Título: De volta para o futuro
Autor: Danilo Fariello
Fonte: Valor Econômico, 09/09/2005, EU &, p. D1

Captação pelo quinto mês consecutivo comprova a consistência na retomada da previdência aberta

A consistência da retomada dos aportes em fundos de previdência complementar aberta já permite aos agentes do mercado esperar que a captação líquida total do setor este ano seja igual à registrada em 2004, de R$ 9,78 bilhões. A perspectiva é otimista, uma vez que a captação do segmento - que inclui os VGBL, PGBL e Fapis - no primeiro semestre foi de apenas R$ 2,1 bilhões, menos da metade registrada no mesmo período no ano anterior. Com a recuperação iniciada em abril e crescente até agosto, a crise parece ter sido superada. Segundo dados do site Fortuna, em cinco meses, os fundos de previdência captaram R$ 2,7 bilhões, ou seja, 77% do acumulado em todo o ano, que soma R$ 3,5 bilhões. Só em agosto, as carteiras captaram R$ 709,29 milhões. Se incluídas as carteiras reclassificadas pela Associação Nacional dos Bancos de Investimentos (Anbid) no primeiro semestre, de fundos de renda fixa para previdência, a captação no ano pula para R$ 7,66 bilhões. O otimismo do mercado e a ampliação dos investimentos ocorreu, principalmente, por conta da aceleração do crescimento econômico ao longo dos últimos meses e porque a discussão sobre a nova tributação teria sido deixada de lado pelos bancos, diz Marcelo D'Agosto, do Fortuna. A dificuldade dos bancos e seguradoras em atrair novos investimentos começou em agosto de 2004. Na época, a Medida Provisória 209 permitiu aos participantes optar entre o recolhimento do Imposto de Renda progressivo - como já existia, de acordo com as alíquotas que chegam até 27,5% - e um novo sistema regressivo. No novo sistema, as alíquotas variam conforme o tempo de contribuição, entre 35% para até dois anos e 10% para mais de dez anos. A novidade, acompanhada ainda do aumento da taxa de juros e de novas regras para tributação dos fundos de investimento - também com uma tabela regressiva - desviou os participantes, que buscavam apenas benefícios tributários na previdência aberta para os fundos mútuos. Demorou muito para que os investidores entendessem a mudança tributária e soubessem escolher a melhor opção. Conforme o modo de recolhimento do IR e o prazo com que o participante começa a sacar, o benefício final pode mudar muito, diz Newton Conde, consultor de Previdência da Watson Wyatt. "É difícil tomar rapidamente uma decisão para talvez até 40 anos." Com a prorrogação para dezembro da data limite para que o participante opte pelo sistema tributário, a pressão que incomodava os investidores no primeiro semestre se dissipou. Porém, D'Agosto alerta que o problema deve ser retomado no fim do ano, dado que a decisão foi apenas prorrogada. O consultor Conde também acredita que haverá muita discussão em dezembro. "Já desisti da festa de Natal, porque acho que vou ter de trabalhar muito", ironiza. Uma contenção de novos aportes nos planos de previdência no fim do ano poderia ser ainda mais danosa para o setor, dado que apenas o mês de dezembro costuma significar 19% da captação anual das empresas. Fábio Junqueira, advogado tributarista do escritório Martinelli Advocacia Empresarial, no entanto, acredita que a maior parte dos que devem fazer a opção já escolheu o sistema tributário e, portanto, uma crise dessa mesma magnitude em dezembro seria pouco provável. Outra iniciativa que colaborou para a retomada recente da captação de modo mais sustentado foi o esforço das empresas em buscar clientes em novos mercados. Para Osvaldo do Nascimento, presidente da Associação Nacional da Previdência Privada (Anapp), ainda há uma demanda reprimida significativa entre diversos tipos de clientes a ser explorada pelos agentes. Isso garantiria a retomada consistente do crescimento da previdência aberta. Para ele, os aportes não efetuados no começo do ano foram prorrogados para agora. O Fortuna indica que a captação dos fundos nos últimos quatro meses foi bem distribuída entre as categorias de investidores. Os produtos com taxa de administração mais alta, acima de 2,6% ao ano, foram responsáveis por 38% dos R$ 2,3 bilhões. Isso significa que os participantes do varejo, faixa de clientes mais afetada com as mudanças, voltou a tomar gosto pela previdência complementar. Para Conde, da Watson Wyatt, esse é um reflexo de mais esforços do setor em treinar corretores e gerentes para vender o produto. Outras instituições optaram pelo segmento de micro, pequenas e médias empresas. A Brasilprev, por exemplo, lançou um plano para microempresas e vendeu 7 mil fundos apenas nos últimos quatro meses. A SulAmérica teve forte expansão no setor de pequenas e médias empresas, acumulando centenas de milhares de empregados participantes, diz o vice-presidente de Previdência, Renato Russo. O presidente da Brasilprev, Eduardo Bom Angelo, explica que o segmento empresarial oferece menos oscilação em contribuições, pois grande parte desses aportes tem relação direta com o pagamento dos funcionários, sendo, portanto, menos provável que seja interrompido, como num plano livre. Por isso, o impacto da crise do primeiro semestre foi menor nesse segmento. "O crescimento das contribuições por empresas é vegetativo, numa curva sustentada, diferente do individual", diz Russo. Para Conde, da Watson Wyatt, outra notícia recente que contribui muito para o crescimento da procura são os resultados da Previdência Social. De janeiro a julho o déficit foi de R$ 19,37 bilhões, 19,2% maior do que o mesmo período do ano passado. Com isso, o governo já reconheceu que a previsão de déficit de R$ 32 bilhões em 2005 deverá ser superada. "Isso aumenta a apreensão quanto à Previdência Social e aumenta a procura pela opção privada", diz Conde. Segundo o consultor, notícias como essa não deverão ser revertidas em um futuro tão próximo, o que daria ainda mais sustentabilidade à previdência complementar aberta. "Acredito que, no geral, os aportes em previdência continuarão a crescer até o fim do ano, fazendo com que o setor encerre com crescimento das contribuições próximo de zero em relação ao de 2004", conclui Bom Angelo.