Título: Militantes pedem retorno à base
Autor: César Felício, Cristiane Agostine e Caio Junqueira
Fonte: Valor Econômico, 13/09/2005, Política, p. A8

Crise Intelectuais e sindicalistas dizem que PT deve voltar-se para os movimentos sociais

Intelectuais e sindicalistas reunidos no "Encontro de Refundação do PT", realizado ontem no Sindicato dos Engenheiros de São Paulo, propuseram que o PT abandone o pragmatismo ao fechar alianças políticas e retome o contato com as suas bases históricas. "Quando a pergunta que fazemos ao recomeçar é quem vai ser o sujeito histórico dessa refundação, a resposta está clara: é a base petista, os movimentos sociais, que foram pouco a pouco deixados de lado e pouco a pouco deixaram de lutar", disse a filósofa Marilena Chauí. A manifestação da filósofa sintetizou o que foi exposto pelos outros militantes. O presidente da CUT, João Felício, que é integrante do Campo Majoritário, disse que o partido está "desgovernado": "O PT precisa fazer mais aliança com a sua base histórica do que as que têm feito. É impressionante o distanciamento do PT dos movimentos sociais. Precisamos comprar mais briga com o setor financeiro". O partido - que se prepara para eleger a sua próxima direção - pode ser obrigado a enfrentar uma transição caso o candidato do Campo Majoritário e atual secretário-geral da sigla, Ricardo Berzoini, não vença no primeiro turno. O atual presidente da sigla, Tarso Genro, disse que a nova direção deverá ser constrangida 'no bom sentido' a preparar o Congresso partidário. Instância máxima do PT, o Congresso teria poderes para rever o programa e as regras da sigla e eleger a nova direção. "Preparar este Congresso deverá a primeira tarefa de quem for eleito", disse Tarso, em evento que contou com presença de dissidentes do Campo Majoritário, representantes das tendências partidárias e do candidato da Democracia Socialista, Raul Pont. A única tendência que não enviou representantes foi a Articulação de Esquerda, de Valter Pomar, que expressou publicamente a sua discordância com a tese da refundação do partido. No entendimento dos dirigentes presentes, o sistema de votação de 18 de setembro, que separa a eleição do presidente do partido, de sua própria chapa, torna improvável a vitória em primeiro turno de um único grupo, devendo levar a uma composição. Entre os militantes que se reuniram ontem, contudo, persistem dúvidas sobre se a prioridade da nova direção será a realização de um Congresso. Segundo o ex-deputado Vladimir Palmeira, pré-candidato ao governo do Rio, e apoiador da candidatura de Plínio de Arruda Sampaio à presidência do PT, a punição dos deputados envolvidos no mensalão virá em primeiro lugar. "A questão não é moral, é política, não importa que se alegue que a eleição de caixa 2 é usada por todos os políticos. O que importa é que esse caixa 2 foi descoberto em nosso meio". Ao discursar na abertura do encontro, Genro afirmou que a antiga direção transformou o partido em uma máquina eleitoral, o que teve como consequência tornar o PT idêntico a outras siglas. "Essa profissionalização contribuiu para o encarecimento da estrutura do partido. O PT hoje custa muito mais do que o dinheiro da contribuição de todos nós e isso forçou a que a sigla entrasse nesse processo de captação de receita não contabilizada". Em seminário na Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) sobre Reforma Política, com a participação de diversos políticos da situação e da oposição, houve um embate pacífico entre o senador Pedro Simon (PMDB-RS) e o ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, acerca dos rumos que o PT deve tomar. "O PT era a nossa esperança e ainda é se vocês tiverem a coragem de fazer uma limpa no partido. Se tiverem a coragem de dizer que não dá para deixar que pessoas envolvidas com corrupção acabem com o ideal de ética e a biografia que o PT sempre pregou", disse Simon. O ministro, minutos depois, respondeu e culpou o sistema político-eleitoral pela crise do partido: "Os bons vão definhando e não conseguem resistir ao sistema. É o que eu acho que aconteceu com alguns dos meus. Foram capturados por essa lógica. Minha crítica não é moral, é política. Eles foram capturados por um sistema preexistente e viciado. O que choca é que o pecado não foi do pecador, mas do pregador. Mas eu não entrego o que eu ajudei a construir por 25 anos por conta de alguns. A sua fala (de Simon), para mim, é um estímulo". Simon acabou sendo o destaque no seminário. Foi interrompido por três vezes por aplausos dos empresários e, ao final, aplaudido de pé pela platéia. O senador gaúcho defendeu uma investigação completa que puna, além de parlamentares, empresários que abasteceram as contas de caixa 2 de partidos e também os que contribuem legalmente. Defendeu, ainda, a prisão do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles: "Ninguém gasta dinheiro no bolso em uma campanha. As empreiteiras que dão dinheiro, dão porque acabam ganhando concorrências, privatizações, vantagens. Toda corrupção política começa na campanha eleitoral. Quando o PT esqueceu os princípios da ética não foi quando chegou ao poder, foi antes, durante a campanha. De onde vem o dinheiro do Banco do Brasil, dos fundos de pensão, como esse Banco Rural ainda não fechou? Como esse presidente do Banco Central ainda não está na cadeia? Precisamos agir para que não façamos como em 1992, quando cassamos Collor de Mello, mas não levamos as coisas até as últimas conseqüências".