividade¿, afirmou.

Tranquilidade De acordo com Lopes, o financiamento do balanço de pagamentos é bastante confortável. Ele explicou que a parcela que não puder ser coberta com investimentos estrangeiros diretos no país ¿ a previsão para essa conta em 2010 é de US$ 45 bilhões, enquanto que o deficit em transações correntes deverá atingir US$ 49 bilhões ¿ será financiada, com sobra, por empréstimos de curto e médio prazo, além de investimentos em ações e renda fixa, que deverão somar US$ 35 bilhões no ano. Além disso, segundo o chefe do Depec, é preciso olhar a relação do deficit em transações correntes com o Produto Interno Bruto (PIB). Nos 12 meses terminados em março, essa proporção ficou em 1,79%. Para o ano deve chegar em 2,53%. Mesmo assim bem abaixo dos períodos de crise, quando o Brasil tinha dívida externa elevada, precisava de moeda estrangeira para pagar os juros dessa conta, praticamente não contava com investimentos externos e, para complicar, tinha baixo nível de reservas internacionais. Em 1974, por exemplo, a relação deficit em transações correntes/PIB chegou a 6,8%. Em 1999, ficou em 4,32%. O economista-chefe do Banco Schahin, Sílvio Campos Neto, concorda com o chefe do Depec de que o cenário atual é diferente e que o Brasil hoje possui grau de investimento e reservas internacionais. Mesmo assim, ele chama a atenção para o fato de o deficit ser crescente e não totalmente coberto pelos investimentos diretos. ¿Não é confortável ficar na dependência da conta financeira, com recursos voláteis, para o financiamento. A qualquer hora esses recursos poderão migrar¿, alertou. Para o diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, Octavio de Barros, a surpresa negativa dos dados divulgados ontem pelo BC ficou por conta de um deficit maior do que o esperado para a conta de serviços, em especial o item aluguel de equipamentos. Foi a pressão dos serviços que também frustrou a expectativa dos analistas, que esperavam um deficit em transações correntes da ordem de US$ 4 bilhões em março. A partir de maio, o Banco Central espera uma ligeira melhora nas contas externas do país, com a balança comercial passando a contribuir mais para a cobertura dos gastos com serviços, que serão crescentes. Para abril, no entanto, a previsão é de deficit em transações correntes ainda elevado, da ordem de US$ 4,8 bilhões, com investimentos estrangeiros diretos de US$ 2,8 bilhões.