Título: Furnas e Tractebel revêem importação da Argentina
Autor: Leila Coimbra
Fonte: Valor Econômico, 09/09/2005, Empresas &, p. B8

Energia Companhias gastam R$ 45 mi por mês, mesmo sem receber o insumo

Furnas e Tractebel travam uma guerra com a espanhola Endesa por conta dos contratos de importação de energia da Argentina. O transporte de eletricidade do país vizinho para o Brasil é feito pela Companhia de Interconexão Energética (Cien), subsidiária da Endesa. A briga entre as três companhias envolve uma cifra mensal de R$ 45,5 milhões, sendo R$ 35 milhões pagos por Furnas à Cien. Os R$ 10,5 milhões restantes são debitados na conta da Tractebel. Esse dinheiro é referente ao pagamento por 1.000 megawatts (MW) de energia importados da Argentina, mas que nunca precisaram ser utilizados integralmente. Isso porque após o racionamento de energia, em 2001, houve uma sobreoferta de eletricidade no Brasil. Do total importado, 700 MW são contratados por Furnas e 300 MW pela Tractebel. No último teste feito a pedido do governo brasileiro, em abril passado, a Cien conseguiu trazer da Argentina apenas 168 MW para Furnas e 72 MW para a Tractebel. O teste foi solicitado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) devido à seca no Sul do país, que esvaziava os reservatórios das hidrelétricas. A prioridade do governo argentino é garantir o abastecimento interno e por isso a Central Costanera, instalada no país vizinho e também controlada pela Endesa, tem enviado menos da metade dos 900 MW previstos no contrato de fornecimento à Cien. Sem poder receber pela energia contratada, Furnas e Tractebel acabaram impedidas de revender o insumo importado no leilão ocorrido no dia 2 de abril, onde as empresas fecharam contratos para revender energia até o ano de 2016. Segundo fonte próxima às negociações e que prefere não ser identificada, o contrato celebrado entre Furnas, Tractebel e Cien deixa as compradoras expostas ao risco, e não o responsável pela entrega, como acontece normalmente. Isso não ocorre, por exemplo, com outros compradores da energia da Cien, como a Copel, que recebe mensalmente 400 MW e tem prioridade no recebimento. Ainda segundo essa mesma fonte, Furnas e Tractebel pagam cerca de R$ 33 por megawatt hora à Cien, mesmo que não precisem utilizar a energia. É o chamado pagamento pela potência, que serve para cobrir parte dos custos de construção da infra-estrutura necessária para trazer a energia. Outros R$ 40 por megawatt hora são adicionados à fatura caso haja necessidade de utilizar a energia. Para construir as redes de transmissão, a Cien investiu US$ 750 milhões, e o pagamento da parcela referente à potência serve para remunerar parte desse investimento já realizado. Com a sobra conjuntural de eletricidade que houve no país desde o racionamento em 2001 e 2002, não houve desde então necessidade de trazer o insumo da Argentina. Mas, diante da impossibilidade de contratar essa energia no futuro, Tractebel e Furnas cobram agora uma renegociação desse contrato. Na semana passada, houve uma reunião sobre o tema entre o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, e autoridades argentinas. Uma nova reunião está prevista para a próxima semana. Oficialmente, Furnas e Tractebel preferiram não fazer comentários sobre o assunto. A Cien enviou uma nota onde adiantou apenas que, neste momento, a questão está em discussão e envolve acordo entre os governos brasileiro e o argentino. A Cien foi constituída em 1998 pela Endesa para participar da licitação para a importação de 1000 MW da Argentina para Furnas e na época as estatais Eletrosul/Gerasul. Em contrapartida, teria que construir mais de 500 km de linhas de transmissão - sendo 140 km de linhas em território argentino e 360 km em terras brasileiras. Houve também a necessidade de construção de uma estação conversora em Garabi, fronteira entre os dois países, já que a freqüência da energia no Brasil é de 60 hertz, enquanto na Argentina é de 50 hertz. Logo após a licitação, a Gerasul foi privatizada e se tornou hoje a Tractebel, maior empresa brasileira privada de geração de energia.