Título: Conversa de olho no Irã
Autor: Vaz, Viviane
Fonte: Correio Braziliense, 23/04/2010, Mundo, p. 18

Lula recebe o colega libanês e reafirma importância do regime islâmico para a solução dos conflitos na região. Chanceler Amorim embarca para Teerã, com escalas na Turquia e na Rússia

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aproveitou ontem a visita do colega libanês, general Michel Sleiman, para uma vez mais sustentar que o impasse entre Estados Unidos e Irã é peça-chave na solução dos conflitos do Oriente Médio e na conquista de uma paz duradoura. Para ajudar na tarefa e preparar o terreno da próxima viagem de Lula a Teerã, dentro de aproximadamente um mês, o ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, segue hoje para a Turquia, país com o qual o Brasil desenhou uma proposta para aproximar o regime islâmico e o grupo de potências que exigem a paralisação do programa nuclear iraniano. No Palácio do Itamaraty, diante de Sleiman, Lula afirmou que não haverá conforto para o ¿sofrido¿ povo libanês ¿enquanto perdurarem o conflito árabe-israelense, a questão dos refugiados palestinos e as indefinições sobre o programa nuclear iraniano¿. Questionado pelos jornalistas sobre o que queria dizer com ¿indefinição¿, Lula esclareceu que o Brasil busca uma saída para o impasse entre Teerã e o Conselho de Segurança das Nações Unidas. ¿O Irã diz que não vai enriquecer urânio para uma bomba nuclear e alguns duvidam disso, então não tem definição, há uma divergência profunda entre o que fala Irã, o Conselho de Segurança e a própria agência¿, explicou, referindo-se à Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão da ONU. ¿O Brasil defende a tese de que o Irã tem o direito de produzir energia nuclear para fins pacíficos, seja para energia elétrica, seja para remédios¿, reafirmou Lula. ¿Queremos para o Irã o que queremos para o Brasil, e no Brasil está na Constituição a proibição de armas nucleares. Portanto, temos autoridade moral e política para discutir esse assunto com quem quer que seja¿, declarou. Sleiman, cujo país vai presidir o Conselho de Segurança a partir de maio, não falou em público sobre o impasse nuclear. Lula esquivou-se de dizer se o Líbano, nessa posição, dificultaria a aprovação de novas sanções ao Irã, que tem influência na política libanesa. Mas destacou que ¿tem consciência¿ de que vai prevalecer ¿a maturidade¿e que os países ¿vão defender o que for mais seguro para defender a paz¿. Por sua parte, o presidente libanês pediu apoio do Brasil e da comunidade internacional para ¿enfrentar perigos e diferentes desafios¿. Entre eles, Sleiman criticou a falta de compromisso de Israel para com a Resolução 1.701 da ONU, que determina a retirada integral de tropas estrangeiras do território libanês. O visitante também reclamou da permanência de refugiados palestinos em seu país, ¿contrariando o direito legal de retornarem a seus lares na Palestina¿. ¿Enfrentar o terrorismo que ameaça a estabilidade do povo libanês¿ foi outro desafio mencionado por Sleiman. Na semana passada, ele convocou uma reunião de emergência devido à acusação do governo israelense de que sírios estariam colaborando para entregar ao partido xiita pró-iraniano Hezbollah, ¿ que integra o governo ¿ mísseis capazes de atingir qualquer ponto de Israel.

Imigração A visita de Sleiman marca também o aniversário de 130 anos do início oficial da imigração árabe para o Brasil, onde hoje a comunidade libanesa totaliza quase 10 milhões de pessoas e supera a população do Líbano, de 3,5 milhões de habitantes. Entre os descendentes ilustres no Brasil, dois ocupam hoje a posição de ministros: Miguel Jorge, da pasta de Desenvolvimento, e Fernando Haddad, na Educação. Presente no encontro bilateral, Miguel Jorge destacou que será criado um Conselho de Negócios para empresários dos dois países. O objetivo, segundo ele, é ¿transformar o Brasil numa porta de entrada para a economia libanesa¿. Lula destacou que o comércio entre os dois países triplicou desde o início de seu governo, em 2003, e atinge hoje US$ 312 milhões anuais. Os dois presidentes também assinaram acordos na área social e desportiva.