Título: Tesouro vai resgatar todos os C-Bonds
Autor: Mônica Izaguirre e Cristiane Perini Lucchesi
Fonte: Valor Econômico, 06/09/2005, Finanças, p. C3

Dívida externa Governo gastará US$ 1,1 bi das reservas para tirar do mercado o estoque remanescente do papel

A recompra antecipada de C-Bonds - o mais famoso título da dívida externa brasileira renegociada -, anunciada ontem, abre espaço para a aquisição de mais US$ 1,1 bilhão no mercado interno de câmbio pelo Tesouro Nacional a partir de hoje. Mas, segundo informou ao Valor o secretário-adjunto do Tesouro Nacional, José Antônio Gragnani, o governo decidiu que os recursos necessários ao pagamento dos credores sairão das reservas cambiais. A idéia é evitar que a operação afete a taxa de câmbio, pelo menos diretamente, disse Gragnani. Em comunicado à imprensa, ontem, a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) anunciou que vai recomprar antecipadamente todo o estoque remanescente do título externo: US$ 1,1 bilhão. Com isso, o C-Bond, que vencia em 2014, deixará de existir. A opção de recompra é prevista em contrato e pode ser exercida somente por ocasião dos vencimentos semestrais de juros do papel e a 100% do valor de face. Recentemente, o Brasil já tinha tirado de circulação US$ 4,4 bilhões de dívida em C-Bonds, em troca voluntária pelo A-Bond, um título novo com vencimento em 2018 e amortização a partir de janeiro de 2009. Entre os motivos que levaram o governo a decidir liquidar de uma vez por todas a dívida em C-Bond é o bom momento de mercado, que propicia redução de custos e alongamento de prazos. Sobre o papel a ser resgatado, o Tesouro paga juros de 8% ao ano. Nas condições atuais de mercado, a emissão de um papel novo semelhante, que serviria para financiar esse pagamento, custaria uma taxa efetiva entre 6,5% e 7% ao ano. "Essa operação faz parte de um processo maior de melhora de qualidade da dívida mobiliária brasileira", disse Gragnani. Ele acrescenta que, além do velho papel carregar a pecha de um título de dívida renegociada, a taxa de juros embutida no preço de negociação do C-Bond no mercado secundário "está acima da curva" dos novos títulos brasileiros. Os analistas consideraram a notícia positiva. "A liquidez do C-Bond já acabou há tempos e hoje o bônus só atrapalha o risco-Brasil", diz Carlos Gribel, sócio da Queluz Securities. Para ele, o Tesouro deveria aproveitar o bom momento e também tirar os outros bônus da dívida reestruturada, conhecidos como "bradies", das mãos do mercado. Sem o C-Bond, a dívida brasileira em "bradies" ficará em cerca de US$ 7,83 bilhões, a maior parte em DCBs (US$ 3,09 bilhões). O C-Bond foi o bônus com maior liquidez entre todos os emitidos pelo Tesouro brasileiro na última década. Até 2003, era o "benchmark" dos mercados emergentes. No ano passado, no entanto, o Global 40, título da dívida nova voluntária do Brasil, passou para a primeira posição. "O Tesouro vai poder se aproveitar melhor da forte liquidez internacional ao país prevista para setembro e o início de outubro", afirma Alexandre Lintz, estrategista-chefe do BNP Paribas. Seus cálculos são de que o fluxo positivo de dólares ao Brasil até 15 de outubro, por conta da balança comercial forte e de captações externas, chegará a US$ 3 bilhões. Os impactos do Furação Katrina sobre o crescimento americanos já leva o mercado a apostar que o Fed, banco central americano, pode deixar os juros estáveis na reunião deste mês. E taxas menores nos EUA podem contribuir ainda mais para aumentar o fluxo de recursos externos aos mercados emergentes. Pelas regras atuais, o Tesouro só poderia comprar US$ 1,7 bilhão em mercado até o dia 15 de outubro, aproximadamente, calcula Lintz. Isso porque só pode adquirir dólares para pagar dívida externa com antecedência máxima de 180 dias em relação à data do vencimento. Mesmo anunciando que pretende usar as reservas internacionais para pagar o C-Bond, o Tesouro pode mudar de idéia a qualquer momento se o fluxo positivo do mercado realmente se verificar. Para Lintz, a atuação do Tesouro no mercado de câmbio à vista é mais suave do que a do Banco Central, pois não precisa ser anunciada. O mercado só toma conhecimento do total das compras no fim do mês, quando elas já foram realizadas. Quando o BC atua, avalia ele, "o mercado sempre dá uma piorada", pois muitos vendidos em dólar se assustam. "A atuação do BC, mesmo a mais transparente, sempre leva o mercado a criar um piso psicológico para a moeda", afirmou ele.