Título: Ministério eleva juros, mas dá desconto por eficiência
Autor: Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 13/09/2005, Brasil, p. A3

Um novo contencioso surgiu entre o Ministério das Cidades e as companhias estaduais de saneamento, responsáveis pelo abastecimento de água em cerca de 70% dos municípios brasileiros. O motivo é uma instrução normativa baixada pelo ex-ministro Olívio Dutra, no seu último dia de gestão, elevando os juros dos financiamentos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) ao setor. Se, por de um lado, as taxas ficaram mais altas, de outro, foi criado um sistema de bonificação que gera desconto sobre as prestações na fase de amortização, depois da obra pronta. Segundo o ministério, isso, na prática, tornará os juros efetivos menores que os da tabela, para empresas que cumprirem suas metas físicas e de desempenho durante toda a vigência do contrato, além de outras exigências. "É um estímulo à eficiência", afirma o secretário de Saneamento do ministério, Abelardo Oliveira Filho. Ele destaca que o aumento do prazo máximo, de 15 para 20 anos, também vai reduzir o valor das prestações mensais. Na nova tabela, os juros dos financiamentos para construção e ampliação de redes de distribuição de água, que eram de 8% ao ao ano, agora são de 9% anuais. As taxas para obras de esgotamento sanitário aumentam de 6,5% para 9% ao ano e o custo dos financiamentos para obras de saneamento integrado (água e esgoto), de 5% para 7% ao ano. Para as empresas que conseguirem a bonificação máxima, porém, as taxas efetivas das três linhas de crédito do FGTS podem chegar, respectivamente, a 7%, 5% e 5% ao ano. A Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais (Aesbe) contesta as contas do ministério. "Mesmo que alguém consiga a maior bonificação possível, as taxas finais serão sempre superiores às cobradas anteriormente", assegura Marcos Thadeu Abicalil, assessor técnico da entidade, baseado em suas projeções. O principal problema, explica ele, é que os custos unitários tomados como referência para se calcular os descontos são "irreais, muito baixos". O custo médio de ligação de cada unidade consumidora (casa ou prédio) a uma rede de abastecimento d'água, por exemplo, oscila em torno de R$ 1,2 mil, segundo Abicalil. A construção de redes de coleta de esgoto, por sua vez, dificilmente custa menos de R$ 2 mil por unidade atendida, acrescenta. A instrução normativa do Ministério das Cidades, entretanto, supõe custos médios unitários de R$ 800,00 e R$ 1,2 mil, respectivamente. "O objetivo é incentivar projetos mais baratos para a sociedade", justifica Marcos Helano Montenegro, diretor de um dos departamentos da Secretaria Nacional de Saneamento, contestando as informações da Aesbe sobre custos. A Aesbe também critica as exigências que as empresas têm de cumprir para ter direito ao desconto. "Há coisas impossíveis", diz Abicalil. Uma delas é que todos os municípios onde serão feitos os investimentos tenham conselhos municipais e um plano próprio de saneamento, aprovado pelo Legislativo local. Menos de 200 municípios no país atendem a esse requisito, segundo a Aesbe. Tanto que as companhias estaduais usam planos de saneamento elaborados por elas próprias e não pelas prefeituras e câmaras de vereadores. Outra "estupidez" prevista na instrução normativa do ministério, na sua opinião, é a imposição de limites mínimos de extensão e profundidade dos emissários subquáticos de esgoto. "Fixar isso em norma é inadequado à diversidade de situações do país", diz Abicalil. Por causa dessa e de outras exigências de difícil atendimento, ele prevê que prevalecerão as taxas de juros mais altas. E no caso do esgotamento sanitário "em 20 anos de amortização, os novos juros representam um aumento de 59% no valor do investimento". Como na questão do marco regulatório, o setor de saneamento está dividido quanto à decisão tomada pelo ministério, com base em delegação do conselho curador do FGTS. Enquanto as empresas estaduais dizem que a mudança vai tornar inviáveis muitos financiamentos, pelo aumento do custo, a Assemae, associação que representa os 1.800 prestadores municipais de serviços de água e esgoto existentes no país, apóia as novas regras. O presidente da entidade, Silvano da Costa, diz que elas vieram para dar mais qualidade e eficiência aos empreendimentos do setor. "É correto que quem investe a custos unitários acima do razoável seja penalizado com taxas mais altas." (MI)