Título: Isenção leva PCs à rota de vendas recordes
Autor: João Luiz Rosa e Taís Fuoco
Fonte: Valor Econômico, 13/09/2005, Empresas &, p. B1

Computadores Previsão para este ano é de 5 milhões de máquinas

Nos últimos três anos, vender computador no Brasil havia se tornado uma operação de guerra, com margens magras, consumidores empobrecidos e a concorrência ameaçadora e crescente do mercado cinza - a ala de integradores anões ou sem marca adepta de práticas como contrabando e pirataria de software. Agora, porém, a indústria de PCs parece voltar a sorrir, do vendedor que fica na porta dos grandes magazines até o gerente de produção nas fábricas. E eles não estão rindo à toa. As vendas de computadores devem atingir um recorde histórico este ano. A previsão é de que o negócio vai encostar em cinco milhões de máquinas, um milhão a mais do que no ano passado, incluindo equipamentos para uso em casa e no escritório. Mas a principal novidade é que, pela primeira vez em dez anos, o mercado oficial está retomando o espaço dos piratas. É o que vai revelar uma pesquisa inédita que a consultoria IDC divulga nesta semana. Os números ainda estão sendo concluídos, mas segundo fontes que tiveram acesso aos dados preliminares, a participação dos ilegais caiu três pontos percentuais no primeiro trimestre - de 74% para 71% do mercado total. A retomada decorre de vários fatores: para a indústria, o dólar estável evita solavancos no custo de produção, fortemente alicerçado na moeda americana. Cerca de 70% dos componentes de um PC tem preço fixado em dólar. Já no comércio, o retorno do crédito facilitado, que havia desaparecido, atraiu o consumidor, que voltou às lojas em busca de financiamentos em 12 vezes sem juro e às vezes até mais que isso. Mas o que está fazendo a diferença para valer é a Medida Provisória nº 252, a MP do Bem, que isentou do PIS/Cofins as máquinas de até R$ 2,5 mil, concordam fabricantes e varejistas. "Com a isenção, os informais deixaram de ter parte de seu diferencial de preço", diz Flávio Haddad, gerente geral da Lenovo, a companhia chinesa que assumiu a divisão de PCs da IBM. "O negócio de PCs passa por uma boa fase, principalmente no segmento de máquinas de valor mais baixo." As principais redes de varejo do país atestam os efeitos da isenção. Na Casas Bahia, as vendas em unidades "multiplicaram-se por três" desde junho, quando a medida foi anunciada, informa Roberto Fulcherberguer, diretor de produtos de informática da empresa. Os volumes não são divulgados. No Extra, do grupo Pão de Açúcar, a divisão de produtos de informática registrou um aumento de 42%, em receita, desde a divulgação das medidas, frente ao mesmo período do ano passado. "O movimento afetou as vendas de todos os itens", diz Rita Bellizia, gerente de compras da categoria. Isso inclui impressoras e multifuncionais, mas os computadores foram destaque, com uma elevação de 60% em unidades na comparação com 2004, informa a executiva. No varejista on-line Submarino, desde meados de julho as vendas de PCs estão 30% mais altas que na temporada do ano passado, diz Flávio Jansen, presidente da empresa. "Em média, os preços dos PCs baixaram 10% com a isenção." Alguns fabricantes trabalham à plena produção para suprir a demanda. Na Positivo, de Curitiba, a produção mensal saltou de 7,32 mil unidades em julho do ano passado para 34,9 mil há dois meses, um aumento de quase cinco vezes. Recentemente, a companhia abriu sua segunda fábrica de computadores, a seis quadras das instalações originais, com um investimento de R$ 12 milhões. Em 2004, a fábrica da Positivo passou por duas ampliações, mas isso não foi suficiente para fazer frente ao aumento recente demanda, o que levou a companhia a ocupar o novo terreno. A empresa vendeu 100 mil microcomputadores em 2004 e acredita que o volume vai triplicar neste ano. Mesmo a venda de portáteis, mais caros que os modelos de mesa, está em alta. Na linha de produção de notebooks da Hewlett-Packard (HP) - que no Brasil são fabricados pela Solectron - não há ociosidade, conta Cristina Palmaka, vice-presidente de sistemas pessoais. "Quase não damos conta", diz ela. Em alguns casos, as vendas só não são maiores porque faltam componentes no mercado internacional. "Enfrentamos dificuldades para obter algumas peças, mas não perdemos encomendas por causa disso", diz Hadad, da Lenovo, que também tem acordo com a Solectron no Brasil. Se houvesse maior disponibilidade dos componentes, afirma o executivo, o resultado poderia ser ainda melhor. Sob esse cenário de aquecimento, porém, há uma pergunta subjacente: a boa fase vai durar? E até quando? "Estamos em um bom momento, mas ele pode não ser eterno", observa Cristina Palmaka. "O ano que vem será delicado". O setor conhece bem os efeitos da instabilidade econômica. Em 2002, uma reversão de cenário surpreendeu a brasileira Metron - que chegou a ser líder de mercado -, e empurrou a empresa para uma fase de declínio, da qual tenta sair (ver nesta página). Na época, animada com a demanda, a Metron endividou-se para aumentar a produção, aproveitando o dólar baixo. Às vésperas das eleições, no entanto, a moeda americana subiu para R$ 4. Como a Metron tinha contratos a R$ 2,80, o prejuízo explodiu. Traçar um paralelo direto entre o cenário atual e os problemas enfrentados pela Metron é arriscado, dizem profissionais do setor, porque segundo eles o desempenho da empresa também incluiu erros de estratégia. Ninguém discorda, porém, que há semelhanças de conjuntura. Para se resguardar, a Positivo está ampliando a produção para o varejo sem tirar os olhos dos segmentos de empresas e governo. "O varejo sempre tem margens muito apertadas", justifica Helio Rotenberg, diretor geral da empresa. A Positivo também está buscando financiamento para o capital de giro "dentro dos padrões normais", para não se endividar, afirma. "Estamos com o pé no chão." Nos demais fabricantes, a postura é semelhante. A Lenovo pretende voltar ao mercado de PCs para uso em casa "em algum momento do ano que vem", diz Hadad, mas por enquanto a ênfase continuará sendo no mercado de empresas. A HP define, até o fim do ano, se finalmente entrará neste segmento no país. "Queremos fazer isso, mas de uma maneira que possamos competir", diz Cristina Palmaka. "Nossa prioridade é crescer, mas não a qualquer custo." (* Do Valor Online)