Título: Candidato esquerdista declara vitória no Uruguai
Autor: Paulo Braga
Fonte: Valor Econômico, 01/11/2004, Internacional, p. A-11

O esquerdista Tabaré Vázquez declarou na noite de ontem sua vitória no primeiro turno das eleições presidenciais uruguaias, depois de pesquisas telefônicas e de boca-de-urna terem dado a ele pouco mais que 50% dos votos. "Festejem uruguaios, que a vitória é de vocês", disse Vázquez ao saudar simpatizantes que se reuniam ontem em frente a um hotel de Montevidéu onde estava seu comando de campanha. Pesquisas divulgadas pouco antes davam a ele ampla vantagem sobre o segundo colocado, mas com uma pequena margem além dos 50% mais 1 necessários para evitar o segundo turno. Projeções da emissora de TV uruguaia Canal 12 indicavam a vitória com 51% para Vázquez e 34% para o candidato Jorge Larrañaga, do Partido Colorado. Pesquisas feitas após a votação davam entre 50% e 52,5% dos votos para a esquerda, mas com margem de erro de 3 pontos percentuais. Os resultados oficiais seriam conhecidos durante a madrugada. Mesmo sem os resultados oficiais, Vázquez já comemorava a vitória e falava como presidente eleito, com um discurso conciliador. "Gostaria de saudar nossos adversários e dizer que estamos dispostos a buscar caminhos de diálogo e entendimento para que este governo encontre uma grande base de sustentação política e social", disse em entrevista coletiva. Pouco depois Larrañaga, seu rival mais próximo, admitiu a derrota. Vázquez também afirmou que a partir de hoje sua futura equipe estará trabalhando com os integrantes do governo atual para preparar a mudança de poder. A posse do novo presidente está marcada para 1º de março. Com a vitória de Vázquez no primeiro turno, a esquerda chegará pela primeira vez ao poder no país, quebrando o monopólio exercido por mais de 150 anos pelos partidos Nacional (Blanco) e Colorado. Em 1999, o bloco esquerdista, que também tinha Vázquez como candidato, venceu o primeiro turno com 40,1% dos votos, mas acabou sendo derrotado no segundo turno depois de que blancos e colorados, ambos de centro direita, fizeram uma aliança em apoio à candidatura de Jorge Batlle. Durante o governo de Batlle o país enfrentou a maior crise econômica de sua história, com desvalorização, uma corrida bancária que consumiu 50% dos depósitos do sistema financeiro e aumento da pobreza. A queda acumulada do Produto Interno Bruto foi de 17,7% em quatro anos de recessão, com retração de 11% em 2002, ano mais grave da crise. Por causa dos problemas econômicos, 1 em cada 3 uruguaios está hoje abaixo da linha da pobreza e cerca de 100 mil deixaram o país. "O Uruguai necessita que unamos nossas forças para que em um tempo não muito distante possamos viver melhor, e os que estão fora do país possam, dentro do possível e o mais rápido possível, voltar", disse Vázquez. A partir do ano passado o país iniciou um processo de recuperação, com crescimento de 2,5%. Neste ano, a expectativa é que a expansão chegue a 11%. Apesar da retomada do crescimento, a dimensão da crise teve um custo político alto para o Partido Colorado, de Batlle, que segundo as pesquisas obteve entre 8% e 10% dos votos. A legislação eleitoral do país não permite a reeleição presidencial, e o candidato do partido foi o ex-ministro do Interior Guillermo Stirling, A coalizão Frente Ampla/Encontro Nacional deve obter também a maioria nas duas casas do Congresso. O bloco abarca um amplo espectro ideológico que vai desde a democracia cristã, setores militares, social democratas, comunistas e ex-guerrilheiros.