Título: RN e RJ fazem caixa extra com a antecipação de royalties de petróleo
Autor: Raquel Balarin, Catherine Vieira e Janaina Villela
Fonte: Valor Econômico, 09/09/2005, Brasil, p. A2

A um ano das eleições, alguns Estados descobriram uma nova maneira de obter recursos para rechear o caixa - a venda antecipada, no mercado financeiro, de royalties sobre a produção de petróleo e gás. O Rio Grande do Norte pretende levantar R$ 100 milhões em uma operação com a Caixa Econômica Federal (CEF) e o Rio de Janeiro, outros R$ 500 milhões. A venda desses recebíveis no mercado financeiro é inédita. As operações só serão possíveis porque o Tesouro Nacional concordou que a antecipação é uma compra de fluxo futuro de receitas e não crédito, já que os Estados estão proibidos por lei de se endividar. O enquadramento da operação abre espaço para que também os municípios produtores de petróleo antecipem royalties. O Rio Grande do Norte é pioneiro na antecipação. De acordo com Vagner Araújo, secretário do Planejamento e das Finanças, a CEF irá adquirir R$ 100 milhões em royalties e participação especial de exploração de petróleo. O valor representa cerca de 60% da produção estimada até dezembro de 2006. O Tesouro não autoriza a venda antecipada de royalties após esse prazo para nenhum Estado para evitar o comprometimento de receitas de novos governadores. Com o dinheiro, o Rio Grande do Norte pretende recuperar 2 mil quilômetros de estradas. "Nossa capacidade de investimento com recursos próprios era baixa e, nos últimos anos, praticamente vínhamos trabalhando apenas com tapa-buraco", explica Araújo. Para viabilizar a operação, o Estado precisou de autorização da Assembléia Legislativa e do Tesouro. Dos R$ 100 milhões, de 60% a 70% virão de royalties e outros 30% a 40% de participação especial, um pagamento adicional para campos petrolíferos com grandes volumes de produção de óleo bruto ou elevada rentabilidade. Por lei, os recursos de antecipação de royalties devem obrigatoriamente ser destinados à capitalização de fundos de previdência complementar ou a abatimento de dívidas com a União. Os recursos de participação especial podem ser utilizados para investimentos. Segundo Araújo, o Rio Grande do Norte tem um déficit no fundo de pensão dos servidores que obriga o Estado a desembolsar mensalmente de R$ 18 milhões a R$ 20 milhões. "Com a operação, poderemos deixar de desembolsar esses recursos por uns quatro meses e utilizar o dinheiro para investimentos." A expectativa é que os recursos sejam liberados já em setembro. A CEF aplicou aos recebíveis uma taxa de desconto de Selic mais 3,5% ao ano e, segundo o Valor apurou, pretende desenvolver um novo produto a partir da experiência do Rio Grande do Norte e oferecê-lo a Estados e municípios. O risco é considerado baixo - o maior deles é uma eventual inadimplência da produtora de petróleo, a Petrobras. O Rio de Janeiro também está estruturando uma operação de venda de royalties, mas preferiu um caminho diferente - a criação de um Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC). O objetivo é captar pelo menos R$ 500 milhões, que serão usados para capitalizar o Fundo Único de Previdência Social do Estado do Rio (Rio Previdência). O FIDC, que será administrado pela Mellon, acaba de ser encaminhado para análise da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A expectativa de rentabilidade é de 110% do CDI. Como no caso do RN, só serão comprometidas receitas de royalties até 2006, ou seja, dentro do atual governo. "Também pensamos em um FIDC, mas a operação poderia demorar muito para ser aprovada na CVM e tínhamos pressa na recuperação das estradas", afirmou Araújo, secretário do Rio Grande do Norte. No FIDC do Rio, os recursos que darão lastro à carteira do fundo serão provenientes do pagamento de royalties e participação especial ao Estado, já descontadas as parcelas destinadas por lei aos municípios, ao meio ambiente e ao abatimento da dívida com a União. Em 1999, o governo federal antecipou a receita futura sobre os royalties de petróleo do Rio, emitindo títulos - os Certificados Financeiros do Tesouro (CFT) - , que foram utilizados para pagamento de dívidas com a União e para capitalização do Rio Previdência. Em contrapartida, o governo fluminense se comprometeu a fazer pagamentos anuais até 2014. Com a alta do petróleo, o Rio conseguiu adiantar o pagamento. O contrato com a União se baseava em uma cotação de US$ 17 por barril de petróleo. A produção estimada era de 900 mil barris diários e a taxa de câmbio, de R$ 1,78 por dólar em 1999. A disparada dos preços do barril de petróleo, hoje na casa dos US$ 60, no entanto, permitiu ao Estado quitar, já em agosto, sua dívida com o governo federal e ainda ter uma sobra em caixa de aproximadamente R$ 2 bilhões para investimentos. A Secretaria de Finanças do Rio estima uma receita de royalties e participação especial de R$ 4 bilhões este ano, volume 14,28% maior do que o registrado em 2004. O objetivo do Mellon FIDC - Royalties de Petróleo é distribuir as cotas de maneira pulverizada entre os investidores. Os FIDCs são divididos em cotas sêniores (distribuídas ao mercado) e subordinadas, que são subscritas por quem faz a cessão dos créditos e sobre as quais incide primeiro eventual problema de inadimplência. O valor usual da aplicação mínima em FIDCs é de R$ 300 mil. No caso do fundo de royalties, deverá ser maior e girar entre R$ 500 mil e R$ 1 milhão, para que apenas investidores conscientes do risco subscrevam as cotas. O superintendente de registros da CVM, Carlos Alberto Rebello, explica que o lastro em royalties implica risco adicional porque, em casos de inadimplência, o fundo não pode executar a cobrança. "Só o Estado pode fazer isso." O fato de os pagadores de royalties serem empresas como Petrobras e Shell indica risco baixo de inadimplência, segundo especialistas. A Bahia, terceiro maior Estado em arrecadação de royalties, não criou fundo, mas definiu percentuais para a aplicação dos royalties. O Estado tem autorização legal para aplicar de 45% a 55% da receita na preservação de recursos hídricos e no meio ambiente. Outros 20% a 30% podem ser investidos na geração de energia. O restante pode ser aplicado em gestão de recursos minerais.